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http://www.comciencia.br/reportagens/2005/03/03.shtml

Autor: Daniel Chiozzini
Data depublicação: 10/03/2005

Teoria unificadora permanece em aberto

Albert Einstein é um nome de consenso no mundo da ciência. Mas o berço do homem que ficou mundialmente conhecido foi a física teórica, que visa explicar a natureza e o mundo sem a preocupação direta de gerar novos processos, produtos ou aplicações. Suas teorias abriram as portas para uma nova concepção de natureza, mundo e até do universo, envolvendo desde a menor partícula subatômica até o movimento dos astros. O ponto de partida para o reconhecimento mundial de Einstein foram os três artigos publicados em 1905, nos quais ele defendeu idéias que não só tiveram grande impacto em diversos campos da ciência como ainda não eram possíveis de serem comprovadas experimentalmente com 100% de exatidão. No entanto, o homem já definido como "gênio do século XX" não atingiu uma de suas maiores metas: uma teoria que unifique todas as leis da física, que até hoje mobiliza um grande número de cientistas: .

Um dos artigos de 1905 diz respeito ao chamado "efeito fotoelétrico" e apresenta uma teoria que culminaria com o prêmio Nobel de 1921. O físico alemão defendeu a idéia que a luz não era uma entidade ondulatória, mas composta de partículas denominadas fótons. Idéia revolucionária para a época, segundo o professor Victor Rivelles, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP): "Na época, já se considerava que o elétron, uma das partículas subatômicas, poderia ser definido como uma onda, mas Einstein propôs o inverso, de que a luz fosse vista como uma partícula", explica. A teoria foi amplamente testada e criticada até se chegar no atual consenso de que a luz tem um comportamento dual, ou seja, se propaga como uma onda, porém se comporta como partícula quando interage com a matéria. Mesmo enfrentando a resistência de grandes nomes da comunidade científica, as idéias de Einstein foram finalmente aceitas em meados do século XX: "Em 1949, o físico americano Robert A. Milikan, considerado o primeiro cientista a medir a carga de um elétron, confessou ter dedicado mais de dez anos de trabalho testando a equação de Einstein para o efeito fotoelétrico, com absoluto ceticismo em relação a sua validade", explica Paulo Freitas Gomes, doutorando do Instituto de Física da Unicamp. Ao contrário das expectativas de Milikan, os resultados experimentais confirmaram a teoria, sem qualquer ambigüidade.

Outra idéia audaciosa, lançada em 1905, foi a explicação do chamado "movimento browniano", constatado a partir das lentes do microscópio do cientista Robert Brown no início do século XIX. O experimento era relativamente simples: ao colocar partículas de pólen em uma gota d'água, as mesmas mantinham-se em um constante movimento caótico. A causa era desconhecida e gerou uma corrida da comunidade científica no início do século XX, vencida por Einstein. Sua conclusão dizia que a causa do fenômeno era o choque constante das partículas de pólen com as moléculas de água, gerando o movimento caótico. Para se ter uma idéia do significado da afirmação, foi a primeira proposta concreta de comprovação da existência de átomos no âmbito da física: "Hoje a existência de átomos é vista como uma coisa trivial, mas no início do século era uma idéia que encontrava bastante resistência", afirma Victor Rivelles. A partir daquele momento, "passou-se a aceitar a idéia de que os átomos eram reais e não uma entidade fictícia que auxiliava os químicos a estabelecer determinadas leis", completa o pesquisador. O terceiro artigo, publicado no ano de 1905, fixa as leis da relatividade restrita, que podem ser definidas, em linhas gerais, como a comprovação de que nenhum fenômeno se propaga em uma velocidade acima da velocidade da luz.

Segundo Rivelles, todos os três artigos de 1905 demonstram a grande competência de Einstein, porém precederam o apogeu da sua carreira: "Tratava-se de fenômenos que estavam sendo amplamente pesquisados e, mais cedo ou mais tarde, seriam descobertos por alguém", afirma. Cerca de dez anos depois, Einstein lançaria a teoria da relatividade geral, que o tornaria mundialmente famoso.

Rivelles explica a teoria da relatividade geral a partir de um exemplo bastante claro. De acordo com a mecânica newtoniana vigente em 1915, entre quaisquer dois corpos celestes haveria a atuação de uma força gravitacional de tal dimensão que, se pudéssemos mover o sol de lugar, imediatamente a terra também alteraria sua órbita. Só que, a partir da relatividade restrita, Einstein apontou um primeiro problema: como nenhum fenômeno pode se propagar com velocidade superior a da luz, o efeito da mudança do sol levaria cerca de 6 a 7 minutos para repercutir na terra, já que este é o tempo aproximado que os raios solares demoram para chegar até o nosso planeta. Einstein propôs, então, uma teoria da gravitação que respeitasse esse limite.

Só que o preço pago foi muito alto: esta idéia fundamentou uma outra concepção de espaço e de tempo. Para Isaac Newton, espaço e tempo eram fixos, não participavam da física. No entanto, para que a gravitação tivesse essa velocidade limitada (como no caso dos seis a sete minutos para uma alteração na órbita do sol ser sentida na terra), era preciso que o espaço e o tempo dependessem do conteúdo da matéria do universo. Espaço e tempo passaram a ser variáveis consideradas pela física e o universo passou a ser visto como uma grande membrana, que se deforma de acordo com a matéria que existe dentro dele.

Hoje se reconhece que a relatividade geral é muito mais profunda e também deveria ter lhe rendido o Prêmio Nobel de Física. Segundo Victor Rivelles, seu valor está também no fato de que não havia nada que indicasse a necessidade de alteração da lei da gravitação, diferentemente dos fenômenos que inspiraram os estudos anteriores. Além disso, os testes que buscam comprovar sua validade estendem-se até os dias atuais, pois na época em que ele foi concebido praticamente não havia um suporte experimental refinado que o comprovasse.

De acordo com Paulo Gomes, da Unicamp, a busca pela sua comprovação permanece até os dias atuais. Pesquisadores da Universidade de Stanford (EUA) e da Nasa, a agência espacial do governo norte-americano, construíram, em abril do ano passado, um experimento denominado Gravity Probe B para testar as últimas previsões da teoria da relatividade geral. Foi enviado para orbitar a cerca de 640 Km dos pólos da terra um satélite com giroscópios totalmente livres de qualquer perturbação. Os equipamentos têm a função de constituir um sistema de referência de nosso espaço-tempo quase perfeito. Eles irão medir as distorções no referencial de espaço-tempo motivas pelo movimento gravitacional terrestre. Segundo Gomes, “embora de impacto muito pequeno na vida da grande maioria dos seres humanos, esses efeitos têm implicações profundas para a natureza da matéria e da estrutura do universo”, afirma.

Mesmo assim, Gomes afirma que ainda há aspectos relevantes da teoria a serem comprovados. Questionado sobre o motivo de, depois de quase 8 décadas da publicação dos trabalhos de Einstein, os cientistas gastarem tanto tempo e dinheiro para testar a teoria da relatividade geral, ele afirma: “Apesar dela estar entre as mais brilhantes criações da mente humana, unindo espaço, tempo e gravitação, e de trazer uma luz para o entendimento de fenômenos bizarros como buracos negros e expansão do universo, ela continua sendo uma das menos testadas e mais complexas teorias científicas”, conclui.

Na contramão
Paralelamente a essa trajetória pessoal de sucesso, Einstein ajudou indiretamente a consolidar a chamada mecânica quântica: "A interpretação do fenômeno fotoelétrico e as previsões da teoria da relatividade trouxeram um novo e definitivo impulso para aquilo que hoje chamamos de mecânica quântica, que é o ferramental teórico para entendermos como coisas muito pequenas, como moléculas, átomos e partículas subatômicas, se comportam", afirma Leandro Tessler, professor do Instituto de Física da Unicamp. Segundo explica o físico, a teoria da relatividade também permite concluir, no que diz respeito ao mundo microscópico, que o processo de aceleração de partículas seguido do choque com algum metal gera emissão de radiação. Posteriormente, descobriu-se a utilidade desse princípio na construção de aparelhos de raios-x e infra-vermelho, utilizados em diversos tipos de equipamentos.

Curiosamente, Einstein iria bater de frente com a mecânica quântica nos últimos anos de sua vida, mesmo com novas pesquisas e avanços tecnológicos obtidos. Isto porque boa parte da teoria desse ramo da física, surgida posteriormente aos seus artigos, trabalha com probabilidades estatísticas e não com explicações causais para os fenômenos que acontecem no mundo das partículas atômicas. Daí surgiu a famosa frase "Eu não acredito que Deus jogue dados com o mundo", que ilustra aquilo que alguns biógrafos chamam de "beco sem saída" do final da sua vida. Segundo Victor Rivelles, "a mecânica quântica contraria muito o bom senso e é muito difícil de ser compreendida, mas acabamos aceitando porque vamos ao laboratório e identificamos os fenômenos que ela prevê". No entanto, segundo o professor da USP, Einstein não aceitava tal situação e morreu acreditando que a mecânica quântica era algo provisório, mesmo quando a grande maioria da comunidade científica já a considerava fundamental.

Outro fator que reforçava a desconfiança de Einstein com a mecânica quântica era a contradição com alguns pontos da teoria da relatividade, que inviabilizava outra busca incessante do final da sua vida, a de uma teoria totalizante que englobasse todas as leis da física. Rivelles destaca que algo que chama a atenção de muitos físicos nos dias atuais é essa contradição: "Se você tentar aplicar a mecânica quântica junto com a relatividade geral, ou seja, buscar efeitos quânticos no campo gravitacional, importantes para entendermos os buracos negros ou a formação do universo, vamos obter uma inconsistência", afirma o pesquisador. Desse modo, Einstein insistia em questionar a mecânica quântica

Apesar dessa situação ter abalado sua imagem, o legado de Einstein para a ciência e para humanidade permaneceu inquestionável, mesmo distante daquilo que hoje é chamado de física aplicada, voltada para a resolução de problemas práticos: "Einstein deu uma contribuição eminentemente teórica para a física, investigando simplesmente o que é o universo, sem se preocupar com aplicações", completa Victor Rivelles. No entanto, segundo Leandro Tessler, seu legado é extremamente abrangente, repercutindo em áreas como nanotecnologia, ciência dos materiais, teorias de formação do universo e energia nuclear, entre outras.

Unificação pode vir da teoria das cordas - A principal teoria que está avançando na busca de uma unificação das leis e princípios da física é a teoria das cordas, porém não segue a linha proposta por Einstein, que desconsiderava a mecânica quântica. Trata-se da teoria das supercordas, que visa explicar as quatro forças fundamentais em atuação no universo: a gravitacional, a eletromagnética, a nuclear forte e a nuclear fraca. Entre os que colaboraram de maneira significativa para o seu advento, estão o físico alemão Theodor Kaluza e do sueco Oscar Klein. A teoria considera que as cordas são unidades fundamentais do nosso universo: "A premissa básica é que tudo no nosso universo seriam cordas, incluindo as partículas subatômicas, mas com comprimento extremamente pequenos" afirma Paulo Gomes.

(DC)

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Atualizado em 10/03/2005

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