Técnica melhora procedimento de detecção de doença em eucalipto

Por Maria Letícia Bonatelli

Desenvolvida por pesquisadora do Brasil, promete diminuir o tempo e aumentar a confiabilidade da detecção da ferrugem

O aparecimento de doenças e pragas na agricultura causa perdas significativas na produção de alimentos. Na tentativa de impedir que novas doenças sejam introduzidas ou disseminadas nos países, órgãos governamentais adotam medidas de proteção agropecuárias. No entanto, tais medidas podem não ser completamente efetivas. Dessa forma, pesquisadores buscam desenvolver técnicas mais sensíveis e rápidas de detecção de patógenos de planta, que possam ser regulamentadas e utilizadas.

Em 2018, no encontro anual realizada pela Convenção Internacional para a Proteção dos Vegetais (CIPV), a diretora geral adjunta da ONU para a Alimentação e a Agricultura (FAO), Maria Helena Semedo, afirmou em seu discurso que, a cada ano, entre 10 e 16% da colheita mundial é perdida por conta de pragas. Estima-se que essa perda chegue a US$ 220 bilhões.

A produção agropecuária é de grande importância para a economia nacional. Em 2016, essa atividade teve uma participação de 5,45% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. No mesmo ano, o valor da produção de silvicultura – atividades ligadas ao cultivo de árvores – rendeu quase R$ 14 bilhões. Essa atividade gera o carvão vegetal, a lenha e a madeira em tora.

Dentre as espécies florestais plantadas para exploração, o eucalipto é a principal. A espécie é nativa da Austrália, mas adaptou-se muito bem ao Brasil. Em 2016, a área total de árvores plantadas totalizou 7,84 milhões de hectares no país, sendo que o plantio de eucalipto corresponde a 5,7 milhões dessa área. Assim, torna-se importante evitar doenças que acometam essa cultura.

A doença ferrugem do eucalipto

A ferrugem do eucalipto é causada pelo fungo Austropuccinia psidii e foi cerne da pesquisa de Andressa Peres Bini. A pesquisadora, que concluiu o doutorado em genética e melhoramento de plantas pela Esalq/USP, focou justamente no desenvolvimento de uma metodologia de detecção desse patógeno em plantas que ainda não apresentavam os sintomas da doença.

O aparecimento da ferrugem pode provocar perdas significativas na produção de madeira.  “A doença ataca folhas e brotos jovens, deixando as plantas com características arbustivas. O que não é interessante para a indústria de papel e celulose”, afirmou Andressa.

A ferrugem é uma doença característica da família Myrtaceae, que inclui plantas como goiaba, jambo, pitanga. E foi descrita pela primeira vez, em eucalipto, no Brasil. “Ao longo do tempo, começou a ser detectada em eucaliptos de vários países, e atualmente está presente em quatro dos cinco continentes. Uma das principais formas de dispersão da doença é através do vento. Mas o que explicaria esse fungo percorrer grandes distâncias?”, questiona Andressa.

No Brasil, o órgão responsável por fiscalizar e controlar transporte de produtos vegetais e insumos agrícolas é o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. E ele tem como função estabelecer as regras que garantam a qualidade, segurança e conformidade dos produtos, além de avaliar o risco de disseminação de pragas e doenças.

No caso do eucalipto, por exemplo, a depender do país de origem e do produto vegetal que será importado – plantas, sementes, madeiras, ou outros – serão necessários requisitos fitossanitários específicos. “Atualmente, o que é regulamentado é a adoção da quarentena. Mesmo que tenhamos desenvolvido esse novo método, ele não é regulamentado para garantir que o material vegetal não esteja infectado com o fungo” afirma a pesquisadora.

A técnica

A vantagem desse novo método está na rapidez e especificidade. Isso porque, a depender do grau de susceptibilidade ou resistência da planta, a doença demorará mais ou menos tempo para aparecer.

Andressa explicou que o método se baseia em procedimentos modernos adotados na biologia molecular, e que é capaz de detectar o DNA do fungo presente nas folhas de eucalipto, indicando a presença do patógeno mesmo antes do aparecimento dos sintomas. “Desenvolvemos uma metodologia, capaz de detectar a sequência de DNA do fungo em plantas infectadas”, afirmou.

A aplicação dessa técnica pode ser muito útil para a realização de processos fitossanitários de importação, mas também pode ser um bom método para o controle da doença em empresas. “Seria uma estratégia para detectar precocemente materiais contaminados em viveiro de mudas e, dessa forma, descartá-los antes do aparecimento de esporos que disseminam a doença. Também evitaria levar a campo materiais que provavelmente terão produção baixa”, pontuou Andressa.

A aplicação técnica inicia-se com a coleta de folhas de eucalipto (1). É realizada a extração de DNA (2) total dessas folhas, tanto do DNA de eucalipto (em verde), quanto do fungo (em azul) – quando presente. A seguir, a análise (3) empregada leva o nome de reação em cadeia da polimerase em tempo real (em inglês: real-time polymerase chain reaction – RT-PCR), na qual pequenos fragmentos de DNA, específicos para o DNA do fungo, ligam-se a esse DNA e promovem o alongamento dessa sequência. Nesse processo, são incorporados ao DNA moléculas fluorescentes que, então, permitem a detecção (4) apenas das moléculas do DNA do fungo (quando presentes).

Além disso, essa técnica possui metodologia moderna e existe a necessidade de os órgãos regulamentários adotarem medidas que possam ser mais confiáveis para a detecção de patógenos em planta, evitando perdas na agricultura. “A ideia, no futuro, é que esses métodos sejam regulamentados para auxiliar nas medidas fitossanitárias”, prevê a pesquisadora.

Maria Letícia Bonatelli é formada em ciências biológicas (Unicamp), com mestrado e doutorado em ciências (USP). É aluna do curso de jornalismo científico do Labjor e bolsista Mídia Ciência (Fapesp).