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Admirável Nano - Mundo - Novo
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Nanotecnologia ainda não está no dia a dia das pessoas
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Oscar Loureiro Malta
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Nanotecnologia ainda não está no dia a dia das pessoas

A importância da nanotecnologia para a geração de produtos capazes de fazerem coisas incríveis é bastante especulada pela mídia. Os pesquisadores da área vislumbram aplicações para a tecnologia em muitos ramos, tais como farmacêutico, eletrônico, biotecnológico, e outros. Porém, ainda existem poucos produtos nanotecnológicos que estejam sendo utilizados no cotidiano.

O pesquisador José Antônio Brum, diretor geral da Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron, atribui a dificuldade de transformar a nanotecnologia em produtos à uma questão mais ampla que é a falta de capacidade de transformar pesquisas em inovação. "Talvez o maior entrave ainda esteja nessa nossa dificuldade. O Brasil ainda não desenvolveu uma ampla cultura de inovação, mas isso está mudando nos últimos anos" , diz Brum. Sua opinião é compartilhada por Israel Baumvol, pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS): "não temos nenhuma perspectiva de transformar o progresso científico na área de nanotecnologia em progresso industrial e econômico". Mas, apesar dessa dificuldade, alguns produtos nanotecnológicos já estão sendo desenvolvidos.

Imagem da "língua eletrônica"
Fonte: Embrapa

A língua eletrônica talvez seja o maior exemplo (veja notícia publicada pela ComCiência). Desenvolvida pela Embrapa Instrumentação Agropecuária, através da coordenação do pesquisador-chefe, Luiz Henrique Capparelli Mattoso, a língua eletrônica ganhou repercussão em importantes revistas científicas internacionais como a Nature e o canal de TV Discovery. O equipamento tem grande importância para a aplicação na indústria alimentícia, pois permite avaliar o sabor de bebidas como café, vinho, leite, entre outras, além de servir para avaliar a qualidade da água mineral.

Atualmente, a avaliação do sabor dos produtos é feita por pessoas especialmente treinadas, que analisam sensorialmente as alterações e qualidade do sabor dos alimentos. A língua eletrônica é formada por um sensor capaz de detectar com precisão e rapidez os padrões básicos do paladar (doce, salgado, azedo e amargo) em concentrações tão baixas que os humanos não detectariam. Por essa razão, pode ser utilizada para distinguir diferentes tipos de vinhos, café, chá e água mineral. Mattoso diz que o equipamento tem várias vantagens com relação aos métodos de análise sensorial tradicionais como rapidez, baixo custo, possibilidade de operar de modo contínuo e on-line, entre outros. Ele conta que o uso da nanotecnologia propiciou à língua eletrônica uma altíssima sensibilidade ao equipamento, o que não seria possível com a utilização de outras tecnologias disponíveis.

A indústria farmacêutica é outro campo em que a nanotecnologia pode ser útil. Ela pode ser usada para o desenvolvimento de produtos capazes de tornar os tratamentos menos agressivos ao paciente, bem como para reduzir os seus custos. "Hoje em dia, na quimioterapia, é necessário tomar doses altíssimas de um princípio ativo para assegurar que alguma molécula consiga realmente atingir o alvo e provocar o efeito biológico desejado", afirma o pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais, Antonio Lino. Ele explica que, utilizando o encapsulamento do princípio ativo (a substância ou composto responsável pelo efeito do medicamento), é possível reduzir a dose desses fármacos, diminuindo assim os efeitos colaterais tão danosos aos doentes. Ele conta que a nanotecnologia pode ser útil para proteger as moléculas do organismo além de otimizar os efeitos do tratamento. "O encapsulamento molecular é a última fronteira entre efeito biológico e a estrutura molecular, uma vez que a cápsula, nesse caso, tem o tamanho compatível com as moléculas". Em sua tese de doutorado, o pesquisador apresenta o sistema macromolecular das ciclodextrinas - derivados de açúcar - que, por meio de degradação enzimática, formam uma geometria toroidal (semelhante à de um copo). "Nesse copo, é possível inserir moléculas, porque seu tamanho é adequado e a sua cavidade possui um ambiente hidrófobo (em que as moléculas de água não entram)", exemplifica Lino.

Lino conta que, como no restante do mundo, as pesquisas envolvendo aplicações no ramo farmacêutico ainda estão no início. Para ele, a pesquisa química em nanotecnologia será a próxima onda da pesquisa aplicada no Brasil.

Para criar estruturas suficientemente pequenas, que possam ser utilizadas em uma escala nanométrica, é preciso criar materiais especiais. Cientistas brasileiros estão desenvolvendo pesquisas em materiais nanoestruturados - fundamentais para a criação de nanoestruturas. "São materiais produzidos - em geral artificialmente, embora existam vários na natureza - com o objetivo de colocar em evidência e explorar uma grande variedade de propriedades fisico-químicas que resultam diretamente da sua estrutura formativa, com dimensões na escala do nanômetro, ou seja, de um bilionésimo de metro", diz Israel Baumvol. "Esses materiais apresentam propriedades mecânicas, óticas, eletrônicas, químicas e bioquímicas e muitas outras que são peculiares às nanoestruturas. Entre as aplicações que terão maior impacto sobre nossas vidas podemos citar os nanofármacos, a nanoeletrônica, a gravação e leitura magnéticas, a nanobiotecnologia e inúmeras outras", complementa.

Existem ainda outras possíveis aplicações que já dão sinais da importância da nanotecnologia para o mundo moderno, como é o caso dos nanoimãs estudados pelo Vice-Coordenador da Rede de Nanobiotecnologia do CNPq e professor da UnB, Paulo César Morais. Em sua pesquisa, ele descobriu uma nova utilidade para a nanotecnologia: recuperação de áreas poluídas com petróleo (leia também mais na reportagem Vantagens e riscos da nanotecnologia ao meio ambiente). Nanoimãs são imãs muito pequenos que medem apenas alguns nanômetros. "Por serem materiais de dimensões muito pequenas eles podem se manter, em suspensão, em um fluido. Além disso, os nanoimãs podem ser quimicamente trabalhados para ficarem hidrofóbicos. Dessa forma, quando dispersos em uma mistura água/óleo, os nanoimãs hidrofóbicos dispersam-se na fase óleo, tornando-a magnética. O óleo magnético pode ser retido e removido de ambientes aquáticos com o auxílio de barras de imãs permanentes" explica Morais.

A vantagem dessa tecnologia, em relação aos métodos convencionais de contenção e captação de petróleo derramado, é a sua eficiência e a possibilidade de reutilização dos nanoimãs. O pesquisador afirma que a nanotecnologia pode ser muito útil para restauração de áreas degradadas ambientalmente, mas infelizmente ainda não é possível colocar os resultados das pesquisas em prática. Se fosse, os nanoimãs de Morais certamente seriam uma ótima alternativa no Kuwait, que teve sua paisagem marcada, após a Guerra do Golfo, por enormes piscinas de petróleo, com conseqüências desastrosas para o meio ambiente.

Na opinião de Brum, a nanotecnologia é ainda uma tecnologia muito nova para que sejam descobertas grandes aplicações. "Se quisermos continuar avançando na miniaturização e na maior capacidade computacional, teremos que desenvolver uma tecnologia nova, provavelmente baseada em conceitos nano. O mesmo se verifica para as memórias magnéticas. A combinação da 'nanotecnologia' já praticada pela natureza com o desenvolvimento de nossa capacidade de manipulação nessa escala, poderá levar ao desenvolvimento de uma capacidade de atuação nos sistemas biológicos nunca imaginados antes. Isso, no entanto, ainda está no domínio de estudos, embora alguns sucessos em laboratórios já tenham sido obtidos", diz o pesquisador.

Vale salientar que não é somente no Brasil que os produtos nanotecnológicos ainda pertencem muito mais ao mundo das idéias do que ao dia a dia das pessoas. Brum conta que as inserções industriais da nanotecnologia ainda são incipientes, e atualmente os países vêm se destacando muito mais pelos investimentos feitos na pesquisa do que pelas aplicações. "O que podemos destacar são os países que vem investindo fortemente nesta área, como os EUA, a Comunidade Européia e o Japão, que possuem programas nacionais de nanociência e nanotecnologia na ordem de centenas de milhões de dólares".

(JS)

 
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Atualizado em 10/11/2002
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