Decreto 
              sobre rotulagem de transgêncios 
				 é alvo de críticas 
              
            Mesmo 
              não havendo uma posição definitiva sobre a 
              permissão ou não do cultivo de espécies transgênicas 
              no Brasil - a soja das safras de 2003 e 2004 é a única 
              com cultivo liberado - a rotulagem de produtos que contém 
              transgênicos já está prevista por decreto federal 
              em vigor há mais de um mês. Contudo, na prática, 
              a rotulagem ainda não conseguiu se firmar e tem sido alvo 
              de críticas. 
            
               
                |  | 
               
                | Símbolo 
                    escolhido para rotulagem | 
            
            	   Segundo 
              o decreto, 
              todos os produtos que possuem acima de 1% de ingredientes transgênicos 
              em sua composição devem ser rotulados com um T preto 
              dentro de um triângulo amarelo. O documento determina ainda 
              que o símbolo deve estar localizado na parte da embalagem 
              que fica diretamente voltada para o consumidor com um tamanho de 
              no mínimo 0,4% dessa superfície.
	   
			   Uma 
              das críticas está relacionada ao próprio símbolo 
              escolhido para informar a presença de transgênicos 
              nos produtos. "Esse símbolo é totalmente inadequado 
              e foi feito com a intenção de amedrontar as pessoas 
              pelo fato de poderem associar isso a uma coisa perigosa, como símbolos 
              de alta tensão e radioatividade. Tanto é assim, que 
              se tem usado a palavra 'alertar' para falar sobre rotulagem, quando 
              na verdade ela deve ser feita para 'informar' com clareza e objetividade 
              o consumidor", opina Alda Lerayer, engenheira agrônoma 
              e especialista em genética do Instituto de Tecnologia de 
              Alimentos (Ital). O uso do símbolo, de acordo com a pesquisadora, 
              também vai contra a portaria da Agência de Vigilância 
              Sanitária (Anvisa) que orienta para que não se use 
              símbolos ou desenhos gráficos, alegando que esse tipo 
              de linguagem pode causar confusão e desinformação.
			   Por 
              outro lado, e por outros comentaristas, o decreto vem sendo interpretado 
              como primeiro passo para a liberação do cultivo e 
              comercialização generalizada de produtos trânsgenicos. 
              "A rotulagem é imprescindível para liberar a 
              comercialização", comenta Luiz Eduardo de Carvalho, 
              professor do Laboratório de Consumo e Saúde (LabConsS) 
              da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Carvalho, extremamente 
              crítico sobre o decreto, alerta para sua ambiguidade, que 
              envolve a diminuição da tolerância de transgênicos 
              em alimentos que não precisariam ser rotulados. Essa porcentagem 
              caiu de 4% no governo FHC, para 1% no governo Lula. "O que 
              não é dito, é que o decreto anterior falava 
              de 4% em cada ingrediente e não no alimento todo. Ou seja, 
              uma salsicha com 0,99% de farinha de soja 100% transgênica 
              não precisa, hoje, ser rotulada como transgênica. No 
              decreto do FHC essa salsicha teria que ser rotulada como transgênica, 
              mesmo se o teor de DNA presente fosse 96% menor", explica.
            Outro 
              aspecto controverso, levantado por Lerayer, é a falta de 
              preparo das empresas para oferecer informações sobre 
              produtos com OGMs e a inexistência de uma rede nacional de 
              laboratórios que possam realizar os testes de quantificação 
              de transgênicos nos produtos. Segundo ela, isso comprometeria 
              a capacidade do país para implementar de forma imediata as 
              especificações do decreto. "Hoje, no Brasil, 
              não existem laboratórios oficiais preparados para 
              fazer esse tipo de análise. Os laboratórios equipados 
              para isso são privados e qualquer análise solicitada, 
              seja por parte das empresas ou por parte das entidades fiscalizadoras, 
              terá que ser feita nesses laboratórios multinacionais, 
              com altos custos", critica a engenheira agrônoma.
            Também 
              na opinião de Carvalho, o Brasil teria dificuldades de estabelecer 
              a rotulagem do ponto de vista técnico, analítico e 
              laboratorial. "As análises são caríssimas 
              e complexas. Não existe nem dinheiro, nem recursos humanos, 
              nem equipamentos, para que seja analisada uma amostragem estatisticamente 
              representativa dos produtos. Portanto, mesmo que o decreto obrigasse 
              a rotular, não haveria vontade de fiscalizar. E mesmo que 
              vontade houvesse, não haveria capacitação técnica 
              e financeira. Vamos é comer soja transgênica sem rótulo. 
              Aliás, vamos continuar comendo".
             
              Rotulagem no Mercado Comum Europeu
              A necessidade da rotulagem dos produtos que contenham transgênicos 
              é reconhecida por praticamente todos os setores da sociedade 
              e não apenas por entidades "anti-transgênicos" 
              como o Greenpeace - responsável pela publicação 
              anual de uma lista 
              das maiores empresas de alimentos divididas em "livres" 
              e "não livres" de transgênicos.
            No 
              mundo todo, a rotulagem de alimentos produzidos com OGMs vem sendo 
              amplamente discutida. No último dia 18, a União Européia, 
              conhecida como um "mercado conservador" em relação 
              à comercialização de produtos transgênicos, 
              acrescentou alguns pontos importantes às normas de rotulagem 
              para esses produtos. Agora, todos produtos que contenham ou derivem 
              de ingredientes que contenham mais de 0,9% de OGMs devem conter 
              no rótulo essa informação. Isso deve ser feito 
              mesmo nos casos em que o material genético específico 
              do transgênico não esteja presente no produto final, 
              como é o caso do óleo de soja. Os alimentos para consumo 
              animal que contêm ingredientes geneticamente modificados também 
              passaram a ser rotulados. Essas alterações podem afetar 
              outras regulamentações em todo o mundo, devido à 
              força do mercado europeu.
            Para 
              a pesquisadora do Ital, no entanto, a rotulagem é positiva 
              não apenas para os consumidores, mas também para as 
              empresas, e deve trazer uma abertura de mercado."Não 
              é verdade, por exemplo, que a União Européia 
              não importe soja transgênica. Toda a soja transgênica 
              produzida no Brasil foi vendida, inclusive para mercado europeu 
              e para a China", afirma.
            Em 
              um futuro próximo, segundo a pesquisadora, os não-transgênicos 
              devem se tornar um "nicho de mercado" dos que podem pagar. 
              "Vai sair mais caro para a empresa certificar que seu produto 
              está livre de transgênicos, e rotulá-lo como 
              tal, do que para as demais. Os que quiserem garantir para o consumidor, 
              por algum motivo, que seu produto está livre de transgênico, 
              terá que providenciar uma certificação e meios 
              de garantir que isso aconteça em todos os níveis da 
              cadeia produtiva", conclui.