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Mesmo sob risco de multas, propagandas de medicamentos ferem normas da Anvisa


A legislação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que tenta regular os abusos cometidos pelas indústrias farmacêuticas, agências de publicidade e meios de comunicação, ainda não tem conseguido evitar que propagandas publicitárias sobre medicamentos inseridas nas principais redes de TV, rádio e jornais cometam várias falhas. Essa é a constatação de Álvaro Nascimento, pesquisador do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Para ele, o atual modelo regulatório da Anvisa para publicidade de medicamentos no Brasil é ineficaz e tem fortalecido a cultura de automedicação. "No meu ponto de vista, ao estampar a frase 'Ao persistirem os sintomas o médico deverá ser consultado' ao final de cada propaganda, a pretendida regulamentação implementada pela Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) 102 da Anvisa, formulada em 2000, estimula o consumo incorreto e abusivo de medicamentos, quando caberia ao Estado cumprir justamente a tarefa oposta", explica.

Para chegar a essa conclusão, o pesquisador analisou 100 peças publicitárias veiculadas em 2003. Todas elas feriam a legislação em pelo menos um artigo. Nascimento, que também é jornalista e tecnologista da Fiocruz, explica que a forma e o conteúdo dos anúncios de medicamentos, além de prometerem resultados impossíveis, acabam estimulando o uso irracional de um produto que, além de caro, é perigoso para a saúde, dependendo de quem o tome e em que circunstâncias. O pesquisador informa que o problema é ainda mais grave quando consideramos o fato dos medicamentos terem sido o principal agente de intoxicação humana no Brasil - superando os agrotóxicos e os animais peçonhentos - entre os anos de 1995 a 2001, segundo os últimos dados fornecidos pelo Sistema Nacional de Informações Toxicológicas da Fiocruz.
Entre os artigos mais desrespeitados, estão o não cumprimento à obrigação de informar a principal contra-indicação do medicamento na propaganda e a sugestão de diagnóstico. O estudo mostra que as contra-indicações, quando aparecem, são exibidas em letras minúsculas e surgem muito rapidamente, frisando apenas que aquele medicamento é contra-indicado para as pessoas com hipersensibilidade aos componentes da fórmula. "Isso poderia ser revertido com o simples cumprimento da legislação, que obriga a citação de contra-indicação, que não foi feita em 94 das 100 publicidades que analisei", argumenta.

Depois dessas constatações, Nascimento acha importante que a proibição da propaganda de medicamentos seja debatida. O debate sobre esta questão encontra respaldo na Constituição Brasileira, que afirma no Artigo 220 que "compete à Lei Federal estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão (...) bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente".

Perspectivas
O estudo foi enviado à Anvisa, por um pedido dos próprios responsáveis pelo setor de monitoração de propagandas. O pesquisador da UERJ informa que as irregularidades já eram de conhecimento do órgão, que em 2003 havia 14 equipes sediadas em várias universidades para realizar esse tipo de controle. "Mesmo que a Anvisa multiplicasse várias vezes a sua atuação, a regulação da propaganda permaneceria apresentando sérias fragilidades". Isso porque, segundo aponta Nascimento, as publicidades só são reprimidas após sua veiculação, mesmo assim, as multas continuam são irrisórias e seus custos são repassados ao preço dos medicamentos. Assim, a advertência colocada a cada final de propaganda permaneceria estimulando o uso incorreto de medicamentos, sem a devida prescrição.

Para saber que modelo regulatório conseguirá superar as fragilidades do atual, o pesquisador compara algumas legislações internacionais que tratam do tema, analisando como os Critérios Éticos para a Propaganda de Medicamentos, preconizados pela Organização Mundial de Saúde, são respeitados em outros países. "Quero discutir também a possibilidade de se propor, ao Congresso Nacional, a proibição da propaganda de medicamentos hoje feita pela indústria, substituindo-a, por exemplo, por um sistema público de informações, voltado para os prescritores, onde se assegure a isenção destes dados frente aos interesses comerciais envolvidos", sugere.

Frankin Rubinstein, diretor da Anvisa, reconhece as infrações dos anúncios apontadas por Nascimento e afirma que, a partir deste ano, 20 faculdades de Farmácia do país - e provavelmente algumas de Medicina - ajudarão a monitorar as publicidades de medicamentos. O projeto quer que esses estudantes tenham uma posição mais crítica em relação às publicidades. ''A partir de fevereiro, criamos uma gerência exclusiva para cuidar desse assunto. Com isso, já aumentamos o número de autuações e de multas. A mudança qualitativa nesse cenário de propagandas ainda é insuficiente, mas sabemos que é um processo que será feito a longo prazo'', diz.

''Queremos também aumentar a consciência crítica de quem prescreve e de quem usa os medicamentos, para que essas pessoas saibam se defender contra propagandas enganosas'', enfatiza Rubinstein. Outra alternativa prevista pela Anvisa é uma parceria com o Procon, que poderá autuar e pressionar as indústrias e agências de publicidade em defesa do consumidor.

Regulação 102 da Anvisa

Publicada no ano de 2000, esta resolução se originou da CPI dos medicamentos, realizada no mesmo ano. Ela foi o resultado de um pacto entre a indústria farmacêutica, sociedades de vigilância de medicamentos, médicos e publicitários e instituiu grupos de monitoramento de propagandas em 14 universidades de todo o país. Estes grupos devem enviar relatórios para a Anvisa, que é a responsável pela punição dos laboratórios.

 

Atualizado em 04/05/04
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