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Autor: Gláucia Maria Pastore
Data de publicação: 10/09/2005

Alimentos funcionais: a inovação industrial na área de alimentos

Gláucia Maria Pastore

O setor de alimentos vem, ao longo dos últimos dez anos, despertando a atenção de governos, industriais, economistas, e principalmente consumidores. Esses estão, a cada dia, mais curiosos sobre o papel que determinado alimento pode representar para a sua saúde.

Do ponto de vista mundial, nota-se claramente a preocupação de governos com a relação: alimentos, nutrição e saúde, no estabelecimento de programas e projetos de longo prazo para alterar, modificar hábitos alimentares, sensibilizar setores industriais de alimentos para lançamento de produtos industrializados mais saudáveis, mais naturais.

Grande parte desses esforços vem do conceito atual do que sejam os alimentos funcionais.

Os alimentos funcionais são definidos como alimentos que promovem algum efeito benéfico no organismo, retardando ou impedindo o aparecimento de doenças crônicas e, principalmente, o envelhecimento.

Nos Estados Unidos, os chamados produtos nutricionais, incluindo alimentos com alegação de saúde, alimentos para dietas especiais, e medical foods são regulados e definidos pelo Food and Drug Administration (FDA). Por outro lado, termos como nutracêuticos, alimentos funcionais para a saúde, fitoquímicos, agentes chimopreventivos, e antioxidantes não são definidos pelo FDA, mas sim por pesquisas na área, cientistas, industriais e entidades profissionais. Esses termos usados pela indústria americana não têm ainda status regulatório.

No Japão o governo definiu oficialmente e regula os chamados alimentos especiais para uso em saúde (Foshu).

O governo do Canadá tem trabalhado com a definição dos conceitos: alimentos funcionais e nutracêuticos.

Na Europa, o termo vitafoods está se tornando muito popular.

Enquanto isso, a Comissão do Codex Alimentarium da FAO (Food and Agriculture Organization) e a Organização Mundial de Saúde (WHO) das Nações Unidas têm definido o termo alimentos medicinais para propósitos médicos especiais.

O Brasil, pelas suas condições climáticas e ambientais, tem produção agrícola e biodiversidade invejável. As perspectivas apontam para que se torne, em médio prazo, um grande produtor de alimentos in natura e processados, com audaciosa inserção no mercado interno e exportador. Em 1960, mais de 80% do valor das exportações brasileiras procediam da agropecuária; em 1990, essa cifra era de 29%. É importante lembrar que cresceu a participação de produtos industrializados, oriundos da agricultura. Em 1950, 95% do valor das exportações agropecuárias correspondiam à matéria-prima; em 1986, essa cifra foi de 68%, sendo que o restante correspondia a produtos processados e semi-processados. Atualmente, o Brasil vem diversificando cada vez mais sua pauta de exportações no que se refere aos produtos provenientes do agronegócio.

A agricultura brasileira passou por transformações profundas nas últimas décadas. O setor primário deixou de ser mero provedor de alimentos in natura e passou a ser consumidor de seus produtos integrados aos setores industriais e de serviços. O agronegócio experimentou um equilíbrio comercial de US$ 20,3 bilhões em 2002, com crescimento de 7% sobre o superávit de 2001, e contribuiu de forma expressiva para a economia brasileira, representando mais de 33% do Produto Interno Bruto (pm), utilizando 37% dos trabalhadores brasileiros. Somente o pm agroindustrial brasileiro representou 7% do pm total em 2001. Atualmente, tem-se observado que, na agroindústria de alimentos, o desenvolvimento integrado dos binômios processos / produtos é um dos fatores chave para a competitividade. O aumento da concorrência, as rápidas mudanças tecnológicas, a diminuição do ciclo de vida dos produtos e maior exigência por parte dos consumidores levam a indústria de alimentos a buscar agilidade, produtividade e alta qualidade que dependem, necessariamente, da eficiência e eficácia do desenvolvimento de produtos utilizados pelas empresas. A importância estratégica da indústria de alimentos na pauta de exportações brasileiras tem sido amplamente evidenciada

Entretanto, quando se sai de uma commodity para um produto processado, é necessário desenvolver um produto ao gosto do consumidor final, dentro das normas técnicas do país e ainda adaptar seu foco de vendas para o varejo, em vez do atacado. Isso significa ter embalagens de embarque menores, mais vendedores para visitar as lojas, estrutura logística para pequenas entregas – como caminhões menores – e comunicação dirigida ao consumidor final, e não ao atacadista/distribuidor. Essa é uma das dificuldades que acarretam aumento de custos.

Por isso, existe a necessidade da pesquisa científica e tecnológica de alto nível trabalhar junto com as empresas no sentido de desenvolver produtos adequados, com garantia de qualidade e inocuidade, aos mercados consumidores finais.

Os alimentos funcionais têm um mercado estimado no mundo de cerca de 60 milhões de dólares e seu apelo de promover a saúde e o bem estar, bem como prevenir doenças, reduzindo os custos com saúde, traz oportunidades potenciais para a indústria de alimentos nacional.

O impacto do desenvolvimento de produtos com maior valor agregado, afetos às regiões brasileiras como, por exemplo, a grande região amazônica deve-se refletir positivamente no estado nutricional da população.

Por outro lado, a indústria de alimentos brasileira, quando necessita incorporar em seus produtos ingredientes funcionais, o faz através de importação de ingredientes de grandes conglomerados multinacionais com impacto negativo na competitividade devido à elevação do preço do produto final ao consumidor.

Assim toma-se imperioso conhecer as propriedades funcionais dos alimentos brasileiros, muitos dos quais sequer estudados ainda como, por exemplo, caju, açaí, manga, mirtilo, pupunha, frutas do cerrado, entre outros.

Vale frisar que, neste momento, a área de alimentos está concentrando grande interesse pela possibilidade cada vez mais evidenciada da utilização de alimentos in natura e processados com propriedades funcionais. O potencial dos alimentos funcionais de reduzir doenças, promover a saúde e reduzir os custos da assistência à saúde, é um benefício de saúde que vai além da simples nutrição ou fortificação básica. O benefício de saúde pode incluir a prevenção ou o tratamento de doenças ou mesmo uma melhoria do funcionamento do corpo. A maioria das pesquisas com ingredientes funcionais focaliza sua ação contra o câncer e, assim, vários compostos potencialmente anti-cancerígenos já foram identificados, tais como vitaminas antioxidantes, carotenóides, flavonóides, polifenóis, fitoesteróis, saponinas etc.

Entre os alimentos funcionais existem diversos grupos químicos responsáveis pelas propriedades terapêuticas, ou redutoras de riscos à saúde, dos alimentos funcionais. Os terpenos são encontrados em hortaliças, frutas, produtos de soja e outros grãos. Funcionam como antioxidantes, protegendo os lipídios e os fluidos corporais dos radicais livres. Os terpenos reduzem o risco de câncer de mama, pulmão, cólon, estômago, próstata, pâncreas, fígado e pele.

Os carotenóides, (vitamina A e licopeno), estão presentes em alimentos com pigmentação amarela, laranja ou vermelha (tomate, abóbora, pimentão, laranja). Os limonóides (&-limoneno, pineno, eucaliptol) se encontram nas cascas de frutas cítricas e protegem o tecido pulmonar prevenindo tumores e fortalecendo o sistema imunológico.

Os fenóis são antioxidantes encontrados em vegetais de cores roxa, azul ou violeta (uva, cereja, berinjela). Possuem atividade antiinflamatória, evitam a aglomeração das plaquetas sanguíneas e a ação de radicais livres no organismo, protegendo desde o código genético (DNA) aos lipídios, desta forma abortando os processos carcinogênicos.

Os flavonóides (flavonas e isoflavonas) estão presentes na soja, em frutos cítricos e outros alimentos. A camomila é rica em apigenina, uma flavona com efeito analgésico. A diosmina e a hesperitina, presentes nos frutos cítricos, favorece a atuação da vitamina C no organismo.

Faz-se necessário o estudo da biodiversidade brasileira quanto à presença de componentes bioativos e funcionais com indicação das áreas próprias de cultivo. Importante lembrar que muito de nossa biodiversidade que possa ser utilizada como alimento não é conhecida, portanto faz-se necessário um desenho de ações integradas com os setores industriais, governamentais, pesquisadores, agências de fomento para promover uma ação articulada e seqüencial junto aos grupos de pesquisa brasileiros na área de alimentos visando:

- Desenvolvimento de processos para a garantia da segurança alimentar.

- Desenvolvimento de tecnologias inovadoras para aproveitamento de subprodutos e resíduos em sistemas produtivos.

- Desenvolvimento de tecnologias que promovam a integração de cadeias agroindústriais.

- Implementação de programas da avaliação da conformidade de produtos e processos junto ao setor industrial de alimentos.

- Inovação dos processos tecnológicos de alimentos minimamente processados e semi-prontos.

- Desenvolvimento de processos para a indústria de alimento/alternativa para garantir a presença de moléculas bioativas no alimento final processado.

- Estudo da atividade biológica dos alimentos funcionais in vitro, em vivo em animais e humanos.

Gláucia Maria Pastore é presidente da Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos.

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Atualizado em 10/09/2005

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