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Telecentros têm sua própria distribuição Linux - a Sacix

Beá Tibiriçá

Matreiro e brincalhão, o saci-pererê é um dos personagens mais adorados do folclore brasileiro. Agora, o moleque travesso de uma perna só também é símbolo da distribuição desenvolvida pela Coordenadoria do Governo Eletrônico - a Sacix. Baseada na distribuição Debian, uma das mais utilizadas pelos cerca de 30 milhões de usuários GNU/Linux no mundo, a Sacix reúne diversos softwares livres, de editor de texto a planilha de cálculo e processador de imagens. Esse pacote de programas está presente nos 105 Telecentros instalados em São Paulo e estará ainda este ano disponível para uso doméstico e corporativo. A idéia é distribuir o pacote Sacix à população por meio de CD-Roms e pelo site da prefeitura de São Paulo.

O lançamento da distribuição Sacix é um passo importante na consolidação do Plano de Inclusão Digital da Prefeitura de São Paulo, iniciado em junho de 2001,com a instalação do primeiro Telecentro, o de Cidade Tiradentes. Um mês depois, entra no ar o site da prefeitura, reunindo as informações sobre os atos, programas, serviços e eventos realizados pela administração municipal. O portal e os Telecentros atuam em conjunto, dando ao cidadão paulistano a oportunidade de usufruir plenamente das inovações tecnológicas da sociedade da informação.

Os Telecentros são espaços públicos com até 20 computadores com conexão à internet em banda larga que oferecem à população acesso à rede mundial de computadores, cursos de informática básica e oficinas diversas, como Comunicação Comunitária, Criação de Sites e Arte Digital, entre outras.

A escolha dos locais para a instalação de um Telecentro é feita de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município. Por esse motivo, a maior parte dos Telecentros está instalada na periferia de São Paulo. Desde a inauguração da primeira unidade, em junho de 2001, cerca de 360 mil pessoas já se cadastraram nos Telecentros e, desse total, 80 mil concluíram o curso de informática básica.

O Sacix surgiu diretamente do projeto dos Telecentros, ou seja, dos softwares utilizados pelos usuários das unidades instaladas nas comunidades da periferia de São Paulo. Quando o Governo Eletrônico assumiu a criação dos Telecentros, iniciou-se um processo de escolha dos tipos de softwares a serem utilizados nas unidades. A escolha abrangeu desde o uso do Gnome como ambiente operacional, até os aplicativos escolhidos de forma a compor um instrumento de informática que servisse para usos diversificados.

A proposta do Sacix é ser um CD que possa ser usado diretamente do drive de CD-Rom, oferecendo um ambiente operacional semelhante ao utilizado pelos usuários nos Telecentros. Assim, quem rodar o Sacix pelo CD não precisará ter o GNU/Linux instalado em sua máquina de casa para testar a distribuição dos Telecentros - o Sacix foi inspirado no Kurumin e em outras distribuições que rodam diretamente do CD. Mas quem quiser instalar o Sacix no disco rígido do computador, poderá fazê-lo sem problemas, bastando seguir corretamente as instruções contidas no CD.

Além da versão para uso doméstico, o desenvolvimento do Sacix prevê uma segunda versão, corporativa, em longo prazo. Esta será direcionada para órgãos públicos e entidades da sociedade civil que queiram desenvolver seus próprios Telecentros. Essa versão corporativa do Sacix prevê um configurador que possibilita a preparação de um servidor de Telecentros. Ou seja, permite a criação de uma rede de computadores num sistema de 'thin-clients' (máquinas sem disco-rígido) e servidores - neste caso, os usuários trabalham nos thins-clients, e todo o processamento da rede de computadores é feito pelo servidor. A configuração é feita apenas no servidor, assim como as atualizações futuras dos pacotes de programas do Sacix.

Essa versão do Sacix para uso de órgãos públicos e entidades da sociedade civil é bastante genérica e dinâmica, podendo ser utilizada por empresas e até mesmo por usuários domésticos que queiram reaproveitar computadores mais antigos.

O Sacix é uma ferramenta poderosa de combate à exclusão digital e à pirataria, além de ser mais uma arma contra a tendência monopolista atual do mercado de programas de computador. A idéia de se criar uma distribuição GNU/Linux própria atende as necessidades dos usuários que não têm como desembolsar o dinheiro necessário para comprar computadores atualizados e softwares proprietários.

Além do pacote de programas GNU/Linux, a distribuição Sacix inclui ainda um extenso material de divulgação do Plano de Inclusão Digital da Prefeitura de São Paulo - textos em html e um vídeo produzido pela Equipe de Atividades da Coordenadoria do Governo Eletrônico que traz depoimentos de usuários dos Telecentros -, a apostila do curso de informática básica utilizada nas unidades e o livro Toda Essa Gente, que traz reportagens com 14 personagens que fizeram e fazem parte da história dos Telecentros.

Entre os principais aplicativos do Sacix estão:

  • OpenOffice - Suíte de escritório (com o editor de textos Swriter, a planilha eletrônica Scalc e o gerador de slides Simpress, entre outros programas);
  • Epiphany, Mozilla - navegador de internet;
  • Gpaint e Gimp - editores de imagens;
  • File Roller - Compactador e descompactador de arquivos zip, gzip, bzip;
  • AbiWord - Editor de texto;
  • Evolution e Mozilla Thunderbird - Clientes de e-mail;
  • Blender - Software para gerar imagens 3d;
  • Sodipodi - Editor de gráficos vetoriais;
  • Gftp - Cliente FTP;
  • Gaim - Instant messenger que se conecta a redes como ICQ e MSN;
  • Xine e Mplayer - Tocadores de vídeo ou audio em diversos formatos;
  • Jogos - pacote de jogos, incluindo Frozen Bubble.

Cidadania digital
Está em curso uma fase de debates e experiências sobre o uso de softwares em todo o mundo. O monopólio, a restrição do conhecimento e o custo abusivo das licenças de computador, práticas das grandes empresas de tecnologia, estão dando força ao movimento pelo software livre em vários países.

Mas o que é exatamente o software livre? É um programa de computador com o código-fonte aberto, possibilitando que qualquer técnico possa estudá-lo, alterá-lo, adequá-lo às suas próprias necessidades e redistribuí-lo, sem restrições. Geralmente, os softwares livres também são gratuitos. Dessa forma, o software livre é desenvolvido por milhares de programadores espalhados por todo o mundo, que se mantêm em contato pela internet. Boa parte deles trabalha por hobby ou é estudante de tecnologia. Mesmo assim, a produtividade e a criatividade da chamada "comunidade do software livre" consegue ser maior do que a de empresas multinacionais que têm mais funcionários no departamento de marketing/vendas do que no desenvolvimento de produtos. O nome desse sistema operacional completamente livre é GNU/Linux, ou simplesmente Linux.

Nos últimos anos, esse exército de desenvolvedores passou a ser auxiliado por empresas privadas que enxergaram no software livre um negócio lucrativo, uma vez que é possível cobrar pelo suporte e pelo treinamento. Os programadores podem também vender mão-de-obra para quem quiser criar soluções específicas.

O software livre nasce como oposição ao software proprietário, programas de computador com código-fonte fechado, patenteado por uma única empresa, que cobra direito de propriedade intelectual. Se alguém abrir, alterar ou divulgar esse código-fonte, é considerado um criminoso. Quem duplica, distribui ou usa esse tipo de programa sem pagar royalties, violando copyrights, comete o crime de pirataria, podendo até ser condenado e preso, dependendo da legislação do país em que o delito é praticado.

O monopólio e o aprisionamento dos usuários a determinados produtos são os principais motivos para não adotarmos soluções proprietárias no Plano de Inclusão Digital da Prefeitura de São Paulo. Não é justo que um projeto de combate à exclusão social da prefeitura de São Paulo use dinheiro público para treinar usuários de programas dessa ou daquela empresa. É simplesmente irresponsável pagar por licenças de uso de software que fortaleçam o poder de uma única multinacional, enquanto a cidade sofre com sérias restrições orçamentárias.
Consideramos que a exclusão digital é a mais nova face da exclusão social. Nesse contexto, nascem os Telecentros. Dez a vinte computadores em cada unidade, rodando Linux, com internet banda larga, são suficientes para que as comunidades no entorno possam aprender a usar as máquinas.

O Linux e seus aplicativos livres são gratuitos, por usar, na maioria dos casos, a GPL - General Public Licence ou Licença Pública Geral. Existem vários tipos de licença GPL, mas acreditamos que o melhor modelo é o proposto pelo Projeto GNU, da Free Software Foundation, que introduz o conceito de Copyleft. Copyleft é o contrário de copyright, uma brincadeira que pode ser interpretada como "deixar copiar" contra "direito de cópia" ou "cópia de esquerda" versus "cópia de direita".

A implantação de software livre na administração pública, entretanto, envolve custos. É necessário gastar com treinamento e suporte. Os cursos oferecidos nos Telecentros têm esse objetivo: treinar pessoas em Linux. O gasto com profissionais em suporte e treinamento não se perde: o investimento gera especialistas brasileiros altamente capacitados em software livre.

Beá Tibiriçá é coordenadora do Governo Eletrônico da Prefeitura de São Paulo

 
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Atualizado em 10/06/2004
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