Após aproximadamente dois anos de trabalho, o Núcleo de Informática
Aplicada à Educação (Nied), da Unicamp, fez um balanço das atividades
desenvolvidas pelo projeto TIME
(Tecnologia e Mídias Interativas na Escola), no qual dá pistas de como
diminuir a distância criada pelas novas tecnologias, que parece afastar
professores e alunos dentro da sala de aula. O projeto beneficia
atualmente 1.300 alunos da rede pública de Hortolândia (SP), além dos
professores e pais de alunos que também participam da interação com as
salas multimídias instaladas em duas escolas municipais de ensino
fundamental: Fernanda Graziella Resende Covre e Parque dos Pinheiros,
ambas na periferia da cidade.
O projeto, financiado pela Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e em parceria com a prefeitura
local, apostou na montagem de laboratórios de multimídia e na
capacitação teórica e técnica de professores. O resultado é a
aproximação de professores, alunos e comunidade - através da figura dos
pais e familiares dos alunos - no desenvolvimento de trabalhos
colaborativos e de inclusão digital.
“Eu tinha pavor de qualquer coisa tecnológica”,
desabafa Silvana Paula de Souza, uma das professoras mais antigas do
projeto. “Acabei aprendendo junto com os alunos”, completa. Para
participar do projeto TIME, cada professor escreve um sub-projeto para
desenvolver em sala de aula. Silvana, professora da escola Fernanda
Covre, confessa que o primeiro sub-projeto que escreveu teve grande
influência de sua formação em psico-pedagogia. Ao chegar em sala de
aula, percebeu que a realidade dos alunos pedia outras ações que
envolvessem a participação dela como facilitadora na construção de
outros sentidos para as tecnologias, de uma aproximação mais humanizada
com a informática e os equipamentos disponíveis. Não teve medo, rasgou
o sub-projeto original e escreveu outro.
“Cheguei em uma classe com a auto-estima muito baixa e
resolvi ampliar o projeto para poder me apropriar de outras ações, como
teatro e fotografia, para poder desenvolver ações que permitissem aos
alunos se auto-conhecerem e valorizarem suas produções”, diz a
professora. Um dos primeiros exercícios que propôs foi pedir aos alunos
se descreverem, e a primeira ferramenta usada no laboratório foi um
editor de textos. Rapidamente, ela observou que os alunos que já sabiam
usar o computador - mais da metade da classe - ou aqueles que
descobriam novas funções no software se organizavam e repassavam a
informação para os colegas. A professora admitiu sua dificuldade com o
uso de determinados equipamentos e acabou estimulando os alunos a
fazerem dela uma companheira de aprendizado.
Graças aos exercícios no editor de texto os alunos
também começaram a desenvolver a prática da leitura e algumas
dificuldades de alfabetização também foram deixadas para trás. Em um
dos exercícios mais recentes, os alunos formaram duplas e ensinaram
colegas de outras classes a fazer desenhos simples usando o software
Paint. Um detalhe importante é o fato de Silvana dar aula para alunos
da 2ª série do ensino básico, ou seja, crianças entre 6 e 7 anos que se
auto-organizaram em um ambiente colaborativo de aprendizado, que inclui
a professora como companheira e não como autoridade inflexível, e que
veem sua produção se desdobrar através das mídias disponíveis no
laboratório. “Começamos com produção de texto, pesquisamos informações
na internet, produzimos fotografia com a máquina digital, fizemos uma
história em quadrinhos usando o Paint, e agora estamos gravando um
programa de rádioweb”, conta.
A mesma tática vem sendo usada por Rute Camargo, da
escola Parque dos Pinheiros, uma das professoras mais novas no projeto,
ao qual está integrada desde o semestre passado. Ela admite que, antes
do ingresso no projeto TIME, estava na confortável posição de
acomodação diante das novas tecnologias. “Eu sabia mexer com a máquina
digital e fazer vídeos, mas muito pouco”, confessa. Motivada pelo fato
de o projeto contar com bolsas-auxílio para o desenvolvimento dos
sub-projetos, Camargo também viu uma classe com problemas de disciplina
e alfabetização se organizar para nivelar os conhecimentos adquiridos
ou trazidos anteriormente, além de os alunos tirarem dúvidas trazidas
pela própria professora quanto à utilização de algumas funções dos
equipamentos ou softwares.
“Eu tinha até mesmo medo de tocar nos equipamentos. A
sala de multimídia, pra mim, era uma atividade extra-classe, que não se
integrava com outras atividades”, conta. Essa distância dos alunos -
também chamada de gap de geração -, que ainda é sentida por vários
professores que não fazem parte do projeto, fazia com que, ao adentrar
na sala multimídia, os alunos tomassem a dianteira nas atividades,
tornando a sala difícil de gerenciar. “Eu tinha medo da bagunça que
eles podiam fazer na sala multimídia, porque os alunos acabavam
dominando a dinâmica”, afirma. Agora, professora e alunos trocam
idéias. As obras a serem trabalhadas são escolhidas em conjunto e as
atividades dentro da sala multimídia têm como objetivo o
desenvolvimento das produções.
“Temos até um ‘combinado’ entre a gente: se eles
acabarem as atividades propostas antes do tempo, podem usar os minutos
finais da aula para jogos. Mas eles pedem autorização e a palavra final
é minha”, completa. Além da sua mudança de comportamento em relação à
informática e às tecnologias, Camargo também faz questão de apontar que
o projeto estimula os professores a produzirem reflexões teóricas sobre
o processo. “Acabei escrevendo um artigo para uma revista que circula
na cidade e também submeti um resumo de artigo para a próxima reunião
anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)”,
revela.
Esse estímulo à produção científica dos professores é
um dos diferencias do projeto TIME, aproximando o professor do ensino
fundamental e a universidade, trazendo dados que ajudem a analisar a
atual situação da integração entre práticas pedagógicas e a
informática. “O projeto prevê o desenvolvimento de atividades tanto
dentro quanto fora da sala de aula, a partir de pesquisas dos alunos e
seus professores, que conduzam a uma reflexão sobre os problemas da
realidade, articulados aos impactos da tecnologia de informação e
comunicação, e principalmente, no que se refere às suas implicações na
prática pedagógica”, aponta João Vilhete D’Abreu, pesquisador do Nied e
coordenador do projeto.
Outro ponto observado durante esses quase dois anos de
projeto TIME foi o interesse de alguns pais nas atividades propostas
nas escolas, a ponto de alguns deles pedirem para participar das aulas.
“Temos que estar atentos ao efeito multiplicador desse tipo de
experiência e, nesse caso, os fato de os alunos trazerem os pais para a
experiência com novas mídias é o efeito direto desse processo. Além
disso, contribuímos para a diminuição do isolamento que afeta as atuais
gerações e as gerações de seus pais. Tudo isso faz parte do processo de
fortalecimento do ensino público, que é a tônica desse projeto”,
finaliza Vilhete.
Para saber mais:
blog do projeto
blog de uma das professoras