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                             O  despertar chinês não ocorre somente no âmbito econômico e da política  internacional; verifica-se também uma expansão cultural da potência asiática.  Tal processo de expansão provém tanto de políticas planejadas, que objetivam a  divulgação da imagem do país, quanto de processos de contato espontâneos ou não  planejados. Esses processos espontâneos, muitas vezes, são os mais intensos,  impactantes e que exigem ajustes internos e respostas dos países para as  demandas nacionais que surgem. O aumento na mobilidade de informação e de  pessoas possibilita um cenário de constante interação entre culturas, o que  provoca impactos variados para os Estados. O contato com as particularidades  culturais estrangeiras certamente resulta em consequências sociais. 
A  expansão da medicina tradicional chinesa (MTC) se insere nesse processo, ao  trazer consigo valores próprios, provocando mudanças socioinstitucionais nas  regiões em que se insere. Trata-se de um sistema sanitário oriental e  completamente diverso da medicina ocidental, que se difunde em vários sistemas  de saúde nacionais de tal forma que passa a exigir uma resposta dos países para  esse fenômeno. Particularmente a acupuntura, uma técnica peculiar da medicina  chinesa, já é amplamente utilizada em pelo menos 78 países1. 
A medicina  chinesa baseia-se nos princípios filosóficos da cultura oriental, o que a diferencia  consideravelmente da medicina alopática do Ocidente. Para a MTC, o fundamental  não é saber do que o corpo humano é constituído, nem de que forma seus órgãos  se dispõem, mas sim observar o modo como o corpo é estimulado, tanto por  fatores endógenos quanto exógenos. Por isso, até final do século XIX, essa técnica  médica não se interessa pela anatomia e dissecação, criando uma fisiologia  imaginária. Por exemplo, a comunicação do corpo não ocorreria por meio de  artérias, veias, nervos, vasos linfáticos ou tendões, mas sim por canais de  energia, denominados meridianos. A saúde do indivíduo é o resultado de um  equilíbrio entre duas forças opostas – o yin e o yang – cuja  complementação é fundamental. Essas forças circulam no organismo sob a forma de  energia, que percorre o corpo dentro dos canais. A distribuição dessa energia  vital pode sofrer perturbações e os órgãos enfrentam desequilíbrios por excesso  ou insuficiência de energia. Dessa forma, o corpo funcionaria sob o efeito da  circulação dessa energia posta em movimento, e não da circulação de sangue2. 
Verifica-se,  portanto, que consiste em uma técnica com concepções diferentes acerca do  corpo, da saúde e da doença, mas que está se expandindo em diversos países do  Ocidente, provocando reações sociais e exigindo medidas para integrá-la aos  seus sistemas de saúde nacionais. A penetração dessa técnica esbarra em  problemas relativos à legislação e à regulação de produtos, formação e licença  para profissionais, informação e conscientização acerca dos serviços prestados,  controle da eficiência e qualidade do serviço. 
O  que resulta desse processo tem uma lógica complexa. Surgem novos problemas diante  dessa comunicação intercultural. O indivíduo, os hábitos, a cultura, a  particularidade médica, que eram estranhos, podem tornar-se próximos e as  características distintas entre as culturas diminuírem. Como consequência,  pode-se observar a tolerância e o universalismo, em que todos se sentem  incluídos, mas também podem ocorrer resistências, que em casos diversos são  retratados nos movimentos de antiglobalização ou de choque entre percepções  culturais. 
Para  compreender a capacidade de tolerância ou de aceitação de uma sociedade diante  de uma particularidade cultural distinta é preciso considerar a capacidade  dessa sociedade de integrar algo novo. Existem culturas mais abertas e outras  mais resistentes. Dependendo da história social de um povo, a aceitação ou  aquisição cultural pode ocorrer com maior ou menor facilidade. Para analisar  esse grau de aceitação, seria importante verificar como está ocorrendo a gestão  da heterogeneidade nessas sociedades, o que significa conhecer as políticas  dominantes dentro dos Estados e as atitudes dos indivíduos. A realidade social  e histórica de um povo é que permite compreender a penetração da medicina  chinesa. Os grupos sociais experimentam concepções diversificadas acerca da  etiologia das doenças e, para interpretar os fenômenos corporais, as pessoas apoiam-se  em noções, símbolos e esquemas de referência interiorizados de acordo com sua  vivência social e cultural. 
As  representações sociais acerca da saúde e da doença aparecem, assim, articuladas  à visão que cada indivíduo possui do biológico e do social e podem explicar as  reações sociais em relação aos novos conceitos de tratamento trazidos pela  medicina tradicional chinesa. Essas representações sociais são dinâmicas,  construídas ao longo do tempo, provêm das interações entre o social e o mental,  das evoluções históricas, do que é apresentado para as sociedades e da forma  como interagem com as novas situações que lhes aparecem. Portanto, a dinâmica  global vem acelerando os contatos culturais, provocando mudanças  socioinstitucionais internas e, em certos casos, alterações nas representações  sociais, mas não se trata de um processo homogêneo para todas as nações, sendo  necessário identificar as condições que explicam os impactos diferenciados para  cada região. 
A expansão da  medicina tradicional chinesa 
A  medicina tradicional chinesa foi divulgada, inicialmente, nas regiões vizinhas  à China, a partir da expansão territorial do império. Foi por meio das relações  comerciais que os países do Ocidente tiveram seus primeiros contatos com o  mundo asiático. A abertura para oeste, por meio da Rota da Seda, fez com que  mercadorias chinesas chegassem à Ásia Menor e depois à Europa. As viagens do  italiano Marco Polo, no final do século XIII, tornaram possíveis os primeiros  contatos, ainda tímidos, com o desconhecido mundo chinês. Em 1255, o Ocidente  já tinha relatos sobre uma exótica medicina praticada pelos chineses, com a  obra de William de Rubruk intitulada Viagem à terra dos mongóis. Entretanto,  nessa época, o que interessava aos europeus era, sobretudo, a seda chinesa. 
Os  contatos em maior escala entre o Ocidente e a China, que despertaram o  interesse ocidental para um outro aspecto da cultura chinesa, em especial para  sua arte médica tradicional, ocorreu concretamente a partir do século XVI, na  época da expansão marítima europeia. Mas só os primeiros missionários enviados  por Luís XIV, que reinou na França entre 1643 e 1715, é que começaram a  compreender e a estudar as instituições da civilização chinesa, inclusive suas  técnicas médicas. Na Europa, o primeiro tratado de acupuntura, Les secrets  de la médecine des chinois, surgiu em 1671, publicado pelo padre Harvieu.  Algum tempo depois, outro religioso, o padre Cleyer, também editava um trabalho  sobre a medicina chinesa em latim. Depois deles, mais de 200 autores europeus  seguiram divulgando trabalhos sobre o tema. 
Os  padres jesuítas portugueses, que viveram no Japão por longos períodos a partir  do século XVI, também puderam conhecer a forma japonesa de praticar a medicina  chinesa e, no século XVII, começaram os relatos propriamente ditos de médicos  ocidentais que viveram na Ásia. Iniciou-se, assim, um período de interesse do  Ocidente pela medicina chinesa, particularmente pela acupuntura. O doutor  Joseph Berlioz, da Escola Médica de Paris, por volta de 1810, foi responsável  pela introdução da acupuntura como prática terapêutica dentro da Europa. No  entanto, não era fiel ao método chinês. Limitando-se à ação local sobre a dor e  negligenciando os conceitos de energia vital da medicina chinesa, o que se  praticava era um método primitivo de entendimento das técnicas chinesas. 
O  diplomata francês Soulié de Morant foi para a China aos vinte anos para  trabalhar em um banco. Em 1898, recebeu seu diploma da Escola de Línguas  Orientais e seu conhecimento em chinês proporcionou-lhe entrar para o  Ministério dos Assuntos Estrangeiros, sendo nomeado cônsul da França e Shangai.  O conhecimento da língua chinesa permitiu a Morant traduzir os tratados médicos  chineses que, até então, por questões linguísticas, estavam fora do alcance até  mesmo de sinólogos e de médicos em missão oficial empenhados em desvendar a  medicina chinesa. Soulié de Morant não parou mais de trabalhar e divulgar a  MTC, apesar da constante desconfiança dos médicos ocidentais. A comunidade  científica da época, apesar dos resultados positivos obtidos pela MTC,  permanecia incrédula em relação a essa técnica médica e ao trabalho de Morant.  O fato de Morant não possuir formação médica contribuía para a reação negativa  da comunidade médica ocidental. Entretanto, o que mais causava desconfiança dos  cientistas e pesquisadores do Ocidente era a introdução de uma técnica  terapêutica com conceitos e métodos tão diferentes dos seus, considerados pouco  racionais ou científicos para os padrões ocidentais estabelecidos. Soulié de  Morant chegou a ser acusado de praticante ilegal da medicina pela Ordem dos  Médicos da França. 
No  decorrer dos anos, a medicina chinesa foi, então, conquistando a França, a  Europa e posteriormente o mundo. Sua credibilidade aumentava com os resultados  positivos obtidos, o que demonstrava que não se tratava de uma técnica charlatã  ou esotérica. Notadamente a França e a Alemanha contam com a maior parte dos  técnicos acupunturistas, seguidos de Itália, Bélgica e países nórdicos. O que  se vê é um sistema sanitário externo, especificamente oriental e completamente  diverso da medicina ocidental, expandir-se e integrar-se em vários sistemas de  saúde nacionais. 
A cultura médica  chinesa no Brasil 
A  forma como a medicina chinesa se inseriu no Brasil pode ser compreendida por  quatro fatores: dois de âmbito interno e dois provenientes do contexto  internacional. As justificativas internas remetem à história dos imigrantes  orientais para o país e à evolução da cultura médica nacional. O Brasil não  consistia na rota prioritária dos chineses para a América Latina e não adotou  políticas de incentivo à imigração, o que demonstra o baixo índice de  imigrantes chineses para o país, ao contrário do que se verificou com a  imigração japonesa3. Os japoneses foram contratados para trabalhar nas plantações de café e, quando os contratos venceram, grande  parte deles mudou-se para o interior paulista ou para a região litorânea. Entre  1910 e 1914, chegaram cerca de 14.200 imigrantes japoneses. Entre 1925 e 1935, já  havia cerca de 140.000 e atualmente estima-se que a comunidade japonesa  ultrapasse um milhão de pessoas. A comunidade chinesa, em contrapartida, é  estimada em cerca de 190 mil habitantes4. 
Foram,  portanto, principalmente os imigrantes japoneses que introduziram a técnica  médica oriental no país, a qual foi disseminada na classe médica pelo  fisioterapeuta europeu naturalizado brasileiro Friedrich Johann Spaeth. Em  1958, Spaeth fundou a Sociedade Brasileira de Acupuntura e Medicina Oriental e  começou e ensinar a acupuntura para profissionais da área de saúde. Em 1961, o  médico vascular chinês Wu Tou Kwang deu um novo incentivo às técnicas médicas  orientais no país que, entretanto, ainda contavam com a recusa do Conselho  Federal de Medicina brasileiro em regularizar a prática como atividade médica.  O embate ocorria devido à repercussão de tal medida para a corporação médica  nacional. 
O  segundo fator que explica os rumos dessa técnica médica no Brasil remete à capacidade  de tolerância ou aceitação nacional. Ao verificar a história da medicina brasileira,  percebe-se que as ideias e os conhecimentos médicos aceitos e praticados provêm  de influências diversas. A medicina brasileira foi influenciada pelos ibéricos,  franceses, holandeses, jesuítas, indígenas e negros. Por volta de 1530, chegam  os primeiros profissionais formados em medicina que trazem consigo a visão terapêutica  ibérica da época, assim como chegam também os negros e, com eles, novas  patologias e práticas de cura. Na terra em que tudo faltava, os jesuítas  tornaram-se médicos e enfermeiros, adquiriram os conhecimentos da medicina  indígena, identificaram vegetais terapêuticos, cultivaram, experimentaram e  exportaram ervas variadas para a Europa, sendo algumas incorporadas à farmacopeia  mundial. A medicina jesuítica foi, portanto, substituindo aos poucos o  curandeirismo vigente. 
As  técnicas médicas brasileiras do período foram influenciadas por uma medicina  mais avançada vinda da Europa, mas também tiveram de lidar com as limitações do  ambiente em termos materiais ou culturais. A medicina europeia chegou,  encontrou a medicina nativa, dela se utilizou, trouxe elementos novos e acabou  gerando uma técnica tipicamente brasileira. O resultado foi uma medicina mesclada,  composta de superstições e crendices populares, ao mesmo tempo em que tinha seu  lado empírico, experimental, inspirado na manipulação da rica vegetação  brasileira. 
Os  hábitos e as práticas médicas atuais desenvolvidas no Brasil sofreram  influência desse período. O fato de o Brasil ter contado com uma medicina  primitiva, que procurava tratamentos pelos meios naturais existentes,  aproveitando-se da rica vegetação local, contribuiu para que não ocorresse um  completo estranhamento perante as ideias trazidas pela medicina chinesa. Dessa  forma, ao invés da introdução de uma arte médica completamente diferente, o que  poderia causar maior choque, o que se vê é a penetração de uma técnica que  encontra identificações dentro da cultura brasileira. O uso de plantas  terapêuticas no Brasil e na China é baseado em princípios diferentes;  entretanto, é possível identificar 24 espécies em comum que são utilizadas em  ambos os países para finalidades médicas5. Assim, o processo de expansão da medicina chinesa poderia ser encarado como um  retorno ao passado. 
O  terceiro fator insere-se em um momento amplo de crise do paradigma médico do  Ocidente. O crescente uso da medicina chinesa poderia ser explicado, sobretudo,  devido à crise dos sistemas de saúde, ou, por que não dizer, do próprio modo de  vida do Ocidente. A busca de um tratamento médico com técnicas mais humanas e integradoras  seria o reflexo do desgaste do crédito social da biomedicina. 
Por  fim, a globalização apresenta-se como o quarto motivo que explica o avanço da cultura  médica oriental. Trata-se do contato espontâneo entre os povos, resultado de  fluxos turísticos e migratórios ou da dinamização tecnológica. A globalização  cultural refletia, anteriormente, a difusão dos valores ocidentais pelo mundo.  Entretanto, atualmente, são os valores do Oriente que estão penetrando no  Ocidente. A China, em especial, deixou seu legado cultural com invenções como a  seda, a porcelana, o papel, a pólvora, a acupuntura, o macarrão. No século XXI,  o Oriente vem sendo difundido por meio do alto padrão de comércio entre as  nações, que também aproxima os hábitos e comportamentos. 
Os impactos socioinstitucionais 
De acordo com Marilene Cabral do  Nascimento6, podem-se estabelecer três conjunturas bem definidas no processo de penetração  da medicina chinesa no Brasil. Até a década de 1970, a acupuntura e as técnicas  chinesas causaram polêmicas no país, oscilando entre taxações como técnicas de  curandeiros e charlatanismo. Houve ainda certo nível de intolerância por parte  dos conselhos de medicina que resultaram em ameaças, prisões e processos contra  acupunturistas que não possuíam formação médica. 
O movimento dos acupuntores, em  contrapartida, não se intimidou e fez uma ofensiva contra os atos da classe  médica. Frederich Spaeth, juntamente com o Instituto de Acupuntura de São  Paulo, com a Associação Brasileira de Acupuntura e com a Federação  Sul-Americana de Acupuntura, começou a procurar a imprensa nacional,  argumentando que a existência de charlatões nesse meio era em decorrência da  ausência de regulamentação dessa técnica médica. Spaeth alertava ainda sobre a  legalização dessa prática em outros países e sua recomendação pela Organização  Mundial da Saúde7. 
A divulgação sobre a MTC permitiu o  ingresso da acupuntura nas instituições brasileiras oficiais de saúde. Os constantes resultados positivos com o  uso da medicina chinesa provocou uma adequação das instituições para a inserção  dessas técnicas nos programas de atendimento  nacional. 
Em  1981, foi implantado o Departamento de Acupuntura no Hospital das Clínicas da  Universidade Federal de Pernambuco, tanto para atendimento da população como  para trabalhos de pesquisa. Foi aberto, ainda, um curso técnico de acupuntura  no estado de São Paulo, reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) e, em 1983,  a Universidade de Pelotas abriu um polo de estudo da acupuntura na instituição.  Nesse momento, houve uma dinamização crescente nas instituições para adequar  essa arte médica aos seus programas. No Rio de Janeiro, foram oferecidos  serviços de acupuntura em três hospitais. Em 1984, discutia-se sobre a introdução  da acupuntura na rede hospitalar do Instituto Nacional de Assistência Médica e  Previdência Social (atual INPS). 
A  principal controvérsia ocorreu, majoritariamente, sobre a questão da  exclusividade médica para a prática da acupuntura. Divergências nesse campo  provocaram uma divisão entre os acupuntores, fazendo com que alguns médicos  acupunturistas abandonassem a Associação Brasileira de Acupuntura (ABA) e  fundassem a Sociedade Médica Brasileira de Acupuntura (SMBA), em 1984. Os  médicos da SMBA eram a favor da regulamentação da profissão apenas para médicos  formados, ao que a ABA alegava que o fato de ser médico não determinava  competência do profissional, mas apenas uma formação específica. A SMBA se  dirigiu à mídia nacional para elencar os riscos do uso da acupuntura por  profissionais que não fossem médicos, tais como a contaminação por doenças como  a Aids e a hepatite em razão da falta de esterilização adequada do material e  também lesões nos órgãos vitais pelo manuseio errado das agulhas. 
Em  1990, debatia-se acerca da legitimação e da regulamentação da acupuntura. O  reconhecimento pela corporação médica brasileira das práticas vindas do Oriente  ocorreu devido ao aumento da sua popularidade, o que exigiu uma resposta da  classe médica. A acupuntura foi reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina  do Brasil como ato médico em 1992 e como especialidade médica em 1995. Elaborou-se  um projeto para aprimorar a acupuntura, abrir novas linhas de investigação  científica, criar padrões de qualidade na formação de especialistas e  incrementar o intercâmbio científico, tecnológico e cultural entre o Brasil e a  China. O projeto foi aprovado pela Superintendência de Cooperação Internacional  do CNPq e possibilitou a participação de docentes chineses nos cursos universitários  de especialização e nos programas de residência médica, mestrado e doutorado.  Na época do projeto, praticamente toda a diretoria da SMBA visitou a China.  Foram estabelecidos acordos e buscou-se compreender os mecanismos  regulamentadores da prática e do ensino da acupuntura na China. 
No  âmbito de acordos internacionais firmados, os governos do Brasil e da China  estabeleceram, em 1988, o Convênio sobre Cooperação no Domínio da Medicina e  dos Fármacos Tradicionais e o Convênio de Cooperação Científica e Tecnológica  na Área de Fármacos Destinados ao Combate das Grandes Endemias. Em 1996, na  reunião de cooperação científica e tecnológica entre os dois países, o Brasil buscou  soluções conjuntas para as seguintes questões: mecanismos de controle da  qualidade dos produtos e serviços da medicina chinesa oferecidos em redes  públicas e privadas de assistência à saúde; formas de implantar o uso rotineiro  de medicamentos de origem vegetal pela população brasileira, especialmente da  área rural; como realizar pesquisas científicas básicas e estudos clínicos,  particularmente sobre a acupuntura. A farmácia chinesa  é caracterizada pelo uso de emplastros, unções, pílulas, xaropes, granulados  que provêm da sua flora diversificada. O Brasil também possui uma flora rica e  abundante, o que gera uma grande expectativa de cooperação entre os países  nesse campo. 
A medicina tradicional chinesa no Brasil  não evoluiu, portanto, para um choque cultural, mas provocou consequências  sociais importantes que levaram os grupos sociais e o governo a buscar, na  experiência asiática, soluções para suprir os desafios apresentados por esse  contato. Os  problemas relacionados às técnicas orientais não passam mais pelo  questionamento da sua eficácia como prática terapêutica, mas por questões  internas em relação à definição da profissão de acupunturista. A evolução desse  contexto de expansão da medicina tradicional chinesa evidencia outras formas de  influência e de destaque da China no mundo, as quais também exigem adaptações,  canais de entendimento e cooperação entre os países. 
Liliana Fróio é  pesquisadora do Núcleo de Estudos de Política Comparada e Relações  Internacionais da Universidade Federal de Pernambuco e professora do  Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal da Paraíba. 
    Notas 
    1. Organização Mundial de Saúde. Estrategia  de la OMS sobre medicina tradicional: 2002-2005, p. 11. 
    2. Sournia, Jean-Charles. História da medicina.  Tradução de Jorge Domingues Nogueira. Lisboa: Instituto Piaget, 1992, p. 140. 
  
    3. Os chineses se dirigiram para países em que já havia parentes instalados ou  então países que já eram rota de migração e possuíam comunidades chinesas  formadas. Na América Latina, os países que estavam na rota do coolie trade (Cuba, Peru, México,  Panamá, Costa Rica, Honduras, Trinidad, Guiana) receberam uma maior quantidade  desses imigrantes e, portanto, eram mais procurados pelos chineses que optavam  livremente pela imigração.  
  
    4. Conselho Regional  de Medicina do Estado de São Paulo. A  acupuntura no Brasil. Disponível  em <http://www.cremesp.com.br/forum/viewtopic.php?p=826&> Acesso 07 jan 2008. 
 
    5. Matos, F. J. A.; Machado, M. I. L.; Alencar, J. W.;  Matos, M. E. O.; Craveiro, A. A. Plants used in traditional medicine of China  and Brazil. Mem. Ins.  Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro,  v. 86, suppl. II, 1991, p. 13-15. 
 
    6. A autora fez um estudo sobre a acupuntura no Brasil, do período de 1974 a 1996,  baseado em matérias de jornais de grande circulação do Rio de Janeiro e São  Paulo.  
 
    7. Em 1979, a  Organização Mundial de Saúde já reconhecia o uso da acupuntura como técnica terapêutica  eficaz para mais de 40 doenças. 
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