|  |  |  | Ana 
        Cristina Fachinelli Christian Marcon
 Nicolas Moinet[1]
 Mais do que 
        nunca as redes fascinam, perturbam e inquietam nossas sociedades ocidentais 
        mergulhadas numa complexidade turbulenta. Sob os holofotes, as redes tecnológicas 
        transformam profundamente nossa sociedade da informação e alteram ações 
        estratégicas. À esta expansão responde uma dinâmica potente de construção 
        de redes de atores: indivíduos, empresas e organizações tecem laços flexíveis 
        que os tornam coletivamente mais inteligentes, ou seja mais ágeis no processo 
        de adaptação antecipada ou na resposta às diferentes contingências contextuais. 
        Redes e estratégias entrelaçam-se numa noção mais ampla voltada ao desenvolvimento 
        da capacidade de agir e decidir num universo no qual novas tecnologia 
        de comunicação e informação misturam-se à culturas de redes. Para compreender 
        esse universo, novas referências estratégicas se fazem necessárias assim 
        como o domínio de alguns aspectos importantes no que concerne a aplicação 
        de estratégia-rede. 
 Antes de criar, de dinamizar ou simplesmente de fazer parte de uma rede, 
        é fundamental bem compreender a noção de redes. A etimologia da 
        palavra indica para o latim retis que designava um tipo de malha 
        para prender pássaros, pequenas caças ou peixes. A noção de rede remete 
        primitivamente à de captura, de caça. Por transposição, a rede é assim 
        um instrumento de captura de informações. Esta referência à malha é mais 
        evidente em inglês pois rede é "network", literalmente uma "rede que trabalha". 
        Imediatamente a noção de rede aparece mais dinâmica nesta língua que fala 
        mesmo de "networking". Assim podemos encontrar na capital japonesa um 
        pequeno livro intitulado " Networking in Tokyo", verdadeiro guia para 
        "fazer redes"e mais precisamente para conhecer as redes de empresas e 
        no qual todo cidadão britânico ou americano poderá encontrar compatriotas 
        e negócios!
 
 Evidenciar as relações entre atores não é suficiente para enunciar a existência 
        de uma verdadeira rede. Uma agenda de endereços, não mais que um anuário 
        de diplomados, não constitue rede, mas sim uma matéria-prima relacional. 
        Para que a rede ganhe corpo, é necessário que um projeto concreto, coletivo, 
        voluntário, proporcione uma dinâmica específica às relações pré-existentes. 
        Além disso, para adquirir uma dimensão estratégica, uma rede deve interagir 
        com o campo de ação no qual ela se inscreve. Em resumo a estratégia-rede 
        supõe compartilhar um projeto que se inscreve num campo de ação. 
        A proximidade territorial tanto quanto a interdependência econômica constituem 
        duas logicas coerentes de definição do campo de ação de uma rede. A associação 
        formada pelas redes de pequenos supermercados dos suburbios do Rio de 
        Janeiro e Baixada Fluminense inscreve-se nestas duas lógicas, pois facilitada 
        pela proximidade territorial a sua formação em rede permite-lhes dispor 
        de maior poder de negociação junto a fornecedores o que caracteriza a 
        sua interdependência econômica.[2]
 
 Porém, a rede "simbiótica", na qual todos os atores colaboram com uma 
        obra comum em pé de igualdade e com zelo permanente, não existe, é ilusória. 
        A partir desta tomada de consciência deve-se buscar a força da rede 
        nos laços entre os atores. Num projeto de de rede, frequentemente 
        cruzam-se e afrontam-se os projetos de cada membro para a rede, os projetos 
        de cada membro para si mesmo, o projeto da rede para cada membro e enfim 
        o projeto do grupo para si mesmo. As influências dos atores se encadeiam, 
        cada um jogando sobre a especificidade de sua contribuição, sobre a atividade 
        que incrementa e sobre sua capacidade de conectar a rede à outras redes. 
        O resultado disso são múltiplas configurações, algumas das quais bem características.
 
 Se o projeto fornece à rede sua dinâmica e as ligações sua coerência, 
        a rede não será um ectoplasma, uma sombra sem substância pairando sobre 
        um conjunto de atores. Sem dispor de meios de intervenção, uma rede torna-se 
        estéril, o projeto seca e os laços se desfazem. A rede deve dotar-se 
        de uma realidade operacional. Esta repousa sobre a capacidade dos 
        animadores de conferir-lhe: meios práticos de ação como material, 
        local, orçamento, sistema eletrônico de comunicação; uma cultura de 
        funcionamento considerando-se algumas regras de funcionamento, ética, 
        repartição de papéis; recursos à trocar como informações, influência, 
        conhecimentos, disponibilidades, agendas de endereços.
 
 Ao escolher regras de organização que rompem com o modelo tayloriano da 
        autoridade hierarquica imposta, a rede renuncia às referências habituais 
        que condicionam os comportamentos. Por exemplo, todo subalterno beneficia 
        geralmente do relativo conforto conferido pela aplicação de medidas decididas 
        em nível superior: a responsabilidade é de outrem, de uma autoridade que 
        solicita-lhe ao menos de estar motivado. Se o discurso e a realidade da 
        empresa tendem à distanciar-se desta caricatura de organização hierarquica, 
        o mergulho na rede impõe uma ruptura comportamental brutal. É preciso 
        implicar os homens mais do que aplicar medidas. As lógicas do management 
        em rede não nos são habituais. A autoridade não se decreta, é adquirida 
        por adesão. A participação ao projeto não se impõe, é obtida por implicação. 
        A responsabilidade não se segmenta, cada um é co-responsável. Os laços 
        não se auto-mantém em razão de uma participação imposta, eles se alimentam 
        da convivência e da confiança que a sociabilidade própria à rede gera.
 
 Diz-se freqüentemente que para receber é preciso dar, é a lógica do "dar-dar" 
        da troca direta e condicionada, dá-se em função do que se recebe e vice-versa. 
        Mas este tipo de postura é ainda mais prudente e implica outros pensamentos 
        por detrás numa situação de estratégia-rede. Por isso é mais apropriado 
        falar de "pegar-pegar" pois esta postura é mais transparente. Nesta lógica, 
        é preciso anunciar aos outros membros nossas expectativas, o que buscamos 
        na rede e que ao encontrarmos pegamos assim como o que trazemos e que 
        outros podem pegar. Numa verdadeira estratégia-rede, devemos transpor 
        a lógica do "dar-dar" para o "pegar-pegar". Enquanto que a primeira 
        supõe uma idéia de cálculo (quanto dar e quanto receber…) a segunda trabalha 
        mais orientada para a duração, continuidade, e convivência: trata-se de 
        dizer quem somos, de por as cartas na mesa.
 
 Dentro deste mesmo espírito de continuidade e duração, deve-se gerar 
        uma dinâmica de aprendizagem. Ao contrário da lógica dos fundos de 
        pensão que exigem uma forte rentabilidade à curto prazo, a lógica de aprendizagem 
        em rede aposta no investimento à longo prazo. Por isso as ligações da 
        rede investem e tiram proveito de uma dinâmica de aprendizagem ao longo 
        do tempo que repousa sobre uma lógica de memória. No interior de uma rede, 
        duas dinâmicas de aprendizagem se fazem presentes. A primeira diz respeito 
        à aprendizagem das competências, que são frequentemente e num primeiro 
        momento tecnoloógicas. São as definições concernentes às normas comuns, 
        trocas de informações técnicas e realizações de projetos de estudos. A 
        aprendizagem relativa à utilização de uma Intranet entre os membros de 
        uma rede, por exemplo, faz parte desta dinâmica. A segunda diz respeito 
        à aprendizagem relacional. É a questão da sociabilidade própria à rede 
        de atores. Esta aprendizagem permite à cada membro imaginar novas soluções 
        à novos problemas, deixando a cada um uma margem de iniciativa e de interpretação 
        pessoal.
 
 Como todo ser vivo, a rede deve priorizar os fluxos sobre os estoques. 
        A eficiência da rede dependerá antes de mais nada: da capacidade de cada 
        membro de transmitir-lhe em tempo útil uma informação que nao dispunham 
        anteriormente; de enriquecer informações que ja detinham; de fazer crescer 
        seus conhecimentos e então sua capacidade de análise. Enfin, a eficiência 
        de uma rede esta ligada à sua capacidade de gerar fluxos no tempo e no 
        espaço. É por isso que a comunicação é primordial e deve ser realizada 
        em dois sentidos, a comunicação-transmissão e a comunicação-comunhão… 
        Porém, é preciso prestar atenção ao zero-estoque. Por natureza a informação 
        é ao mesmo tempo: uma mensagem transmitida, ou seja, um objeto; um conjunto 
        de conhecimentos adquiridos, então, um estoque; a ação de informar, ou 
        seja um fluxo, uma energia que tem conseqüências. Em outras palavras, 
        uma rede implica uma certa formalização e então, estoques.
 
 Em termos de atuação, jogar nas intersecções confere à rede as 
        suas características estratégicas uma vez que utiliza para tanto os princípios 
        de base das ações estratégicas como a liberdade de ação, a economia de 
        forças e a concentração de esforços. Ora, uma rede inteligente é aquela 
        que está em condições de combinar estes três princípios. Assim, a sua 
        capacidade de englobar um território responde ao princípio de liberdade 
        de ação e a web é um exemplo forte disso. A capacidade de ligar atores 
        heterogêneos e complementares responde ao princípio de economia de forças. 
        Finalmente, a capacidade de determinar no tempo e no espaço os pontos 
        de convergência, os nós da rede, responde ao princípio de concentração 
        de esforços.[3]
 
 Finalmente, nem um navio, nem uma empresa, nem uma rede podem dispensar 
        um piloto. Porém, uma vez que sua autoridade não reside nos mesmos fundamentos 
        que uma empresa, o "manager" da rede deve dispor de qualidades particulares. 
        Na descrição do seu retrato ideal, ele deve integrar os princípios da 
        complexidade. A incertitude e o movimente causam-lhe mais estímulo do 
        que preocupações. Por gosto ele privilegia a iniciativa pessoal, a inovação 
        e a participação coletiva preferencialmente à ordem, estabilidade e hierarquia. 
        Extrovertido, ele tem um moral sólido, energia e carisma para estimular 
        a adesão. Além disso, é preciso guardar o machismo no armário. 
        A força viril tradicional do chefe hierárquico cede o lugar às qualidades 
        de abertura, de mobilização, de comunicação, de confiança e de escuta. 
        Em resumo, o "management" de uma rede revela-se mais feminino.
 
 No contexto da Sociedade da Informação, no qual as Novas Tecnologias de 
        Informação e Comunicação (NTIC), desempenham um papel fundamental, a noção 
        de redes lança mais luzes sobre este papel. As NTIC são boas como servidores 
        mas nem tanto como patrões. Elas não são indispensáveis ao funcionamento 
        da rede. Entretanto, cada vez mais, a rigidez dos processos antigos de 
        comunicação, muito lentos, muito formais, pouco ágeis para ser suficientemente 
        interativos são vistos como entraves à circulação rápida da informação 
        e à reatividade da rede. É bem verdade que o progresso realizado na área 
        das tecnologias de informação e da comunicação permitem operar conexões 
        simples, fexíveis, conviviais, rápidas potentes e suficientemente confiáveis 
        entre membros espacialmente dispersos de uma empresa, por exemplo. As 
        mudanças de comportamento que produzirá esta evolução profunda da organização 
        do trabalho favorecerão rapidamente a adoção de uma cultura de redes de 
        comunicação. Um número cada vez maior de pessoas explora as redes tecnológicas 
        na gestão de sua comunicação com suas redes relacionais. É justamente 
        neste ponto que um aspecto evidente porém nem sempre assumido, desempenha 
        um papel definitivo na estratégia-rede: a participação dos homens. Uma 
        rede é formada por homens. Por isso a importância de se aprofundar as 
        reflexões a respeito do seu impacto no universo pessoal e social dos individuos. 
        Novos laços e novas organizações se desenham, numa sociedade na qual os 
        movimentos e as novidades nao podem gerar preocupação e sim estimulos 
        para avançar sempre na direção de novas conexões e de novas dinâmicas 
        de fluxos.
 Notas [1] Respectivamente, 
        Doutoranda e Professores Pesquisadores do LABCIS (Laboratório de Pesquisas 
        em Comunicação e Informação Científica e Tecnologica) da Universidade 
        de Poitiers-França.
 [2] Ver revista EXAME edição 733 de 07 de fevereiro de 2001, p.26.
 
 [3] Ver FAYARD Pierre, O Jogo da Interação, EDUCS, 2000.
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