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Resenhas

Um antropólogo em Marte
Oliver Sacks

Epilepsia
Carlos A. M. Guerreiro e outros (org.)

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Um Antropólogo em Marte / Sete Histórias Paradoxais
Oliver Sacks, Editora Companhia das Letras

por Juliana Schober

O livro Um Antropólogo em Marte foi lançado no Brasil em 1995. O autor, Oliver Sacks, é um neurologista com grande habilidade para narrar distúrbios neurológicos complexos, de forma que o leitor acaba sendo completamente absorvido pelas incríveis histórias de vida de seus pacientes. Sacks já publicou outros livros como O homem que confundiu uma mulher com um chapéu (1986) e Despertando (1974), que virou filme em 1990 com a atuação de Robert De Niro e Robin Williams.

Os pacientes de Sacks surpreendem o leitor e o próprio neurologista, pela capacidade adaptativa e criativa para conviver com doenças neurológicas devastadoras.

Em "O caso do pintor daltônico", um pintor de 65 anos sofre um acidente de carro e, repentinamente, torna-se totalmente daltônico. No dia seguinte ao acidente, ao ir trabalhar em seu ateliê, antes repleto de pinturas coloridas e luminosas, depara-se com um mundo feito de cinza, branco e preto. As coisas passam a ter uma aparência desagradável, "suja". As pessoas viraram "estátuas cinzentas animadas" e o pintor passa a não suportar sua própria aparência no espelho. Até os alimentos que ele ingeria "pareciam-lhe repulsivos devido a seu aspecto cinzento, morto, e ele tinha que fechar os olhos para comer". Para o pintor, o mundo passou a ser algo parecido com um filme em preto-e-branco, tridimensional, com a diferença que os filmes são representações do mundo, enquanto a vida dele era real.

Enfim, o pintor perdeu não somente a percepção das cores, mas acabou perdendo sua memória das cores. Enquanto Sacks conta a destruição do mundo colorido do pintor, ele conta o surgimento de uma nova realidade, de um mundo sem cores, de uma pessoa que parecia nunca as ter conhecido. O pintor voltou a pintar inspirado pela visão de um nascer do sol (em preto e branco). "O sol nasceu como uma bomba, como uma enorme explosão nuclear", ele contou à Sacks. Suas pinturas continuaram existindo, mas todas passaram a ser em preto-e-branco. "Senti que se não pudesse continuar pintando, também não ia querer continuar vivendo", ele desabafou com seu médico, que escreveu seus desabafos, sentimentos e impressões desencadeados por fenômenos neurológicos complexos explicados por Sacks.

O último conto do livro, chama-se "Um antropólogo em Marte", e é sobre uma autista, Ph.D. em ciência animal, professora da Colorado State University. Apesar das adversidades, ela tornou-se uma importante autoridade mundial em sua área de atuação profissional. Curiosamente, a linguagem técnica era muito mais acessível a essa pesquisadora do que a linguagem social, o que permitiu que ela se adaptasse à vida fazendo ciência. A ciência a medicou, ao mesmo tempo em que tornou-se seu refúgio. Durante toda sua vida, ela dizia-se se sentir como um "antropólogo em Marte". Provavelmente, essa deve ser uma sensação compartilhada por muitas outras pessoas com distúrbios neurológicos.


O livro de Sacks vale a pena. Nesse livro, o estilo dos contos de Sacks pode ser explicado por uma frase do médico escritor: "Mas, para voltar ao ponto de partida, todos os estudos clínicos, por maior que seja o empreendimento, por mais profunda que seja a investigação, devem retornar aos casos concretos, aos indivíduos que os inspiraram e sobre quem eles discorrem".

Leia trecho do conto "Um Antropólogo em Marte"

"Que a disposição para o autismo seja biológica é algo que não está mais em questão, nem as provas cada vez maiores de que ele seja, em alguns casos, genético. Geneticamente, o autismo é heterogêneo - por vezes dominante, por outras recessivo. Ele é mais comum nos homens. A forma genética pode ser associada, no indivíduo ou na família afetada, a outros distúrbios genéticos como dislexia, distúrbios de déficit de atenção, distúrbio obsessivo-compulsivo ou síndrome de Tourette. Mas o autismo também pode ser adquirido, o que foi percebido pela primeira vez nos anos 60, com a epidemia da rubéola, quando um grande número de bebês acabaram desenvolvendo-o . Ainda não se sabe se as chamadas formas regressivas do autismo - por vezes com perdas abruptas da linguagem e comportamento social em crianças entre os dois e quatro anos que anteriormente vinham se desenvolvendo de uma forma relativamente normal- são causadas geneticamente ou pelo meio. (...)

E, no entanto, os pais de uma criança autista que vêem seu filho retrocedendo em relação a eles, ficando distante, inacessível, sem reações, podem continuar inclinado a assumir a culpa. Podem ver-se lutando para se relacionar e amar uma criança que, aparentemente, não lhes corresponde. Podem fazer esforços sobre-humanos para alcançar, agarrar uma criança que vive num mundo inimaginável e alheio; e ainda assim todos os seus esforços podem parecer vãos"


Atualizado em 10/07/02
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