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COVs: os pouco estudados vilões das emissões veiculares
Por Juliana Almeida
12/06/2007
Em tempos de aquecimento global, estudos sobre o gás carbônico e seus efeitos tomam grande parte do tempo de pesquisadores e da pauta de debates sobre o tema poluição. Em contrapartida a esta tendência, Édler Albuquerque, aluno de doutorado da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp, realizou um importante estudo sobre compostos orgânicos voláteis (COVs) poluentes perigosos e pouco estudados pelo meio científico. Sua pesquisa, que culminou em tese defendida no dia 14 de maio, traçou de forma inédita e detalhada o perfil destes compostos na atmosfera da região metropolitana de São Paulo.

Compostos orgânicos voláteis, também conhecidos como COVs, são compostos que contêm carbono, facilmente vaporizados em condições de temperatura e pressão ambiente e reagem fotoquimicamente na atmosfera. Monóxido e dióxido de carbono não estão presentes nesta categoria e não foram estudados nesta pesquisa. Os COVs têm um grande impacto sobre a saúde humana em função da sua alta toxicidade e efeito cancerígeno. Além disso, através de reações químicas, formam o ozônio troposférico, que fica concentrado nas baixas camadas da atmosfera. Segundo dados da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), este tipo de ozônio é o único poluente monitorado que ainda ultrapassa, com freqüência, os limites de qualidade e segurança estabelecidos pela legislação.

Segundo Albuquerque, tolueno, xileno, hexano, etilbenzeno e trimetilbenzeno foram os COVs encontrados em maior concentração na atmosfera. Estes compostos, que estão entre os COVs com maior potencial para a formação de ozônio, são os de maior emissão pelos veículos. Os dados obtidos formaram uma espécie de “impressão digital” das emissões veiculares, que pode ser aplicada à maioria dos grandes municípios brasileiros, em função da dinâmica semelhante entre eles. Para se chegar a esses resultados, foi realizada uma campanha de recolhimento de amostras em dois grandes túneis da cidade de São Paulo: os túneis Maria Maluf e Jânio Quadros. Este estudo comprovou que a principal fonte de COVs é, de fato, a crescente frota veicular das cidades.

Para a coleta e análise das amostras na pesquisa, foram utilizados tanto o método passivo quanto o método ativo de amostragem. A amostragem ativa depende do bombeamento contínuo e controlado do ar atmosférico através de uma estrutura que retêm os poluentes. Normalmente esse tipo de amostragem leva em torno de uma hora, fato que gera um número pequeno de amostras e um grande tempo despendido. Na amostragem passiva, os poluentes se difundem através de um tubo que fica exposto ao ar atmosférico por cerca de 12 dias. Enquanto na primeira coleta são usados centenas de tubos para cada ponto de amostragem, na segunda usa-se apenas um. O uso da amostragem passiva, ao invés do uso exclusivo da amostragem ativa, permitiu uma economia de tempo e dinheiro e uma ampliação da área de monitoramento e número de locais monitorados.

O estudo de Albuquerque é de grande importância para o meio científico, uma vez que dados sobre esses componentes são muito escassos na literatura científica. “Há uma dificuldade muito grande de coleta e os métodos analíticos são complexos e caros, de forma que não há uma grande quantidade de dados disponíveis a respeito de compostos orgânicos voláteis”, declara o professor Edson Tomaz, orientador do trabalho. A pesquisa, que foi abrangente e detalhada, poderá orientar políticas de contenção dos poluentes em todas as grandes cidades brasileiras. A primeira vez que a legislação brasileira apontou alguma forma de controle desses compostos foi em 2006 e ainda não há políticas públicas específicas de controle de COVs.

Políticas públicas versus aumento da frota veicular

As décadas de 70 e 80, mas principalmente a década de 80, ficaram marcadas pelos níveis exorbitantes de poluentes na atmosfera e pelos graves problemas de saúde pública causados por eles em grandes cidades brasileiras, como São Paulo e Cubatão. Para minimizar os problemas, foi criada a resolução Conama n° 3 , em 1990, que estabeleceu limites para emissão de poluentes atmosféricos. O setor automobilístico, por exemplo, foi obrigado a desenvolver novas tecnologias de forma que os novos carros atendessem às regulamentações. Os limites aceitáveis de emissão tornaram-se cada vez mais rigorosos e hoje os carros são bem menos poluentes que os carros mais antigos. Juntamente com ações como o rodízio de automóveis, essas políticas públicas têm sido avaliadas como positivas.

Na pesquisa de Albuquerque, foi realizada uma comparação dos dados obtidos por ele com alguns dos poucos dados existentes sobre os compostos orgânicos voláteis na Grande São Paulo. A comparação indicou que as políticas adotadas para a redução da concentração de diversos componentes também produziram bons resultados em relação aos COVs.

No entanto, em contrapartida a estas reduções, a frota de 4,3 milhões de veículos automotores da cidade de São Paulo - número estimado pela Secretária de Transportes Metropolitanos do Estado - cresce cada vez mais, fato que é observado também em outras cidades brasileiras. Segundo Tomaz, existem, na verdade, dois efeitos concorrentes. “De um lado está a redução das emissões por veículo, fruto de uma legislação bem sucedida; de outro, o aumento da frota veicular. Por enquanto, o primeiro supera o segundo. Contudo, a redução das emissões por automóvel vai ter uma evolução cada vez mais lenta. Há uma tendência de estabilização e uma expectativa de que, no futuro, os níveis de poluição voltem a crescer novamente, a menos que novas tecnologias surjam e políticas de organização do trânsito sejam criadas e aplicadas”, afirma o orientador da pesquisa.