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Química ilusória

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Norman Borlaug (químico), Nobel da Paz em 1970.
Fonte: Nobel.

 

 

A falácia dos produtos químicos

O conceito de sustentabilidade, em sua forma mais simplificada, consiste em considerar que a atuação do ser humano sobre o meio ambiente deve ser direcionada para assegurar às gerações futuras as mesmas oportunidades que tivemos quando aqui chegamos.

A agricultura, pela sua íntima relação com a natureza, representa um dos exemplos mais dramáticos de rompimento desse conceito. Em busca do aumento da produtividade num mercado altamente competitivo, a solução encontrada pela chamada "agricultura moderna" foi a mecanização e o uso de fertilizantes e defensivos agrícolas.

Nos últimos 50 anos, os sistemas integrados de manejo agrícola, onde os resíduos das culturas eram utilizados na alimentação animal ou na incorporação ao solo e o esterco era retornado ao solo de modo balanceado, praticamente desapareceram. Neste sistema de produção, os componentes eram complementares entre si, fazendo parte de uma cadeia produtiva auto-sustentável.

Desde a 1ª Revolução Agrícola, que ocorreu no início do século, e em especial após a Revolução Verde, lançada na década de 50, as fazendas têm se tornado mais especializadas separadamente nas culturas e na criação do gado, intensificando o uso de agroquímicos, fertilizantes e água. Os agroquímicos contaminando as águas subterrâneas ou rios podem prejudicar a fauna silvestre e ameaçam a sua qualidade para o consumo humano. Nitratos e fosfatos de fertilizantes e resíduos orgânicos de estercos animais e efluentes de silagem, contribuem para o crescimento de algas nas superfícies das águas, provocando a diminuição da oxigenação das águas e a morte dos peixes.

A Revolução Verde, saudada como a solução para o problema da fome do mundo, rendendo inclusive um Prêmio Nobel para seu idealizador, está aquém de sua premissa original. Consolidou-se centrada no "tripé dos sonhos" das grandes companhias: sementes híbridas, que exigiam adubação química intensiva e a utilização crescente de venenos, chamados eufemisticamente de "defensivos", enquanto as pragas adquiriram resistência crescente aos mesmos.

Esse mercado gerou em 1998 a renda para as principais companhias: de US$ 15 bilhões para as que trabalham com sementes, US$ 50 bilhões para as fabricantes de adubos e US$ 35 bilhões para as que produzem venenos. O desenvolvimento das grandes empresas fabricantes de insumos passou a financiar as pesquisas na agricultura desde a Revolução Verde, deixando a agricultura moderna sempre "em moda".

"O maior erro do Brasil foi copiar este sistema. A monocultura, criada pelos europeus e americanos, funciona bem em países de clima temperado, onde numa época do ano o gelo quebra o ciclo das doenças e pragas", explica o pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Edmilson Ambrosano. Nestes locais para iniciar um novo plantio é preciso preparar o solo novamente, porque o agricultor tem pouco tempo para plantar. Eles usam a gradagem para ajudar a derreter o gelo e queimar matéria orgânica para aumentar a ciclagem dos nutrientes. Já nosso inverno apenas diminui as pragas, mas elas estão sempre aptas a se multiplicarem muito rapidamente. "O Brasil adotou este sistema sem ter o gelo para quebrar o ciclo das doenças", alerta Ambrosano. "Temos capacidade de dobrar a produção de alimentos com a adoção de técnicas primárias de agricultura", complementa.

A modernização da agricultura desestabilizou comunidades inteiras na América Latina, África e em outras partes. Tais comunidades dispunham de uma agricultura estável há centenas de anos com suas próprias sementes. As sementes híbridas, plantadas nas condições ideais promoveram inicialmente um aumento de produção, enquanto havia material orgânico disponível no solo para reter os nutrientes. Com o passar do tempo as terras se exauriram e o agricultor já não podia comprar as sementes e seus acessórios (adubo e veneno).

Adicionalmente ocorreu o envenenamento dos agricultores, dos alimentos e do meio ambiente, pelo uso crescente dos venenos. A situação tornou-se pior que anteriormente.

A contaminação do solo e da água pode ser provocada quando a atividade agropecuária é intensa e o resíduo orgânico não é decomposto rapidamente. Quando in natura, os resíduos podem queimar as plantas pela elevação da temperatura ou os produtos primários de sua decomposição serem levados para os lençóis freáticos. A contaminação da água por nitratos ou microrganismos patogênicos provoca problemas crônicos na saúde humana. Os alimentos provenientes destas produções de uso constante de agrotóxicos, contêm resíduos destes produtos químicos que também apresentam riscos para as pessoas que o consomem. "Quando adotamos as práticas de monocultivo foi um desastre. É um sistema anti-natural", afirma Ambrosiano.

O pesquisador lembra que na natureza existem várias espécies crescendo num mesmo espaço, gerando a competitividade e o equilíbrio de insetos e pragas. Os defensivos são em sua maioria seletivos. Eles exterminam os insetos, tanto os predadores quanto os insetos praga. A agricultura quebra este ciclo criando um sistema artificial, que não se mantém naturalmente.

Apregoa-se intensionalmente que não existe alternativa a esse modelo, teimosamente mantido apesar da sua insustentabilidade. A agricultura orgânica, praticada na China há milênios, sustentou até pouco tempo um terço da população mundial numa área útil correspondente à do Estado do Pará, mostrando-se como uma alternativa viável à agricultura predatória convencional dependente do uso intensivo de insumos.

Por requerer o uso intensivo de mão-de-obra, a agricultura orgânica consiste também numa alternativa de empregabilidade das imensas massas de trabalhadores expulsos do campo pela mecanização crescente da agricultura. É uma forma de se produzir alimentos saudáveis resolvendo o problema de desemprego na área.

Existe no mercado mundial uma tendência crescente de produção e de compra de alimentos naturais, contando inclusive com apoios governamentais. Na Europa e EUA os cultivos orgânicos crescem de 25 a 60% ao ano. O mercado brasileiro tem crescido 10% ao ano e 70% da produção é exportada, gerando receita de 10 milhões de dólares. O governo inglês planeja converter para o cultivo orgânico, 20% de sua agricultura convencional. A Alemanha, maior consumidor mundial de produtos orgânicos, determinou que progressivamente toda a alimentação infantil deverá ser constituída por alimentos orgânicos.

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