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Teoria do drone

Livro do filósofo Grégoire Chamayou traz reflexão sobre o drone como instrumento de poder e arma de guerra, e sobre impactos na sociedade. Obra mostra a urgência de pensar o artefato já incorporado no dia a dia.

Patrícia Santos
10/06/2016
Vez ou outra nos deparamos com notícias sobre novos usos dos drones. Seja para entregas em domicílio, fazer o trabalho de garçom em um restaurante, coletar imagens aéreas em locais de risco ou, simplesmente, como brinquedo. A inserção dessa tecnologia é cada vez maior no cotidiano, e os impactos de seu uso devem marcar de maneira profunda a cultura contemporânea. Algumas dessas mudanças são vistas nas relações de poder entre países, entre centros e periferias pelo mundo, entre Estados e indivíduos. Essas questões são abordadas no livro Teoria do drone, de Grégoire Chamayou.

Filósofo e pesquisador no Centre National de la Recherche Scientifique, em Paris, Chamayou usa referências teóricas, e também diferentes recursos como depoimentos veiculados na mídia, para enfocar sua análise no uso do drone como arma militar, na chamada “guerra ao terror”. Sob esse propósito, inimigos no Afeganistão, Waziristão ou em qualquer localidade a que se estenda a busca por terroristas, a qualquer momento, podem ser atingidos por drones controlados a milhares de quilômetros. Nesse contexto, é possível perseguir terroristas até mesmo sem considerar a soberania dos Estados. Diferente das guerras dos livros de história, não há mais conquista de territórios, mas a busca da presa onde ela estiver, em nome de uma política para o poder. “O que podia ainda se apresentar como um combate converte-se em simples campanha de abate”, diz. Um dado interessante registrado pelo autor é que, atualmente, são formados mais operadores de drones nos Estados Unidos do que pilotos de avião de combate e bombardeiro juntos.

Em sua narrativa ou “investigação filosófica”, Chamayou se posiciona contra o uso do drone como instrumento de guerra. Conduz o leitor a refletir sobre a crise ética que essas novas investidas militares impõem: são unilaterais, violam o direito de guerra e colocam em debate o próprio significado da guerra. De salas seguras é possível estender as forças militares a qualquer território, enquanto apenas o inimigo está exposto. Ao fim do dia, os operadores dessas armas levam uma rotina comum, saem do trabalho e buscam seus filhos na escola.

O livro traz, secundariamente, algumas referências sobre a origem dos drones, inclusive das aparições no cinema. A obra também não se aprofunda em como funcionam tecnicamente esses aparatos, e quais são os seus recursos como armas.

Mais relevante é quando Chamayou questiona a precisão com que os drones são capazes de atingir os alvos, com perímetro de alcance de 15 a 20 metros. Assim, se um alvo é localizado em um prédio, o imóvel inteiro pode ser destruído. Para Chamayou, o drone é muito mais um dispositivo “necroético”, uma vez que há cadáveres a serem contados, mas não se sabe com certeza se o alvo principal foi atingido.

O autor ainda apresenta algumas vulnerabilidades dessas armas, como a possibilidade de serem hackeadas, e as limitações das imagens que geram. Essa análise aponta que o uso de drones não é necessariamente efetivo, e tampouco têm melhor capacidade de identificar o alvo. Também contrapõe o argumento de que há menores despesas e perdas humanas (do lado de quem ataca), analisando o resultado de maneira sistêmica.

O livro inclui uma visão sobre as consequências psicológicas para os que lidam com essa tecnologia, já que os ataques não alcançam apenas seus alvos, mas também civis, como é noticiado com frequência na mídia. O leitor de Teoria do drone conhecerá depoimentos sobre como é conviver com o zumbido constante do motor dos drones que, do céu, apontam para a possibilidade de novas investidas a qualquer momento.

Hoje, a guerra a distância tem por pressuposto atender aos anseios da população preocupada com o terrorismo – e faz com que deixem de lidar com os problemas no âmbito da política interna e das relações entre países.

Chamayou leva o leitor a pensar em outra perspectiva fundamental, a de que os drones, cada vez mais, devem desenvolver a capacidade de se tornarem mais discretos, e até de se ocultar. Daqui a 25 anos, nanodrones, robôs-insetos autônomos poderão trafegar em espaços cada vez mais confinados, prevê o autor.

A obra não segue uma narrativa estritamente acadêmica, apesar de se intitular como “teoria sobre uma arma”. O título se compreende quando a narrativa perpassa implicações da adoção dessa tecnologia na guerra, aponta efeitos sobre usuários e inimigos, proporcionando uma leitura bastante direta, parecida com a linguagem de documentário. Também aborda outros tópicos que permeiam essa relação, como, por exemplo, a forma como o Estado lida com o drone contra seus inimigos e contra sua própria população.

A reflexão em Teoria do drone é importante, sobretudo, por mostrar a urgência de pensarmos esses artefatos além de serem novas máquinas incorporadas no dia a dia. Assim como outras tecnologias usadas na guerra, a tendência é que vejamos os drones sendo usados nas cidades como instrumento policial ou do Estado. É tempo de nos prepararmos para que as condições que asseguram os direitos individuais e, da sociedade que almejamos, sejam garantidas.

Teoria do drone

Autor: Grégoire Chamayou

Editora: Cosac Naify

Páginas: 320

Ano: 2015