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 Ciência e Tecnologia (C&T) são  componentes inseparáveis de um processo que subsidia o desenvolvimento  tecnológico, constituindo as bases para a inovação empresarial, o progresso e o  vigor econômico de muitas nações. Na base desse progresso está o salto de  produtividade científica alcançado no século XX e que segue sendo crescente ao  longo deste novo século. Com efeito, os avanços proporcionados pela pesquisa  científica e tecnológica com visibilidade mundial possibilitou resolver  problemas específicos e funcionais em diversos setores, inseriu no mercado  produtos de alta tecnologia e resultou em inúmeros incrementos econômicos e  sociais mundo afora, proporcionando, direta ou indiretamente, considerável  melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.  
 A propósito desses avanços, vale inquirir: afinal, quantos  países desenvolvem atividades destinadas à geração de novos conhecimentos  científicos? A norma ISO 3166-1(1) lista 246 países e a Web of Science (InCites, Thomson  Reuters) lista na sua base de dados 226 países. No conjunto, foram produzidos  no período 2009 – 2013 mais de 8,5 milhões de artigos científicos. O dado  confirma que todos os países, independentemente do seu estágio de  desenvolvimento, vêm buscando participar do processo de geração de  conhecimentos novos e, em consequência, ocupar posição no ranking mundial da  ciência. Isto ocorre porque a inserção dos países  entre os produtores de tecnologias inovadoras depende da produção de  conhecimentos científicos novos, o que possibilita desenvolver um planejamento  estratégico para subsidiar o sistema produtivo das nações. Tal condição é  circunstância inerente às nações já desenvolvidas, mas tem especial  aplicabilidade para aquelas em estágio de desenvolvimento. De fato, o  financiamento da pesquisa científica em todo o mundo tem o objetivo maior de  alicerçar o desenvolvimento dos países, e não de alimentar a possível vaidade  dos cientistas como muitas pessoas pensam.  
 Não obstante constatar-se que tantas nações estejam  participando da comunidade científica, apenas um pequeno grupo de 24 países  contribui, cada um, com a produção de pelo menos 1% da produção científica  mundial, e cuja produção conjunta responde por 84,1% do total de artigos de  todas as áreas em todo o mundo. Também é de se constatar que há nesses 24  países uma elevada correlação entre a posição ocupada no ranking mundial do PIB  e a posição no ranking da ciência. Tal fato permite perceber que a riqueza das  nações tem relação direta com a capacidade científica de gerar conhecimentos  novos. 
 
 2. Indicadores quantitativos e qualitativos em CT&I 
 Sabidamente a publicação do artigo  científico é o corolário do desenvolvimento do projeto de pesquisa individual,  e o conjunto das publicações de uma instituição tem direta relação com sua  qualificação educacional e capacitação científico-tecnológica. Estendido aos  países o volume e a qualidade dessas publicações, constituem seguro indicador  da sua pujança econômica. E não é sem razão que a grande maioria desses países  desfruta também dos mais elevados níveis de desenvolvimento social.  Ressalte-se, todavia, que em qualquer área do conhecimento, o volume de  publicações é diretamente proporcional ao tamanho da comunidade de  pesquisadores atuando naquela área. O Brasil possui 350 mil professores  universitários e produz mais de 36 mil artigos científicos  indexados por ano. Essa relação (0,1 artigo qualificado/docente/ano) mostra que  o volume da produção é equivalente ao número de pesquisadores e, como se verá  adiante, da capacidade do país de formar novos recursos humanos em C&T, e  não do seu total de docentes universitários. 
 Vem daí a grande  dispersão observada na produção científica mundial, quer seja em relação aos  campos de pesquisa, quer seja em relação à produção de cada país. Embora essa  dispersão também ocorra no componente qualitativo em relação às áreas do  conhecimento, o Fator de Impacto (FI), que indica o índice de citações da  produção científica de um pesquisador, instituição ou país, é menos dependente  do tamanho da comunidade científica. A matemática é um bom exemplo: a mediana  do FI das revistas de matemática é muito menor do que o das revistas das outras  ciências exatas (física e química), e mais ainda das revistas médicas e  biomédicas.  
 De fato, esse  componente qualitativo é mais dependente de outros fatores em que uma  publicação venha a impor um repensar sobre o  conhecimento existente naquela área, vindo daí o conceito de inovação  científica (break through) e da  qualidade dos artigos, resultando também no maior ou menor volume de citações  e, em consequência, o índice cienciométrico bastante usado, o FI que identifica  o componente qualitativo daquele artigo, daquele campo do conhecimento e, em  consequência, das revistas da área. Países como Israel, Áustria, Escócia,  Irlanda, Bélgica, os países nórdicos e alguns outros com relativamente baixa  produção quantitativa, mas com elevados índices no FI e no padrão de vida, são  exemplos da dicotomia quantitativo-qualitativo.  
 Sabe-se também que  o FI é altamente influenciado pelo grau de colaboração científica internacional  que os artigos carregam, e isto resulta do conhecido fato de que a coautoria  nas publicações, sobretudo com pesquisadores dos países mais destacados na  ciência mundial, resulta em um substancial aumento do número de citações  daquela publicação. Mas destaque-se também que, nesses casos, a coautoria internacional  favorece e distorce a percepção do componente qualitativo quando aplicado aos  países com muito baixa produção científica. 
 
 3. Sobre a cultura e uso dos indicadores 
 Estamos, pois, tratando de dois fundamentais componentes da  cultura dos indicadores cienciométricos: a produção quantitativa de artigos e  seu componente qualitativo, que inclui, além do FI, vários outros indicadores,  geralmente de uso mais restrito, como a vida média dos artigos na literatura  internacional, o qual indica o tempo de duração e a importância da inovação  científica (break through)  representada naquela publicação. Apesar da existência de um inerente grau de  limitação para a utilização dos indicadores de produtividade científica, ainda  assim, eles constituem ferramentas indispensáveis na avaliação da maturidade de  uma comunidade científica por permitirem comparações nas bases de dados  internacionais com os componentes quali-quantitativos da ciência mundial. 
 Assim, os indicadores científicos, hoje  plenamente disponibilizados nas bases de dados internacionais, representam uma  nova fase na conceituação e valoração da ciência, reforçando o processo de  avaliação pelos pares, o monitoramento por setores, propiciando o emprego de  racionalidade na utilização dos recursos humanos e materiais e orientando, ademais,  a formação e capacitação de novos recursos humanos e a conjugação de esforços  para propor e induzir ações para o enfrentamento de demandas prioritárias para  o desenvolvimento dos países nas áreas do conhecimento que lhe são  facilitadoras da exploração de vantagens comparativas. 
 Ainda que,  recentemente, venham surgindo críticas ao uso dos indicadores de CT&I,  especialmente dirigidas aos casos específicos de avaliação de indivíduos para  cargos e concursos, tais críticas não se fazem acompanhar de sugestões de  aplicabilidade específica de outros indicadores que possam ser considerados  mais apropriados e precisos. Com frequência tais críticas se limitam a sugerir que a qualidade de uma  publicação científica deva ser avaliada e apreciada a partir da leitura do  artigo. Ora, é exatamente isto que fazem mundo afora, os milhares de revisores  das revistas especializadas sérias, ou seja, a recomendação da publicação  referendada pela avaliação dos pares, aliás, a única forma possível de  qualificar uma determinada publicação. 
 Na verdade, como  mostra a figura 1, ao longo dos últimos 20 anos houve extraordinário  crescimento dos estudos cienciométricos baseados, sobretudo, nesses dois  parâmetros aplicados ao desenvolvimento científico. Assim, a figura 1 confirma  que os milhares de estudos cienciométricos e a cultura do estudo da  cienciometria estão plenamente estabelecidos como instrumentos de quantificação  e qualificação da ciência em todo o mundo. 
 
 
      Número de documentos(2) (artigos e  revisões) publicados nos quinquênios indicados e indexados no tema  cienciometria e listados na base Web of Science. Fonte: Web of Science – Thomson  Reuters. Acesso em: 1 mar. 2015. 
   
 A comparação da  produção científica entre áreas do conhecimento e, sobretudo, entre os países por  meio da cienciometria, tem como base o levantamento e qualificação dos inúmeros  trabalhos acadêmicos buscando relacionar o desempenho científico com o atual  contexto socioeconômico. Identificamos em artigos anteriores essas  características na área médica e biomédica (Guimarães, 2004) e nas engenharias  (Guimarães, Oliveira e Prata, 2007) no Brasil. 
 Acredita-se que,  conhecendo as características da produção científica, seja possível revelar as  potencialidades do país em relação ao resto do mundo, o que pode orientar o  investimento no desenvolvimento de áreas estratégicas. Esse conceito se aplica  especialmente para os países em estágio de desenvolvimento emergente, como é o  caso do Brasil. De fato, como mostra a figura 2, ao longo das últimas três  décadas, o Brasil vem obtendo extraordinário crescimento na produção de artigos  científicos indexados, publicados em periódicos de qualificação internacional  (Almeida e Guimarães, 2013).  
 A figura 2 mostra  claramente que o crescimento relativo da produção brasileira é cerca de 6 vezes  maior do que o crescimento mundial. Fenômeno semelhante vem ocorrendo com  outros países emergentes, a saber: China, Coréia do Sul, Irã, Turquia, Taiwan,  Cingapura, além de outros (Almeida e Guimarães, 2013). Fruto desses avanços, esses  países, assim como o Brasil, passaram a ocupar, recentemente, posição mais  destacada no ranking mundial da ciência, com equivalentes desdobramentos na  obtenção de resultados tecnológicos, como é o conhecido caso da Coreia do Sul.  O Brasil ocupa, nesse ranking, desde 2009, a 13ª posição, produzindo 2,7% da  produção mundial de artigos científicos, e pode-se apontar como tais  desdobramentos a conquista de extraordinários avanços técnico-científicos na  agricultura, medicina tropical, automação bancária,  produção de aeronaves, tecnologia de extração de petróleo em águas  profundas,  indústria de papel e  celulose, controle biológico de pragas, odontologia, biotecnologia animal e  vegetal, produção de biocombustíveis e em outros setores. Há ainda outras  formas de identificar o impacto da ciência em nosso país como mostrado por De  Meis, Arruda e Guimarães (2007). 
 
  
      Índice relativo de crescimento da  produção científica brasileira e do mundo. Fonte: Incites – Thomson Reuters.  Acesso em: 1 mar. 2015.  
   
 O crescimento da produção científica  brasileira tem relação com três importantes ingredientes: a produção das teses  de doutorado, a implantação do Portal de Periódicos da Capes e a crescente  indexação das revistas científicas brasileiras nas bases de dados internacionais,  a saber, o JCR da Thomson Reuters e Scopus da Elsevier. 
 Como mencionado anteriormente, a  capacidade de gerar novos recursos humanos, vale dizer, pesquisadores no nível  de doutorado, mantém estreita relação com a nossa produção científica. Com efeito,  verifica-se que o tamanho da produção científica nacional é proporcional ao  número de novos pesquisadores formados, como ilustra a figura 3, ou seja,  atualmente cerca de 2,5 artigos por tese defendida. Essa intrínseca  inter-relação tem sido também reconhecida previamente em áreas específicas  (Coutinho et al., 2012). 
 A inter-relação da produção científica com a formação de  recursos humanos tem especial significado no Brasil devido à existência de seu  forte modelo de pós-graduação (Guimarães e Humann, 1995; Guimarães e Almeida,  2013). De fato, ocorre que, i) nosso desempenho em ciência é quase todo feito  nos cursos de pós-graduação; ii) a conceituação dos cursos depende da qualidade  da produção científica dos docentes-orientadores e de seus orientados. A  crítica internacional sobre o uso de indicadores quali-quantitativos aqui cai  por terra porque a missão da avaliação da pós-graduação é garantir uma boa  formação para os mestres e doutores titulados e isso se mede pelo desempenho  dos cursos, aí incluídas em especial suas publicações; iii) a avaliação da  pós-graduação mede desempenho coletivo dos  professores, orientadores e alunos, não se atendo a uma avaliação de  indivíduos, principal fonte das mencionadas críticas. 
 
 
       
 Número de titulados doutores no Brasil  x produção científica indexada (1987-2013). Fonte: Geocapes/Capes e Incites –  Thomson Reuters. Acesso em: 1 mar. 2015.  
   
 Vale ainda considerar que, na avaliação da pós-graduação,  sempre feita tomando em conta o desempenho dos atores dos cursos nos três anos  anteriores, o componente qualitativo mais importante é o Fator de Impacto das  revistas, porque sabidamente artigos recentes ainda não desfrutam de número  significativo de citações e que o prestígio das revistas científicas resulta  exatamente da perspectiva de que seus artigos serão mais lidos e mais citados.  Isso tem especial importância nas revistas especializadas dos inúmeros campos  do conhecimento e da pesquisa em que se divide a ciência contemporânea. 
 Papel crucial no avanço quali-quantitativo  da produção científica brasileira deve ser atribuído ao advento do Portal de  Periódicos da Capes, concebido e estabelecido no ano 2000. A existência do  Portal veio compensar a juventude do nosso sistema de C&T, possibilitando a  integração da atividade científica brasileira com a mundial, e indicando o grau  de competição entre as áreas e países, e abrindo perspectivas de exploração por  nossos cientistas de oportunidades de pesquisa em novas áreas como bioenergia,  materiais, nanotecnologia e agricultura moderna, preocupações que estão no  núcleo dos problemas científicos contemporâneos. O acervo do Portal vem  crescendo significativamente desde 2004 (Almeida, Guimarães e Alves, 2010),  oferecendo à comunidade científica brasileira a possibilidade de crescente  acesso à bibliografia internacional atualizada diariamente. Essa facilidade tem  sido a base da garantia da produção científica mais qualificada, como visto  ocorrer com o extraordinário crescimento recente da produção de artigos de  revisão produzidos por autores brasileiros, o que requer pleno acesso à  literatura internacional atualizada (Almeida e Guimarães, 2013). 
 O outro fator importante que favoreceu  o crescimento da nossa produção científica foi o esforço para indexação nas  duas bases de dados internacionais de um total de cerca de 100 revistas  brasileiras indexadas a partir de 2008. A figura 4 ilustra tal crescimento na  base de dados da Thomson Reuters. Verifica-se que, antes de 2008, o número de  revistas brasileiras indexadas nessa base era extremamente baixo, quando já se  constatava, à época, um distinto desempenho da ciência brasileira. Assim,  pode-se dizer que a indexação de nossas revistas foi conquistada a partir da  demonstração do vigor da nossa ciência nos últimos 30 anos. A assinatura pela Capes  do acervo do Portal de Periódicos, e a atuação conjunta com diversos editores  de revistas brasileiras, foram também fatores positivos nessa conquista. 
    Número de periódicos brasileiros indexados na base Web of  Science (2004-2013) Fonte: JCR - Thomson Reuters. Acesso em: 1 mar. 2015. 
 
              
  O resultado desse esforço é a produção  de dados que se incorporem aos processos de avaliação e planejamento em várias  escalas, podendo ser usado como base para a adoção de políticas públicas de  incentivo à pesquisa científica e à gestão tecnológica.  
   
 Cristina  Haeffner, curso de pós-graduação em Química da Vida e  Ciências da Saúde (PPGQVS), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bolsista  do programa Pronametro/Inmetro; mestranda do PPGQVS/UFRGS.  
 Sonia R.  Zanotto, curso de pós-graduação em Química da Vida e  Ciências da Saúde (PPGQVS), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).  Bibliotecária do IBGE-RS; doutoranda do PPGQVS/UFRGS.  
 Jorge A.  Guimarães, curso de pós-graduação em Química da Vida  e Ciências da Saúde (PPGQVS), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Coordenação  de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes, Ministério da  Educação. Professor do PPGQVS/UFRGS e pesquisador do Centro de Biotecnologia, UFRGS.  
   
 Notas  
  1 – ISO (International  Organization for Standardization)3166-1 é parte da norma ISO  3166, que sugere códigos para os nomes de países e  dependências. 
  2 – O número de documento se  refere ao resultado da busca: Scientometric* OR Bibliometric* OR Informetric*  OR Webmetric*.  
   
 Referências   
  Almeida, E.C.E.; Guimarães, J.A.; Alves, I.T.C. (2010). “Dez  anos do Portal de Periódicos da CAPES: histórico, evolução e utilização”. Revista  Brasileira de Pós-Graduação 7, 218 – 246. 
  Almeida, E.C.E.; Guimarães, J.A. (2013). “Brazil’s growing production of  scientific articles – how are we doing with review articles and other  qualitative indicators?” Scientometrics 97, 287 – 315.  
  Coutinho, R.X.; Dávila, E.S.; Santos, W.M., Rocha, J.B.T.;  Souza, D.O.G.; Folmer, V. (2012). “Brazilian scientific production in science education”.  Scientometrics 92, 697-710.  
  De Meis, L.; Arruda, A.P.; Guimarães, J.A. (2007). “The impact of science in Brazil”. IUBMB  Life, 59, 227-234.  
  Guimarães, J.A. (2004). “A pesquisa médica e biomédica no Brasil.  Comparações com o desempenho científico brasileiro e mundial”. Ciência e Saúde  Coletiva 9, 303-327.  
  Guimarães, J.A.; Humann, M. (1995). ”Training of human resources in  science and technology in Brazil: the importance of a vigorous post-graduate  program and its impact on the development of the country”. Scientometrics 34,  102 - 119.  
  Guimarães, J.A.; Oliveira, J.G. e Prata, A.T. (2007). “Engenharia  e desenvolvimento no Brasil: desafios e perspectivas”. Parcerias Estratégicas  CGEE, Volume 25. 
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