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Reportagem
Mudando as certezas
Por André Gardini
10/08/2007
Um dos maiores desafios na história da humanidade é a busca de uma resposta para uma simples questão: existe vida fora da Terra? Não sabemos, seria a forma mais exata de respondê-la. Essa (in)certeza abre brechas para que vários sistemas de pensamento formulem suas próprias teorias para explicar a existência de vida extraterrestre. A ciência (através da física, biologia, astronomia, filosofia), a religião, a ufologia, o espiritismo, todas essas correntes de pensamento, têm as suas versões para tentar explicar a “simples questão”.

No que tange à ciência, largos passos têm sido dados com o objetivo de tentar compilar indícios sobre o mistério. Nesse sentido, dois eventos recentes podem, dentro de poucos anos, marcar a história da humanidade como o maior acontecimento em uma época. Um deles, a descoberta de um planeta extrasolar em abril deste ano, que foi apelidado de “Super-Terra” por astrônomos europeus. O outro, o envio da nave Phoenix, no começo deste mês, pela Agência Espacial Norte-Americana (Nasa, em inglês), ao pólo norte de Marte.

Enquanto isso, podemos dizer apenas que a vida, conforme a conhecemos, inteligente ou não, “só existe na Terra”. Mas essa afirmativa é válida apenas para este momento, pelo andar do desenvolvimento tecnológico, os investimentos da ciência e o interesse dos cientistas, dentro de pouco tempo, talvez encontremos evidências que nos façam mudar essa afirmação.

Vida inteligente extra-solar

Eder Martioli, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), acredita que as restrições tecnológicas são os maiores obstáculos para a detecção de vida inteligente extraterrestre. “Os exoplanetas, ou planetas extra-solares, encontrados até a atualidade ainda são muito diferentes. A maioria está próxima demais de suas estrelas mães e são maiores do que Júpiter, ou seja, gigantes gasosos, sem condições de suportar vida”, revela.

Martioli, que defendeu seu mestrado no Inpe, em 2006, com o título “Exoplanetas: o que são e como detectá-los”, explica que existe um conceito novo que tem sido estudado na astronomia chamado de Zona Habitável (ZH). ZH é uma região do espaço em torno de uma estrela que, caso colocássemos a Terra em órbita dessa estrela, a vida, como a conhecemos, persistiria sem entrar em extinção. Apesar das dificuldades em definir tal região, os astrônomos possuem uma versão simplificada da ZH, que consiste na região onde, “considerando o equilíbrio termodinâmico entre o planeta e a estrela, este planeta possuiria uma temperatura entre 0° e 40° Celsius”, explica Martioli e continua “a importância desses valores é que, em média, seriam temperaturas que permitiriam a existência de água na forma líquida, fator essencial para a existência da vida, tal como a conhecemos”, completa.

No entanto, Martioli conta que a detecção de “outras Terras” vem avançando e, com o desenvolvimento de novas técnicas observacionais, é possível chegar perto da primeira detecção de um planeta que, ao menos, tenha condições de comportar vida.

O primeiro forte candidato a ser um desses planetas habitáveis é aquele encontrado em torno da estrela anã vermelha Gliese 581 da constelação de Libra, localizado a 20,5 anos-luz da Terra. A estrela Gliese possui 1/3 da massa do Sol e emite 50 vezes menos energia. O planeta encontrado foi denominado GJ581c (a letra "c" é por ser o segundo planeta detectado nesse sistema - o primeiro se chama GJ581b). A detecção foi anunciada em abril deste ano e realizada por uma equipe de astrônomos europeus utilizando o método de velocidades radiais.

O GJ581c está longe de se parecer com Terra, pois possui uma massa estimada em aproximadamente 5 vezes a da Terra e está a uma distância da sua estrela-mãe de 0,073 vezes a que nosso planeta se encontra do Sol. Porém, o pesquisador do Inpe explica que a estrela é bem mais fria que o Sol e, portanto, a ZH dela é bem mais próxima do que a ZH do Sol. “Assim, a particularidade dessa Super-Terra é que ela se encontra dentro da ZH tal como foi definido pelos astrônomos, o que não significa que ela possua vida e nem mesmo água, pois ainda não foi realizado nenhum estudo da composição química desse planeta”, esclarece.

Renato Las Casas, professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), conta que, do ponto de vista teórico, existe a chamada equação de Frank Drake. A equação é a multiplicação simples de sete termos ou parcelas e procura calcular o número de civilizações que teriam desenvolvido tecnologia semelhante à nossa e, portanto, teriam a possibilidade de se comunicarem conosco.

Segundo Las Casas, a equação busca calcular o número de civilizações comunicantes que desenvolveram tecnologias, ou seja, civilizações capazes de emitir e captar ondas eletromagnéticas, principalmente na faixa de rádio. “Mas, o que acho que mais importa na equação de Frank Drake é que o resultado pode ser zero, ou seja, não há outra civilização na Via Láctea que pode se comunicar conosco, mas também pode existir algo em torno de 1 milhão”, explica, e continua, “a equação é simples, mas chegar a valores razoáveis para cada uma dessas sete parcelas é extremamente difícil e complicado”.

“Talvez isso possa parecer frustrante, pois ainda estamos longe de descobrir vida em outros mundos além de nosso sistema. Mas, com certeza, nunca estivemos tão perto de, ao menos, ter o conhecimento de outras Terras”, explica Martioli. O entusiasmo dessas novas descobertas acaba trazendo conclusões um pouco precipitadas, às vezes até erradas. Mas possíveis, e que há pouco tempo não podíamos nem sequer cogitar.

De acordo com Renato Las Casas, da UFMG, se houver vida inteligente extraterrestre está em um outro sistema planetário e não no nosso. “Porém, é possível que em nosso sistema exista vida, porém vida microscópica, em estágio bem primitivo”.

No momento, as atenções estão voltadas para Marte mas, no nosso sistema solar, ainda são candidatos ao abrigo de vida a lua Titan, de Saturno e a lua Europa, de Júpiter, entre outros locais. A Nasa, através da missão Phoenix, um projeto de US$ 420 milhões, lançou no dia 04 de agosto a cápsula Phoenix para explorar o planeta Marte. Com o pouso previsto para 25 de maio de 2008, a cápsula se dirigirá ao pólo norte marciano para estudar a composição química da água e buscar vestígios de vida. Pela primeira vez uma missão espacial é dirigida para essa região, onde a presença de calotas polares pode abrigar formas de vida. Ao que tudo indica, Marte já teve muita água líquida rolando em sua superfície, no passado e, é bem possível que no presente haja água líquida rolando no subsolo marciano.

Las Casas explica que, nas últimas décadas, o conceito de vida na astronomia tem se expandido muito. “Nos últimos anos foram descobertas formas de vida que, há poucos anos, a ciência dizia ser impossível. Há uns cinco anos, foi descoberta uma forma de vida que não podíamos imaginar, dentro de vulcões em atividade, em meio a rochas vulcânicas, que se mantinha pela oxidação de alguns elementos químicos presentes ali na rocha”, explica.

Ele afirma que a água líquida é uma condição fundamental para o desenvolvimento de vida, tal como a conhecemos. “Nós estamos procurando por indícios de vida associada a essa água” afirma, e em seguida levanta a questão, “se Marte tem água no seu subsolo, estamos procurando formas de vida, no presente, associadas a essa água. Se encontrarmos sinais de que já houve água e encontrarmos a vida do passado, isso será um sinal alentador da vulgaridade da vida pelo universo afora. Caso contrário, se Marte já teve muita água líquida mas nunca teve desenvolvimento de vida, então vai ser um sinal contrário a essa vulgaridade”, afirma.