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Editorial
Indicadores de C, T & I e de cultura científica
Por Carlos Vogt
10/03/2008
A produção de ciência e tecnologia (C&T) tem um impacto significativo sobre diversas dimensões sociais, como na economia, na política, na comunidade e em domínios institucionais especializados (educação, saúde, lei, bem-estar e seguridade social), na cultura e nos valores (indústria cultural, crenças, normas e comportamentos). Nesse contexto, emerge a necessidade da construção de indicadores que estejam voltados para a produção científica e tecnológica e que meçam e indiquem, de alguma maneira, os impactos dessa produção nas dimensões sociais.

Para cumprir parte dessas funções, surgem recentemente os indicadores de inovação tecnológica, que buscam avaliar a capacidade inovativa do setor produtivo, e os indicadores de percepção pública da ciência, que tentam mensurar a cultura científica de uma determinada sociedade por meio de quatro eixos principais: conhecimento e interesse sobre C&T, e atitudes e participação no mesmo assunto. Tais indicadores ganham espaço e se colocam ao lado de outros anteriormente existentes e igualmente importantes, como os indicadores de produção científica, de dispêndios com ciência e tecnologia e de recursos humanos para pesquisa e desenvolvimento.

Hoje, sabe-se que conhecer e entender a opinião dos cidadãos sobre a ciência e tecnologia constitui-se em um instrumento de suma importância para uma sociedade que se pretenda democrática. Decisões relevantes para a vida profissional e para o trabalho dos cientistas, bem como parte dos posicionamentos sobre como se faz pesquisa ou como se avalia sua qualidade, já começam a ser tomados com a participação de diferentes atores, nem todos cientistas ou especialistas: são políticos, burocratas, empresários, militares, religiosos, movimentos sociais, consumidores e associações de pacientes que pedem, e freqüentemente obtêm, o direito e a legitimidade para participar de decisões significativas para o desenvolvimento da ciência.

Nos últimos trinta anos, o desafio de desenvolver indicadores que permitam avaliar a percepção e compreensão públicas da ciência e a participação e interesse dos cidadãos em questões de C&T foi, aos poucos, assumido por governos e pesquisadores, impulsionado pelos movimentos sociais críticos iniciados logo após a Segunda Guerra Mundial e intensificados na década de 1960. Nesse contexto, o governo britânico destacou-se ao coordenar, em 1985, um estudo conhecido por Bodmer Report (Bodmer, 1985), que determinou o início de uma área acadêmica interdisciplinar chamada Public Understanding of Science (PUS), que pode ser traduzida para o português como Compreensão ou Percepção Pública da Ciência.

Os países ibero-americanos iniciaram suas pesquisas na disciplina na década de 1990 e já alcançaram um certo grau de maturação teórica e metodológica. No Brasil, a primeira pesquisa elaborada exclusivamente com o propósito de constituir indicadores e referências na área de C&T foi realizada em 1987, pelo Instituto Gallup, por solicitação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e através do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST). O intuito era analisar a imagem da ciência e da tecnologia junto à população urbana brasileira. Pouco depois, em 1992, o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) e o CNPq, estimulados pelo contexto de democratização em que o Brasil estava inserido e pelo tema da ecologia, que permeou as discussões da conferência internacional ECO-92, realizaram uma pesquisa nacional para identificar “o que o brasileiro pensa de ecologia”.

Retomado o tema, e agora contando o país com um Departamento de Popularização e Difusão da C&T, vinculado à Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social, do MCT, foi realizada em 2006 uma nova pesquisa nacional sobre a percepção do brasileiro quanto à C&T (interesse, grau de informação, atitudes, visões e conhecimento acerca de ciência e tecnologia).

No período entre as últimas duas primeiras pesquisas nacionais sobre percepção pública da ciência, as de 1987 e 1992 e a de 2006, o estado de São Paulo, por meio da Fapesp, realizou outras pesquisas significativas na área, em nível estadual. A primeira, em 2003, foi feita em Campinas, inserida em um trabalho mais amplo conduzido pela Rede Ibero-Americana de Indicadores de Ciência e Tecnologia (RICYT) e pela Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI), aplicada nas cidades de Campinas (Brasil), Salamanca e Valladolid (Espanha), Buenos Aires (Argentina) e Montevidéu (Uruguai). Com o apoio da Fapesp, uma segunda pesquisa foi realizada, em 2004, integrando, além de Campinas, as cidades de Ribeirão Preto e São Paulo (capital). Os dados desse novo levantamento sobre percepção pública de C&T, coletados nas três cidades, deram base para um trabalho sobre percepção pública da ciência no estado de São Paulo, publicado na segunda edição da Fapesp dos Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação em São Paulo (2004). A partir dessa edição, a publicação trienal da Fapesp ganhou um capítulo dedicado à construção de indicadores de percepção pública da ciência.

Seguindo o desafio de se chegar a uma metodologia standard nas pesquisas de percepção pública da ciência, o estado de São Paulo, por meio da Fapesp, insere-se em terceira pesquisa, novamente com a RICYT e OEI e, dessa vez, FECYT (Fundação Espanhola de Ciência e Tecnologia), realizada em 2007 em grandes cidades de sete países: São Paulo (Brasil), Bogotá (Colômbia), Buenos Aires (Argentina), Caracas (Venezuela), Madrid (Espanha), Panamá (Panamá) e Santiago (Chile). Os eixos de análise sugeridos para esse trabalho foram, principalmente, o consumo e interesse por informação científica, atitudes gerais frente à ciência e tecnologia e visão sobre a ciência e a tecnologia do país.

Novamente com o apoio da Fapesp, a pesquisa no estado de São Paulo foi ampliada para além de capital e, ainda em 2007, consultou a população de mais 32 municípios. Nessa quarta pesquisa foram visitados municípios que não necessariamente possuem uma tradição científica e tecnológica e, alguns não contam, por exemplo, com universidades, institutos de pesquisa e museus de ciência. Os dados dessa pesquisa mais ampla, que abrange todo o estado de São Paulo estão sendo analisados e darão base para um novo capítulo da edição de Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação em São Paulo, a ser publicado ainda neste ano pela Fapesp.

Nesses trabalhos em conjunto foi utilizado um questionário-base comum desenvolvido a partir de metodologias consolidadas, como da National Science Foundation (NSF), dos Estados Unidos, e do Eurobarômetro, em um exercício pioneiro de desenvolvimento de um trabalho de percepção pública da ciência na Iberoamérica. A iniciativa reflete o esforço para se alcançar uma padronização das diretrizes e dos instrumentos de análise metodologicamente integrados, que inclua comparações em nível nacional e internacional.

O desenvolvimento de indicadores de percepção pública da ciência e da tecnologia, entre outros indicadores de C&T, faz-se necessária para oferecer aos tomadores de decisão informações e indícios de como as ações devem ser encaminhadas. E o Brasil tem desempenhado um significativo papel nesse sentido ao participar do desenvolvimento de pesquisas internacionais com um questionário-base comum, como tem acontecido no MCT e no estado de São Paulo, por meio da Fapesp.