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 A web tem proporcionado uma série  de possibilidades empreendedoras, devido à proliferação da  informação através da rede, que retorna em oportunidade de  negócio. Um grande exemplo desse efeito, nos últimos anos, é o  fenômeno do crowdfunding, que se constitui em um  formato inovador de consumo colaborativo suportado pelas redes  sociais. Nesse modelo de financiamento por meio de plataformas  especializadas, os realizadores de projetos buscam angariar recursos  junto a apoiadores que se interessem por eles, no intuito de  concretizá-los. Segundo Howe (2009, p. 248), “o crowdfunding aproveita a renda coletiva,  permitindo que grandes grupos de indivíduos substituam bancos e  outras instituições como fonte de recursos financeiros”.
  Representa, portanto, uma grande  oportunidade para os novos talentos, agindo de encontro à ação  burocrática e arranjada que o mercado tradicional exige para esses  produtos. Nessa perspectiva, Silva (2012, p. 8) lembra que “o atual  mecanismo de financiamento através das leis de incentivo é um  processo lento, burocrático e cheio de incertezas”. 
 Em  última instância, o poder de decisão troca de mãos, a ponto de os  consumidores terem, finalmente, liberdade de escolherem o que deve ou  não ser produzido (e para quem). Nessa nova configuração, os  autores não enxergam mais as empresas como único caminho, há uma  nova alternativa. 
 Justamente  por isso, diversos websites que praticam o crowdfunding já concretizaram milhares de projetos ao redor do mundo.  Internacionalmente, dois têm destaque especial. O holandês  Sellaband, por ser o precursor dessa ação de marketing; e o  norte-americano Kickstarter, que fez com que essa ferramenta se  tornasse um fenômeno de sucesso, tomando proporções globais. Foi  com o Kickstarter,  em 2009, que o crowdfunding ganhou a forma que conhecemos hoje, na qual projetos de diversas  áreas, e até voltados para o consumo, têm seu espaço. 
 O crowdfunding teve sua primeira manifestação no Brasil em 2009, com o site  Vakinha, abrangendo tanto projetos culturais  (música, teatro, dança etc.) quanto pessoais (formatura, casamento,  viagens particulares etc.), desde que os interessados apresentem  argumentos suficientemente convincentes a ponto de conquistar os  apoiadores, estimulando-os a acreditarem nos seus sonhos. Existem  também diversos outros sites respeitáveis nesse segmento, a exemplo  do Queremos!, especialista em financiamento da  vinda de shows estrangeiros para se apresentar no Brasil; e do  Bicharia, considerado um sucesso para os que  gostam e querem contribuir para melhorar a vida de animais carentes.  O “juntos.com.vc”, por sua vez, representa uma organização sem  fins lucrativos voltada para o financiamento de projetos de impacto  social, que se utiliza do crowdfunding para viabilizar a concretização de projetos idealizados por ONGs e  empreendedores sociais, com a ajuda de pessoas e empresas que se  identificam com as mais diversas causas. 
 Atualmente existem cerca de 30 sites  de consumo colaborativo no Brasil, mas o Catarse é, de longe, o mais  expressivo. Criado em 2011, foi o primeiro site brasileiro a  apresentar uma plataforma prioritariamente voltada para o  financiamento de projetos culturais. Apesar de estar há apenas  quatro anos no ar, o site já se consolidou como o mais importante  propulsor do crowdfunding no Brasil. É praticamente impossível falar desse fenômeno em nosso  país e não citá-lo. 
 Para  se ter uma ideia, apenas no Catarse, até novembro de 2015, já  haviam passado mais de 3 mil projetos, dos quais 2.090 alcançaram a  meta. Segundo o site, desde a sua criação, mais de 249 mil pessoas  contribuíram com mais de R$ 36 milhões para essas iniciativas. 
 Nas plataformas de crowdfunding,  o consumidor tem direito a uma recompensa proporcional ao valor que  foi investido. Essa recompensa funciona como um incentivo à  colaboração. Todos os projetos têm um prazo limitado para  arrecadação do valor estipulado, e aqueles que colaborarem com um  que, por ventura, não atinja a meta estimada, receberá o dinheiro  de seu apoio de volta. É a política do tudo ou nada. Entretanto,  algumas plataformas como o Kickante também trabalham com campanhas  flexíveis, em que há possibilidade de financiamento parcial. 
 O perfil dos apoiadores de crowdfunding 
 Bernardes  e Lucian (2015) conduziram um estudo visando à identificação do  perfil das pessoas que apoiam projetos no Brasil e em Portugal. O  objetivo foi identificar que sentimentos estão ligados ao  comportamento dos apoiadores de projetos culturais em plataformas de crowdfunding. 
 Após  ouvirem a opinião de 200 apoiadores,identificou-se  que aspectos como a co-criação de valor e o sentimento de pertença,  que envolvem o consumo colaborativo, são estimulantes na satisfação  deles. Por outro lado, para o comportamento de lealdade,  acrescenta-se a esses, a questão da recompensa que envolve esses  tipos de projetos. A confiança, o benefício psicológico (não  monetário) e o co-desenvolvimento (customização) foram aspectos  comportamentais estudados, entretanto não apresentaram relação com  as respostas comportamentais estudadas. 
  
    
 Figura  1: Modelo de comportamento do apoiador de crowdfunding (Bernardes, 2014). 
 
 O  sentimento de pertença 
 O  papel dos doadores e colaboradores de um projeto de crowdfunding é demonstrado a partir de sua efetiva participação, inclusive como  parte diretamente envolvida no projeto. Segundo Koury (2001), o termo  pertença advém do mergulho no universo relacional do grupo,  permitindo ao sujeito individual sentir-se pessoa que acredita e é  acreditada. 
 O  apoiador co-criador 
 A co-criação como fator inovador e  agregador de valor acaba contribuindo para a satisfação do  consumidor, a partir do seu envolvimento prévio com o produto, longe  do espaço interno das organizações. Bartl et al., (2010)apresentam a co-criação  como uma abordagem que determina que a criação de valor seja  realizada além das fronteiras organizacionais, incentivando ainda a  colaboração dos stakeholders no processo de desenvolvimento de novos produtos. 
 Recompensas 
 Carvalho (2012) mostra que um sistema  de recompensa representa um pacote de benefícios materiais e  imateriais disponibilizados aos colaboradores, no intuito de aumentar  a motivação. No caso do consumo colaborativo, se feita uma analogia  ao pensamento desse autor, os benefícios materiais são  representados pela recompensa física de um produto ou serviço,  enquanto que os imateriais podem ser representados pelas recompensas  simbólicas de um agradecimento em local especial, como em uma página  da internet. 
 Vantagens do crowdfunding 
 A  dinâmica do crowdfunding possibilita  uma interação social muito forte por meio de suas plataformas, onde  é possível se deparar com uma verdadeira abundância de projetos  criativos, mostrando que, por mais inusitado e diferenciado que seja  o produto oferecido, sempre haverá público que nele acredite. Na  web,percebe-se  que mesmo os produtos ou projetos aparentemente “desinteressantes”  para o público em geral têm chamado à atenção e produzido um  nicho específico sedento por consumi-lo. 
 Pode-se dizer que o consumo  colaborativo exerce um grande fascínio para os apoiadores e também  realizadores de produtos, abrindo portas para novos rumos de  empreendedorismo a partir da atuação da comunicação promovida  pela web. Para aumentar o número de apoiadores, as plataformas devem  enfatizar a co-criação e o sentimento de pertença em seus  projetos, já que eles promovem a satisfação. Somado a esses, para  obter ainda uma resposta de lealdade, deve-se investir em boas  recompensas, fazendo com que esses apoiadores sintam o desejo de  contribuir mais vezes. 
 É de relevância mencionar, por ter  sido observado ao longo do estudo, que o crowdfunding aponta para o futuro do  consumo, em que, mediante a convergência das mídias e de uma maior  oxigenação do mercado, será exigida uma participação mais  próxima e ativa do consumidor no processo de concretização de  novos produtos. 
 Novos estudos 
 Atualmente, os autores deste artigo  estão realizando um novo estudo sobre a temática, comparando o  comportamento do consumidor de produtos do crowdfunding em três estados brasileiros, Piauí, Pernambuco e Minas Gerais,  envolvendo a confiança e a qualidade como aspectos importantes de  serem mensurados, além do sentimento de pertença e da co-criação  já abordados, só que, desta vez, por meio de um experimento que  dará origem a uma abordagem comparativa. 
 
  Rafael  Lucian é doutor em gestão organizacional pela Universidade Federal de  Pernambuco (UFPE), professor e coordenador do Núcleo de Apoio à  Pesquisa na Faculdade Boa Viagem FBV | DeVry (Recife-PE). 
 Bartos  Bernardes é mestre em gestão empresarial pela Faculdade Boa Viagem FBV |  DeVry (Recife-PE) e professor efetivo do Instituto Federal de Ciência  e Tecnologia do Piauí (IFPI). 
 
  Referências  bibliográficas 
 Bartl,  M.;  Jawecki,  G.;  Wiegandt,  P.  “Co-creation  in  new  product  development:  conceptual  framework  and  application  in  the  automotive  industry”.  Conference  Proceedings  R&D  Management  Conference  Information,  Imagination  and  Intelligence,  Manchester,  2010. 
 Bernardes,  B. B.; Lucian, R. “Comportamento de consumidores brasileiros e  portugueses em plataformas de crowdfunding”.  In: Revista  Brasileira e Portuguesa de Gestão.  Lisboa – v. 14, n. 1, p. 26-36, Jan/Abr. de 2015. Disponível em:  .  Acesso em: 15 Out. 2015. 
 Bernardes,  B. B.  “Financiamento coletivo: uma análise do comportamento do  consumidor luso-brasileiro em plataformas de crowdfunding”. Dissertação (Mestrado em gestão empresarial) – Faculdade Boa  Viagem / DeVry Brasil, Recife, 2014. 
 Carvalho,  G. R. de; et  al.  “Sistemas  de recompensa e suas influências na motivação dos funcionários:  estudo em uma cooperativa capixaba”.  IX SEGET – Simpósio de excelência em gestão e tecnologia. 2012.  Disponível em: < http://www.aedb.br/seget/artigos12/22716469.pdf>.  Acesso em: 06 ago. 2014. 
 Howe,  J. O  poder das multidões:  por que a força da coletividade está remodelando o futuro dos  negócios. Tradução: Alessandra Mussi Araujo. Rio de Janeiro:  Elsevier, 2009. 
 Koury,  M. G. P. Enraizamento,  pertença e ação cultural.  São Paulo: Cronus,  2001. 
 Silva,  B. C. da. “Crowdfunding: uma alternativa para o financiamento de  atividades culturais”. 2012. Trabalho de Conclusão de Curso –  Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2012. 
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