Entre os
dias 12 e 17 de julho, cerca de 40 famílias ligadas aos movimentos sociais de
luta por moradia foram despejadas de imóveis ocupados na capital paulista. No
final do mês de junho, 50 famílias sem-teto que ocupavam a 10 anos um casarão
na capital carioca tiveram o mesmo destino. Desde 2001, o Estado tem na Lei
10.257 mecanismos para combater a especulação imobiliária e garantir moradia à
população, mas os direitos individuais à propriedade têm prevalecido. O grito
pela função social da moradia também ecoou no Seminário Habitação e
Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, que terminou dia 7 de junho no Rio de
Janeiro.
A
secretária nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, Raquel
Rolnik, mencionou o paradoxo que se vive no Brasil da falta e, ao mesmo tempo,
sobra de residências no país, e defendeu os subsídios do governo para aluguel
de imóveis vazios. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) existem 5 milhões de imóveis desocupados nos principais centros urbanos
e um déficit habitacional de cerca de 7 milhões de moradias no país.
Programa
Gritos Urbanos gritosurbanos.blogspot.com O
conceito de função social da propriedade urbana se opõe ao de propriedade
particular sem uso. Não prega o fim da propriedade privada, mas questiona a
existência de imóveis urbanos vazios em regiões onde o número de famílias
precisando de moradia é bastante elevado. São Paulo é um caso particular nesse
cenário. Estima-se que nesse município há mais imóveis vazios do que famílias
sem casa para morar, sendo que 10% dos imóveis vagos (cerca de 40 mil), estão
no centro, descumprindo sua função social. Cerca de 600 mil moradores estão em
cortiços e há 1,2 milhão de pessoas morando em favelas, em mais de 2 mil
favelas na capital do estado mais rico do Brasil.
Embora
alguns municípios utilizem-se de instrumentos urbanísticos para combater
especulação de terras - como o IPTU progressivo -, a Lei que estabelece que o
uso da propriedade urbana deve servir a fins coletivos surtiu poucos efeitos
sobre a política de habitação do país. Para a arquiteta e urbanista Paula
Santoro, do Núcleo de Urbanismo do Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais
(Instituto Pólis), “o problema está no fato de que a questão da moradia no
Brasil é vista como negócio”. Santoro manifesta esperança de que as diretrizes
estabelecidas no Estatuto da Cidade sejam contempladas nos Planos Diretores dos
municípios, que devem ser fechados até outubro de 2006.
Déficit
Habitacional no Brasil: Municípios Selecionados e Microregiões Geográficas - 2ª
edição. Fundação João Pinheiro
Os Planos
Diretores precisam levar em consideração não apenas os mecanismos urbanísticos
de liberação de imóveis que possam ter um destino social, mas um conjunto de
variáveis que envolve o direito à moradia. Como lembra Silvia Barboza,
coordenadora da Comissão de Habitação do Instituto dos Arquitetos do Brasil e
organizadora do Seminário que aconteceu no Rio, "o direito a habitação não
é apenas o direito a moradia. É também o direito ao lazer, a circulação pelo
território, que envolve as questões do transporte, e até o direito ao
descanso".
Embora a
defesa da função social ganhe corpo a cada dia, vale marcar que existem
diferenças entre as propostas dos movimentos sociais, governos e algumas
entidades do terceiro setor. Os movimentos sociais de luta por moradia têm, em
sua maioria, encontrado como saída ocupar imóveis vazios, por vezes abandonados
a mais de dez anos, como forma de pressão para que estes sejam desapropriados e
transferida sua propriedade aos seus ocupantes. Já a secretária nacional Rolnik
acena com a necessidade do Estado subsidiar a locação de imóveis vazios pelas
famílias de baixa renda, argumentando que essa alternativa seria mais viável
para o governo do que a construção de novas moradias. Neste caso, não se mexe
com a propriedade dos imóveis.
Já para
Marco Antonio Ramos de Almeida, superintendente geral da Associação Viva o
Centro, a solução seria, no caso da cidade de São Paulo, a construção de
prédios nos galpões e fábricas abandonados no centro. Esta última opção não
mexe com os imóveis vazios, nem toca na questão da especulação imobiliária.
Barboza relata que na mesa “Planos de revitalização e reabilitação integrada
para áreas urbanas centrais”, que ocorreu do Seminário, também foi discutida a
proposta de construção de novos imóveis em antigas fábricas e indústrias.
Entretanto, pesquisadores alertaram que, por se tratarem de antigas áreas que
desempenhavam funções industriais, pode haver contaminação do solo nesses
terrenos. “Há problemas em conceder essas áreas para infra-estrutura
habitacional, mas não é impossível, pois existem tecnologias de despoluição
desses solos para reverter o local para uso habitacional”.
Leia
mais:
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- Especulação
imobiliária X famílias sem-teto
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Paulo
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