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Fim do vestibular: o Brasil tenta chegar lá

Quando foi aprovada, no final de 1996, a nova Lei federal de Diretrizes e Bases trazia uma novidade que agradou aos que almejavam ingressar na universidade: o fim do vestibular. Mas, isso ainda tem custado a acontecer em grande parte das universidades brasileiras, principalmente nas públicas. A proposta do Ministério da Educação (MEC) de tornar obrigatório o Enem - Exame Nacional de Ensino Médio - lançada em junho deste ano é uma tentativa de dar os primeiros passos para a extinção do vestibular, mas ainda são poucas as faculdades que utilizam este teste, realizado após a conclusão do Ensino Médio, como parte de seu processo seletivo. Hoje, o Enem é optativo e fica a cargo de cada instituição definir se o faz e o peso que dará à prova.

Uma das principais críticas aos vestibulares do país é que eles ditam as grades curriculares do Ensino Médio. Quase sempre, apenas o que é pedido nos grandes vestibulares é ensinado nas salas de aula. Para os defensores do Enem, a sua obrigatoriedade e universalização deixariam a cargo do poder público - e não mais das universidades e faculdades - a definição do programa curricular a ser adotado pelas escolas.

"Ao nacionalizar o vestibular, diminui-se o risco desse processo ser um grande negócio", diz o sociólogo Rudá Ricci, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC), de Minas Gerais. "Ao invés de saber o que o vestibular pergunta, deveríamos perguntar o que país quer que o jovem saiba." O Enem, segundo ele, ao contrário do vestibular, apresenta questões de natureza transdiciplinar, uma novidade "fantástica", já que o aluno, no Brasil, tem dificuldades para articular as disciplinas. O vestibular, na opinião de Ricci, é pouco inteligente. "Não é necessário que um jovem, para cursar uma faculdade, saiba o que lhe é perguntado no vestibular", diz.

Para o pesquisador Sirio Lopez Velasco, especialista em ética e educação ambiental e docente no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental da Fundação Universidade Federal de Rio Grande (FURG), o vestibular exclui muita gente a partir de perguntas "tão específicas que algumas delas muitos professores universitários da mesma instituição que o aplica não saberiam responder". Na opinião de Velasco, uma avaliação contínua durante o Ensino Médio seria uma boa solução. "Se ela for realmente boa, o Enem poderia ser extinto, ao menos como instrumento seletivo para o ingresso na Universidade." Segundo ele, no Uruguai - país onde nasceu e estudou até o ingresso na universidade -, desde o século XIX, é a avaliação contínua e única que determina a conclusão do Ensino Médio e o direito de ingresso na universidade pública.

Um dos defensores do fim do vestibular é Aloísio Teixeira, reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em recente entrevista ao jornal O Globo, ele comentou que o aluno deveria ser aceito na universidade a partir de seu desempenho na vida escolar. Segundo ele, é preciso combinar um programa de expansão do número de vagas no sistema público com a extinção do vestibular. "Teríamos formas diferenciadas de ingresso, através da vinculação orgânica entre a universidade pública e a rede pública de ensino pré-universitário. A universidade faria um sistema de acompanhamento e avaliação dos estudantes ao longo do curso. Poderia começar pelo ensino médio e progressivamente ir abarcando todo o ensino básico", disse ele. "Com isso, daqui a alguns anos, teríamos um sistema de acesso inteiramente diferente. Mais justo. Um sistema que valorizaria o conjunto das atividades do estudante ao longo da sua vida escolar, e não mais o vestibular, uma excrescência brasileira."

Livre acesso à universidade
Segundo Velasco, no seu artigo "Reforma universitária: o fim do vestibular", publicado no início do ano no Jornal da Ciência, acabar com esse processo permitiria o livre acesso à universidade pública de todo aquele que tenha concluído o Ensino Médio, medida de inegável conteúdo de inclusão social que supera definitivamente o atual debate em torno das cotas para negros e outros grupos e que acarreta inegável valorização do ensino médio.

Apesar de preferir a avaliação contínua, ele diz acreditar que os resultados do Enem poderiam sim ser empregados para o ingresso nas instituições superiores, desde que os governos invistam nas universidades públicas os recursos necessários para ampliar as instalações, o número de professores e funcionários, os laboratórios e equipamentos, para atender o significativo aumento dos ingressos. "A mudança precisa ser a nível nacional, para se evitar que a migração massiva de estudantes de classe média para o único ou os poucos Estados que isoladamente decidissem extinguir o vestibular sufocassem as universidades públicas desses Estados, decretando o fracasso da experiência", afirma ele.

Na opinião de Velasco, os vestibulares ainda existem e parecem custar a desaparecer pelo peso da rotina e do elitismo de boa parte dos docentes. "Ambos fatores tendem a colocar o vestibular como sendo uma espécie de criação divina, indispensável e eterna. Não esqueçamos, tampouco, dos interesses dos cursinhos pré-vestibular", ressalta.

Na contramão, os Estados Unidos, por exemplo, adotam dois exames básicos, preparados por instituições privadas, para seus estudantes fazerem durante o Ensino Médio. Eles podem escolher qual, quando e quantas vezes fazer o teste. Mas, como cita Ricci, na hora de selecionar seus alunos, a universidade também pode exigir cartas de recomendação da escola e um texto preparado pelo estudante sobre o curso que escolheu ou outro tema definido pela instituição. Outros fatores também contam ponto, como a participação do aluno em atividades esportivas e em trabalhos voluntários. "No entendimento das universidades, isso mostra a capacidade de socialização do estudante e o grau de comprometimento com sua comunidade e seu país."

Se o Enem é ou não a melhor saída para o fim do vestibular há ainda muito a se discutir, segundo os pesquisadores. "Precisamos fazer uma discussão nacional para avaliar o que é o vestibular e o que queremos. É preciso fazer um debate programado, com fóruns abertos, para discutirmos como queremos o processo de seleção para as universidades", ressalta Ricci, "o que não pode é continuar com esses pacotes institucionais elaborados dentro dos gabinetes", finaliza o sociólogo.

Atualizado em 03/08/04
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