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O significado de tudo: reflexões de um cidadão-cientista
Richard P. Feynman

O informante
Dir.: Michael Mann

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Resenha

O informante

Direção: Michael Mann
EUA - 1999

Por Simone Pallone

Uma disputa entre o homem forte do departamento de pesquisa e desenvolvimento de uma grande empresa da indústria do tabaco e todos os principais empresários do setor em torno de informações preciosas para a saúde pública, mas também extremamente valiosas para este setor industrial é a tônica de O informante.

Baseada em fatos reais, que levaram a indústria do tabaco a pagar mais de US$ 246 trilhões em indenizações nos Estados Unidos, a história gira em torno de um cientista que, após sua demissão da empresa por se recusar continuar compactuando com ela após a constatação, por meio de experimentação científica, de como o método de produção do cigarro perpetuava o vício da nicotina, passa a ser perseguido por seus antigos empregadores. Estes, são receosos de que ele viesse a revelar o segredo para a população, o que abalaria significativamente os negócios.

Apoiados em um termo de confidencialidade assumido por Jeffrey Wigand - representado por Russel Crowe, em excelente atuação - os advogados da empresa tentam pressionar o cientista por meio de ameaças de corte de benefícios prometidos na rescisão de contrato. Mesmo incomodado com a postura de desconfiança da empresa, o cientista se mostra totalmente decidido a prezar o trato assumido, a despeito de seu senso de responsabilidade com a verdade, da consciência da injustiça que estava sofrendo e das dificuldades pelas quais atravessaria a partir daquele momento.

Mas o encontro do personagem com o produtor de um programa televisivo de grande audiência nos Estados Unidos, e a intensa pressão da empresa sobre para que assine outros documentos que garantam o seu silêncio, levam o cientista a refletir sobre a sua responsabilidade com relação ao segredo que guardava. Mas também sobre todas as conseqüências que iriam recair sobre sua situação trabalhista, financeira e familiar caso quebrasse sua palavra.

O filme mostra como um mecanismo de defesa do setor industrial - o "segredo industrial" -, criado com o objetivo de garantir aos inventores de uma tecnologia ou processo a continuidade dos lucros advindos da inovação, garante no âmbito legal a proteção de um negócio, mesmo que este venha a ferir princípios básicos de proteção da saúde, bem estar e segurança da população.

Afora a garantia em relação aos concorrentes, os empresários se cercam de cuidados também em relação aos funcionários da empresa, exigindo em contrato - no termo de confidencialidade - que não sejam divulgadas, em nenhuma hipótese, informações-chave obtidas dentro da empresa que possam, de alguma maneira, interferir na continuidade do desenvolvimento de seus produtos ou processos e, conseqüentemente, da lucratividade que já conseguiram alcançar.

Em quase todos os países existem normas que oficializam o direito do requerente do registro administrativo de manter o conteúdo de sua tecnologia em segredo, até mesmo os testes de laboratório. No Brasil, a questão é tratada no art. 195 da Lei 9.279/96, que "considera crime o ato de quem divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato; ou divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude".

Apesar de a legislação ter sido criada com o objetivo de estabelecer uma proteção em termos concorrenciais para a empresa, acaba proporcionando também um sigilo de informações que seria importante que fossem reveladas para a população - consumidora de tecnologias e aplicações da ciência. Funcionários, que deveriam, por uma questão ética levar a público tais informações, se vêem impedidos de fazê-lo, em vista de seu compromisso firmado em contrato e da falta de proteção legal caso descumpram o acordo.

A partir do filme de Michael Mann, é possível imaginar quantos cientistas e funcionários de todos os escalões, não só de empresas, mas também aqueles envolvidos em pesquisas encomendadas por governos em áreas sensíveis como a nuclear, de energia e espacial, já passaram e ainda passam por situação semelhante à vivida pelo personagem Jeffrey Wigand. Ele detém um conhecimento que pode salvar vidas e se sente impedido de usá-lo em favor da população.

O debate proposto no filme fica mais emocionante por envolver outro tipo de discussão que é a da liberdade da imprensa, à medida que é o produtor do programa de televisão quem instiga o cientista a revelar o segredo, mesmo que isso lhe acarrete uma série de problemas, desde a falta de colocação no mercado de trabalho até mesmo a prisão ou a morte. Discute-se então, qual o direito da imprensa de fazer esse tipo de pressão sobre um cidadão e, ao mesmo tempo, se o compromisso que diz ter o produtor para com o seu público é mesmo este ou está muito mais ligado ao impacto que esse tipo de revelação causa para a emissora que aí, esta sim, também se vê beneficiada com o furo.

Revelando os bastidores de grandes corporações e também de uma grande rede de TV, sua ética e corrupção, o filme de Mann garante momentos de suspense e empolgação, além de ótimos diálogos entre Russel Crowe (o cientista), Al Pacino (o produtor) e Christopher Plummer (o repórter), acerca de ética, responsabilidade social e poder.

Atualizado em 10/11/2004

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