O último dia 14 de março (marcado como Dia Mundial da Incontinência Urinária), nos alertou para a importância de uma doença
caracterizada pela incapacidade de controlar a micção ou de
armazenar a urina, e que acomete cerca de sessenta milhões de
pessoas no mundo, entre homens, mulheres e crianças. Segundo o site
da Sociedade Brasileira de Urologia, a incontinência urinária pode
ser tratada, de forma geral, com fisioterapia do assoalho pélvico,
medicamentos e cirurgias. No entanto, pesquisas realizadas pela
equipe do médico Fernando Gonçalves de Almeida, da Universidade
Federal de São Paulo, apontam as células-tronco como uma nova arma
no tratamento terapêutico da doença. A perda involuntária
de urina é decorrente do mau funcionamento dos nervos e músculos da
bexiga e da uretra. Dessa forma, a reparação de danos destes
tecidos é fundamental para restaurar a continência urinária.
“Muitos casos de incontinência urinária masculina e feminina não
podem ser curados com os tratamentos cirúrgicos convencionais. Esses
casos poderiam se beneficiar da aplicação de células-tronco, que
ajudaria na regeneração do órgão afetado”, avalia o médico
urologista. Acredita-se que as células-tronco adultas são
responsáveis pela regeneração em vários tecidos e já foram
isoladas de diferentes órgãos, como fígado, pâncreas, rins,
músculo e do sistema nervoso central.
Almeida publicou em
2005 um trabalho em colaboração com um grupo da Universidade da
Califórnia em Los Angeles (Ucla), demonstrando a incorporação de
células-tronco derivadas de tecido adiposo humano na uretra e bexiga
de ratos e camundongos imunossuprimidos, e a diferenciação das
mesmas em células musculares lisas.
As células-tronco
derivadas de tecido adiposo começaram a ser estudadas a partir de
2002 com objetivos clínicos. Estas células, chamadas de ADSC
(Adipose Derived Stem Cells), foram isoladas de lipoaspirados humanos
e possuem a capacidade de se diferenciar em células adiposas, osso,
cartilagem, músculo esquelético e em linhagens neuronais. Além de apresentarem
vantagens sobre outros tipos de células-troncos, pela fácil
obtenção e pelo grande número de células obtidas, as ADSC também
possibilitam o transplante autólogo, ou seja, no próprio doador - o
que diminui os riscos de rejeição. O grupo de Almeida testou tal
procedimento em coelhos e este trabalho, que ainda não foi
publicado, será o primeiro a demonstrar a viabilidade do transplante
autólogo de ADSC no trato urinário. Neste modelo, tecido adiposo de
pata de coelhos foi coletado e as células foram injetadas na parede
uretral do coelho doador. Na oitava semana após a injeção, as
células já apresentavam a tendência de se espalhar e se integrar
na parede da uretra. Células-tronco
derivadas de diversos tecidos, como medula óssea e músculo, já
foram testadas em animais no tratamento de doenças urológicas e o
potencial de desenvolvimento desse tipo de intervenção ainda é
vasto. No entanto, as células mesenquimais derivadas da medula óssea
são de difícil coleta e por isso o seu uso terapêutico é
limitado.
Em humanos, estudos
clínicos realizados no exterior já testaram células-tronco
musculares e de cordão umbilical na terapia da incontinência
urinária. Apesar dos resultados preliminares serem positivos, as
células derivadas do cordão umbilical não possibilitam o
transplante autólogo. Estudos realizados com mioblastos (células
embrionárias musculares) e fibroblastos (células responsáveis pela
regeneração) humanos já demonstraram melhoras em homens com
incontinência urinária ocasionada pela remoção cirúrgica de toda
a glândula prostática, e de mulheres com incontinência por
esforço. No Brasil, os estudos nesta área não chegaram na fase
clínica, mas ainda há muito que se estudar.
A incontinência
urinária, apesar de apresentar grande impacto na qualidade de vida,
é uma doença de curso benigno e possui outras formas de tratamento
efetivas. “Infelizmente as pesquisas ainda estão em estágio
experimental e levará muitos anos até que tenhamos resultados
satisfatórios quanto à eficácia e segurança do uso de
células-tronco em humanos. Mas os resultados iniciais são bastante
animadores. Por esse motivo é que estamos muito confiantes nas
pesquisas”, diz Almeida.
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