Editorial:

As cidades e os muros
Carlos Vogt

Reportagens:
Prós e contras da revitalização urbana
Enfim o Estatuto da Cidade
Programa Habitat procura desenvolver a qualidade de vida nas cidades
Ocupações revelam déficit habitacional
Fórum Social propõe uma outra cidade possível
Novas metrópoles, velhos problemas
Conflitos entre centro e periferia
Qualidade das águas é cada vez pior
Lixo é problema ambiental com agravantes sociais
Transporte em São Paulo: conflitos e soluções
Poluição sonora piora ambiente urbano
Preservação ambiental: destino alternativo para o litoral sul de São Paulo?
Cidade tenta unir tecnologia com inclusão social
Educação para uma nova cidade
Brasília contrastes de uma cidade planejada
Vilas significaram distância entre patrões e operários
Artigos:
Dimensões da tragédia urbana
Ermínia Maricato

Aprovação do Estatuto da Cidade
Geraldo Moura

O passado nas cidades do futuro
Cristina Meneguello
"As cidades nos países subdesenvolvidos" em um mundo globalizado
Tatiana Schor
Cidades e seus fragmentos
Rogério Lima
Cidade, língua, escolae a violência dos sentidos
Cláudia Pfeiffer
A cidade como objeto de estudo
Maria Josefina Gabriel Sant'Anna
Poema:
Manual do novo peregrino
Carlos Vogt
 
Bibliografia
Créditos

 

 


Manual do Novo Peregrino

Carlos Vogt

Nunca mais construir a imitação da excedência da luz,
nunca, digo, não por vontade do indivíduo pleno ou por ensejo,
antes por imposição de pessoa, pacto de imagens, planificado e plano,
este que transforma um guarda-roupa de subjetividades
num ícone errante de dor, angústia, programa de saudades.

Nunca mais o cão alarido atrás de grades familiares,
solo de andarilhos, pose de esfinges, solidão de bares,
nesses de gravuras que vendem fórmulas prontas de dramas finos,
esses que se fazem das mãos cheias de despojos,
como museus de bobagens nos bolsos de meninos:
pedra de bugalho, guimba de cigarro, luz de vaga-lume, canto de cigarra, entulho de desejos.

Posturas, pois, sem erros e atropelos, ali no lugar devido,
como um navio atracado ameaça navegar o cais,
salão em que o mocinho se encontra com o bandido,
e os dois são únicos no mesmo enredo, são um e muitos em muitas capitais.

Se já não há perguntas com respostas para a embriaguez das circunstâncias,
por simplicidade de método, para encurtar o não,
resumo o programa em que se fundem a linguagem com o outro, a imagem com o chão:
agarrar a tolice, como o samurai a mosca, com a espada da bebida,
trocar o aéreo pelo sóbrio, a chama pelo jogo, a sombra pelo líquido,
ser paciente e boi, nos olhos, no cansaço, nas faltas e abundâncias,
ruminar detalhe por detalhe, grama por grama, areia por estrela, símbolo por ação,
desconstruir o sonho pela vida, a vida pelo enigma, o enigma pelo óbvio,
ser banal e bobo na banalidade de ser um e múltiplo, mas não ser ubíquo,
resistir heróica e inutilmente à utilidade da palavra,
como pássaro se perde de si próprio no canto solitário que a gaiola agrava.

Nunca mais o estilo decidido, nunca mais a ilusão do real pelo real,
tampouco a explosão semântica do símbolo cindido,
no modo ambíguo de falar de si para esconder-se mais;
agora não será preciso correr com o espelho sobre o objeto mudo,
no movimento vão de armazenar o mundo,
de construir represas para conter os furos,
de fabricar armários de guardar cascalhos;
não penetrar paisagens pela dimensão da profundidade que elas não têm,
ser lateral e plano na exclamação cruzada de suas molduras,
ficar parado e móvel nas ruínas de cenários como um cenário em ruínas,
habitar a interface do mundo com o muro,
ver e estar sendo visto: janela de neon, poltrona de vacâncias, moinho de securas.

 

 

Atualizado em 10/03/2002

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