Moção da Unicamp à sociedade ataca anti-intelectualismo e ‘desmonte violento’ da educação superior e da ciência no Brasil

Por Inácio de Paula

[foto: Assembleia geral realizada na Unicamp nos anos 80 contra intervenção imposta pelo governador Paulo Maluf]

Assembleia geral no dia 15 de outubro pretende unificar e mobilizar comunidade acadêmica em defesa da universidade pública frente ao obscurantismo. Segundo Carlos Vogt, reitor da Unicamp entre 1990 e 1994, ataque à universidade “é ideológico no pior sentido da expressão”, porque baseado “nesse bobajol perigoso de marxismo cultural, que reproduz algo que está no livro Minha luta do Adolf Hitler, evocado para tentar caracterizar as ações das universidades como atividades articuladas em um manto universal de conspiração da Esquerda contra os pobres defensores da tradição, da família e da propriedade. É tudo balela, mas é perigoso porque a população compra, funciona. Nós estamos diante de um momento extremamente crítico. As soluções apontadas pelos governos, seja estadual seja federal, são de terra arrasada, para sitiar e exaurir as forças da universidade”.

 “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”, é o que estabelece a Constituição Federal de 1988, no artigo 207.

Em um contexto em que todas as instituições públicas de ensino superior têm sido afetadas por uma crise política e econômica na qual são forçadas a reafirmar seus valores e sua relevância, a Unicamp promove no dia 15 de outubro – das 12 às 14 horas, no Ciclo Básico I do campus de Campinas – uma Assembleia Universitária Extraordinária em defesa deste modelo, o constitucional, de universidade pública no Brasil.

Durante a assembleia será votada uma moção que, em um de seus trechos, afirma: “Os argumentos nos quais se baseiam os recentes ataques às universidades públicas, fortemente marcados pelo anti-intelectualismo e por um profundo desprezo pelo conhecimento científico, revelam uma visão equivocada da função da educação superior e da ciência”. O texto destaca ainda que “criar obstáculos para o funcionamento da universidade – seja por meio de cortes orçamentários diretos, diminuição dos recursos direcionados às agências de fomento ou pressões de natureza econômica, ideológica ou social – significa colocar em risco a estrutura do sistema nacional de ciência, tecnologia, inovação e formação de profissionais líderes, deixando o País a reboque do retrocesso e do obscurantismo”.

Em outra parte, o documento afirma que “as críticas a áreas específicas, como as humanidades, demonstram um profundo desconhecimento do papel fundamental que a busca por conhecimento exerce no desenvolvimento do pensamento crítico e criativo com habilidades cognitivas essenciais à formação de pessoal especializado, à inovação e ao empreendedorismo”.

Compromisso pela inteligência
“É importante a unidade dos diferentes setores ao redor da defesa da universidade, do movimento estudantil, dos docentes, dos funcionários e da própria reitoria que vem se postando de maneira bastante importante em defesa da autonomia universitária”, diz Lucas Marques, um dos coordenadores do Diretório Central dos Estudantes (DCE). “Estamos convidando os professores, inclusive os aposentados, para participarem”, diz Wagner Romão, presidente da Associação dos Docentes (ADunicamp). “Precisamos nos unir para mostrar a força que a Universidade pode ter”, diz o reitor Marcelo Knobel.

Também vão participar do encontro professores eméritos e representantes do Conselho Universitário (Consu) que integraram a histórica assembleia de 1981, quando a Unicamp se mobilizou contra tentativas de intervenção do governo estadual, à época ocupado por Paulo Maluf (PDS), na gestão da universidade.

O objetivo, 38 anos depois, infelizmente tem de ser similar. “É a oportunidade para que nos juntemos, as diferentes forças dentro da Universidade, em torno do propósito comum de defender o desenvolvimento universitário, defender o compromisso com a inteligência”, diz Carlos Vogt, reitor de 1990 a 1994, coordenador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo e presidente do conselho científico e cultural do Instituto de Estudos Avançados da Unicamp.

Segundo Vogt, que é professor emérito do Instituto de Estudos da Linguagem e presidiu a Fapesp, o ataque à universidade “é ideológico no pior sentido da expressão”, porque baseado “nesse bobajol perigoso de marxismo cultural, que reproduz algo que está no livro Minha luta do Adolf Hitler, evocado para tentar caracterizar as ações das universidades como atividades articuladas em um manto universal de conspiração da Esquerda contra os pobres defensores da tradição, da família e da propriedade”.

“É tudo balela, mas é perigoso porque a população compra, funciona”, afirma Vogt, que ingressou na Unicamp em outubro de 1969. “Nós estamos diante de um momento extremamente crítico. As soluções apontadas pelos governos, seja estadual seja federal, são de terra arrasada, para sitiar e exaurir as forças da universidade.”

Inácio de Paula é formado em jornalismo pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. Atualmente, cursa especialização em jornalismo científico no Labjor – Unicamp.