Editorial:

Clones e medos crônicos
Carlos Vogt

Reportagens:
Clonagem ainda é técnica em desenvolvimento
Clonagem terapêutica ainda é promessa
Leis restringem pesquisas com células-tronco
Quem defende a clonagem humana
Polêmica também envolveu primeiro bebê de proveta
Clonagem humana é debatida por juízes brasileiros
Políticos tentam regulamentar mundialmente a clonagem
Clonagem já tem amplo uso na agropecuária
Técnica não é novidade na agricultura
Clonagem sob o olhar da religião
Artigos:
Nada contra a clonagem
Bernardo Beiguelman

Clones na mídia
Hélio Schwartsman

Humanos ao amanhecer
Ulisses Capozoli
Seres Híbridos & Clones: da literatura para as telas, das telas para a realidade
Edgar Franco
Poema:
Clones
Carlos Vogt
 
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Políticos tentam regulamentar mundialmente a clonagem

Na era da genética, freqüentemente a ciência invade áreas do sentimento público. Da terapia gênica aos alimentos geneticamente modificados, os assuntos envolvendo DNA evocam retórica ética e opiniões fortemente polarizadas.

O centro do debate parece ser ultimamente a possibilidade da clonagem humana. De um lado, a clonagem pode ajudar a resolver alguns dos mistérios da nossa existência biológica e levar a curas de desordens tais como o mal de Parkinson, lesões da espinha dorsal, doenças cardíacas, e algumas outras condições envolvendo a morte de células. Por outro lado, a história tem ilustrado, muitas vezes, conseqüências potenciais horríveis do progresso científico quando é utilizado com ética e política doentias.

A tensão entre o conhecimento científico bom e o progresso científico mau provoca a idéia que a clonagem desafia nossa noção de si mesmo e o básico significado de "ser".

De certa maneira, surgiu uma intranqüilidade desde que a ovelha clonada Dolly foi apresentada há alguns anos atrás. Em janeiro de 1998, como resposta à Dolly, o Council of Europe(COE) delineou um Protocolo (Protocol on Prohibition of Cloning Human Beings) sobre a proibição de clonar seres humanos como parte da existente Convenção Européia sobre direitos humanos e biomedicina (Convention on Human Rights and Biomedicine).

O protocolo compromete os países que o assinaram a proibir, por lei, qualquer intervenção que procure criar seres humanos geneticamente idênticos a um outro ser humano, se vivo ou morto, sem exceção. As razões, baseiam-se em conceitos filosóficos e de segurança, e são para proteger a identidade de seres humanos, preservar as características casuais de recombinações genéticas de ocorrência natural e impedir instrumentalização através de clonagem artificial.

O tratado, assinado então por 19 membros do COE, poderia tornar-se realidade se ratificado por 5 países. Em 1º de março de 2001, legisladores da Eslováquia (22/10/1998), Eslovênia (5/11/98), Grécia (22/12/1998), Espanha (24/01/2000) e Geórgia (22/11/2000) ratificaram o protocolo, tornando-o o primeiro e único acordo internacional a banir a clonagem. Vinte e quatro dos 43 estados do COE assinaram, indicando o comprometimento em introduzir os preceitos do tratado em sua legislação dentro de 5 anos após assinatura.

O protocolo abrange clonagem humana mas deixa para os países, individualmente, a determinação do escopo do termo "ser humano". Além disso, o tratado não toma posição "sobre a admissibilidade ética de clonagem de células e tecidos para pesquisa que resultem em aplicação médica, um campo em que essa técnica pode se tornar ferramenta importante". De acordo com o COE, questões com relação ao uso de células de embrião em técnicas de clonagem serão cobertas por protocolo sobre proteção de embriões que está por vir.

Adicionalmente, Japão, Portugal, Alemanha, e Dinamarca proibiram toda clonagem humana fora do protocolo da COE, embora os três países europeus não tenham assinado o protocolo.

À parte dos aspectos legais, filosóficos e políticos está a questão da praticabilidade e da segurança da ciência já que a possibilidade da clonagem humana parece iminente. Poucos dias após o protocolo da COE ter entrado em efeito, dois pesquisadores anunciaram na Itália o início do projeto de clonagem humana. Panos Zavos , professor emérito em fisiologia da reprodução e andrologia da Universidade de Kentucky e diretor do Instituto de Andrologia da América, e seu colega italiano, Severino Antinori, planejavam produzir um embrião viável dentro de 12 a 18 meses. Antinori é um especialista em fertilidade, bem conhecido por ajudar mulheres após menopausa a conceberem. Zavos, para desenvolver o projeto, organizou uma equipe internacional de especialistas provenientes do campo da reprodução humana no último quarto do século passado, incluindo um cientista responsável por clonar, pela primeira vez, um rato, em 1979. O propósito do projeto é ajudar casais inférteis a terem filhos.

É interessante notar que, embora haja proibição legal, a exata linguagem das leis, assim como suas bases, diferem. A Alemanha, por exemplo, declinou de assinar o tratado da COE porque sentiu que a medida enfraqueceria a sua lei, já existente, que proíbe pesquisas com embriões humanos.

A legislação existente no mundo que restringe a clonagem parece exibir uma diversidade tão grande quanto são as opiniões sobre a ciência e a ética. As leis vão desde excluir da proteção por patentes nos processos de clonagem, na Austrália, à proibição da aplicação de fundos federais para pesquisa com clonagem humana, em Missouri (EUA), e a proibições penais na Califórnia (EUA).

O Reino Unido, uma outra nação não signatária, vinha mostrando uma evolução das políticas quando chegou a clonagem. A Casa dos Lordes decidiu, em janeiro de 2001, permitir clonagem de embriões humanos sob a condição que os clones não vivessem mais do que 14 dias. A política foi saudada positivamente por muitos, posicionando a Inglaterra como a líder da pesquisa médica.

Na arena da clonagem reprodutiva humana, entretanto, a política não é permissiva. Em abril de 2001, o secretário de saúde Britânico, Alan Milburn anunciou uma iniciativa que poderia excluir a clonagem reprodutiva humana da licença concedida pela lei: "No momento neste país, a clonagem reprodutiva humana está proibida porque a Human Fertilisation and Embryology Authority não mais a licenciará". Até o momento do anúncio, a Human Fertilisation and Embryology Authority podia emitir licença para experimentos envolvendo clonagem.

Alan Milburn disse: "a clonagem humana deve ser proibida pela lei e não simplesmente pela licença. O governo legislará em futuro próximo para explicitamente banir a clonagem humana reprodutiva do Reino Unido."

Ele também anunciou planos para criar quatro centros de tecnologia genética que poderiam colocar a "Grã-Bretanha como líder dos novos serviços genéticos e tecnológicos".

Nos EUA, o assunto tem provocado ondas de atividades no Congresso. Em 28 de março de 2001, em audiência preparada pelo House Subcommitee on Oversight and Investigations (Subcomitê Interno de Supervisão e Investigação), representantes da indústria, academia e comunidades éticas e religiosas apresentaram seus pontos de vista. Rudolf Jaenisch do Instituto Whitehead para Pesquisa Biomédica tem sido um feroz crítico dos esforços correntes em clonagem humana, incluindo os de Zavos. A clonagem humana poderia ser "perigosa e irresponsável" devido a altas taxas de morte fetal e "evidência de anormalidades" em animais clonados. Entretanto, Thomas Okarma, presidente da companhia de biotecnologia GERON, chama a atenção quanto à distinção entre o uso da tecnologia de clonagem para "criar um novo ser humano, daqueles usos apropriados e importantes da tecnologia - tais como clonagem específica de células humanas, genes, e outros tecidos que não levarão a um ser humano clonado." Essas últimas aplicações são "úteis à produção de medicina preventiva, diagnósticos" e outras doenças. Thomas Murray da National Bioethics Advisory Commission (Comissão Nacional de Bioética)relatou as recomendações da Comissão. Embora membros possam não concordar com tudo em relação aos "assuntos éticos que cercam a clonagem de seres humanos, nós apesar de tudo unanimemente concluímos que, dado o estado da ciência, qualquer tentativa para criar uma criança usando transferência de núcleo de célula somática, no setor público ou privado, é incerto em seu resultado, é inaceitavelmente perigoso ao feto e portanto, moralmente inaceitável."

A partir da audiência, muitos membros do Congresso americano propuseram legislação proibindo clonagem para propósitos reprodutivos. Dos seis projetos de lei do Congresso, apresentados até a data, quatro são da Casa dos Representantes e dois são do Senado. Cinco estados já tem promulgado legislação para, diretamente, proibir a clonagem humana, e dez estados têm leis regulando pesquisa com embriões e fetos que também restringem atividades de clonagem.

Atualmente, nos EUA, pesquisas usando tecnologias de clonagem estão sob a jurisdição da FDA (Food and Drug Administration). Pesquisadores precisam submeter uma solicitação de investigação de aplicação de nova droga ao FDA, que a agência examina para determinar se a pesquisa pode prosseguir.

Em 31 de julho de 2001, a Casa dos Representantes votou ampla proibição sobre clonagem humana, tanto a clonagem para reprodução como para fins de pesquisa, tais como para produção de células-tronco que podem ser usadas em terapias. Essa legislação prevê multas e prisão para a desobediência e refere-se a todos os pesquisadores nos Estados Unidos, não somente aqueles que trabalham financiados pelo governo. Para cumprir seus efeitos falta, ainda, referendo do Senado americano, previsto para início de 2002.

Jose B. Cibelli, vice presidente de pesquisa, Robert P. Lanza, vice presidente de desenvolvimento médico e científico, e Michael D. West, presidente, todos da Advanced Cell Technology, uma companhia privada de biotecnologia sediada em Worcester, Massachusetts (EUA), anunciaram em 25 de novembro de 2001 que haviam clonado o primeiro embrião humano (veja reportagem da Scientific American), antecipando-se aos efeitos rigorosos da nova legislação.

Para saber mais:

Na Europa, a equipe do COE está desenvolvendo um protocolo sobre embriões na pesquisa que foram consideradas pelo Steering Commitee on Bioethics, em junho de 2001. O Conselho está também trabalhando em quatro protocolos sobre genética humana e um protocolo sobre transplante de órgãos que será apresentado ao comitê de ministros para adoção e assinatura em 2002.

(JF)

 

Atualizado em 10/12/2001

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