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Dança batalha por espaços de pesquisa
Por Luiza Bragion
02/05/2007

A respiração correta favorece a saúde de todos, mas dentro das artes corporais, como a dança, ela é decisiva para a qualidade expressiva e artística. Essa foi a principal conclusão de Patrícia Leal, doutoranda do Instituto de Artes da Unicamp. A pesquisadora acaba de lançar o livro “Respiração e Expressividade - práticas corporais fundamentadas em Graham e Laban”, fruto de sua pesquisa de mestrado, financiada pela Fapesp, em 2006.

 

Contando com a aplicação de técnicas de respiração e expressão em quatro alunas do último ano da faculdade de dança, Leal propôs uma metodologia para o desenvolvimento do processo criativo, necessário em seu trabalho, unindo cena, coreografia e expressividade. Segundo a dançarina, os questionamentos gerados pela técnica de Martha Graham, um dos maiores nomes da dança moderna norte-americana, foram os motivadores centrais do trabalho. “Quis demonstrar que o uso correto das técnicas de respiração de Graham pode resultar numa expressividade maior”, explica.

 

Para desenvolver sua técnica, utilizada até os dias atuais, Martha Graham observou os movimentos corporais decorrentes da respiração. A inalação foi associada a um movimento de expansão e liberação do corpo, denominado release. A exalação foi associada a um movimento de contração, denominado contraction. A bailarina resumiu o movimento como sendo uma continuidade entre releases e contrações a partir de um centro motor. A prática dessa técnica permite a integração corporal, pois os exercícios trabalham o corpo como um todo indissociável, sem fragmentar movimentos de braços e pernas em que o centro fica esquecido.

 

Ao lado da aplicação da técnica de Graham, Leal adotou, para preparação corporal das alunas, exercícios de yoga, alongamento, além de improvisações e criações coreográficas, propostas por Rudolf Laban, teórico representante da dança moderna alemã.

 

Na pesquisa, pôde-se observar que a respiração adequada facilitou principalmente a fluência do movimento, isto é, a precisão e continuidade do mesmo. “Isso é positivo, pois dá ao intérprete maior capacidade expressiva. A expressividade do dançarino se mede pela passagem por várias nuances qualitativas. No começo, as transições entre um movimento e outro eram abruptas. Com o tempo, houve transições mais suaves, habilidade de emenda dos movimentos. Em outros fatores analisados, como espaço e tempo, também houve mudanças”, explica a pesquisadora. Além da melhora na expressividade, o método, aplicado em atletas, também ajuda a prevenir lesões, compensando relativamente os movimentos repetitivos.

 

Dança na universidade é recente

 

Segundo dados da Associação Brasileira de Artistas Cênicos, houve aumento significativo de pesquisas em dança no Brasil nos últimos anos, acompanhando a tendência das pesquisas em arte no geral. Isso se deve, em parte, à notável organização política dos dançarinos, o que facilita a disseminação do conhecimento. “Essa organização partiu necessidade de lutar contra algumas organizações que não consideram a dança como campo de conhecimento, o que é paradoxal em um momento de intensificação de pesquisas. Nossa maior luta é contra o Conselho Federal de Educação Física (CONFEF), que quer impedir que dançarinos possam ensinar dança. Isso só poderia ser feito por professores de Educação Física. Para eles, a dança não é um campo de estudo”, denuncia Strazzacappa.

 

Ao longo da história é possível verificar mudanças no tratamento e desenvolvimento do corpo para a expressão artística. O balé romântico anterior à dança moderna supervalorizava o decorativo, desumanizando seus protagonistas. No final do século XIX e início do século XX, sobretudo nos EUA e Alemanha, a dança moderna se contrapôs ao academicismo do balé, valorizando não apenas a leveza mas a expressividade. O trabalho com o corpo desce do ideal, das pontas, e valoriza o contato com o chão, ganhando novas propostas estéticas e menos rigidez.

 

No Brasil, esses ideais tomaram forma nos anos 50, com o fim da guerra. Neste contexto, a presença da dança nas universidades é recente. A primeira faculdade surgiu na Universidade Federal da Bahia, em 1956, fruto de movimentos internacionais para institucionalizar a arte.

 

Até então, a dança era praticada em conservatórios e pequenos estúdios, onde o bailarino se preparava para o ingresso em uma grande companhia. Na década de 80, surgem cursos superiores de dança na Universidade Federal do Rio de Janeiro e Unicamp. “A dança moderna como pesquisa, difundida nas faculdades, ampliou os olhares, pois sempre somou idéias às danças já existentes. O conhecimento passou a ser institucionalizado, trazendo mudanças nos conceitos de arte. A ênfase é na pesquisa, na corporeidade do brasileiro. A dança contemporânea, que vemos hoje, nasce da dança moderna do começo do século XX, mas com ideais populares e mais recursos tecnológicos”, afirma Márcia Strazzacappa, pesquisadora da Faculdade de Educação da Unicamp e membro do Fórum Nacional de Dança.

 

Hoje o Brasil conta com 15 cursos de graduação em dança e cerca de 30 cursos de pós. “Esse movimento partiu dos próprios dançarinos, que sentiam necessidade de pensar a dança, relacioná-la com a antropologia, educação e outras áreas de conhecimento”, afirma a pesquisadora.