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 O  que é habitualmente denominado Prêmio Nobel da Economia foi criado  em 1968 pelo Banco Central da Suécia, em comemoração do seu  terceiro centenário e em homenagem à memória de Alfred Nobel.  Entre 1969 e 2014, o Prêmio foi atribuído pela Academia das  Ciências da Suécia a 75 personalidades, ligadas, quando da  atribuição, a 59 instituições dos Estados Unidos, seis da  Grã-Bretanha, duas da França, duas da Noruega, duas da Suécia, uma  da Alemanha, uma de Israel, uma dos Países Baixos e uma da União  Soviética. O predomínio dos Estados Unidos (quase 80% dos  laureados) é esmagador, não deixando dúvidas quanto ao papel das  instituições americanas na pesquisa em matérias da ciência  econômica nas décadas recentes, o que é acentuado pelo número  significativo de laureados nascidos em outros países, mas que  receberam o prêmio quando trabalhavam em instituições americanas.
 
  Os  primeiros anos de atribuição do prêmio podem ser vistos como um  reconhecimento dos principais avanços da ciência econômica no meio  século que precedera a respectiva criação. Na verdade, as escolhas  recaíram, sobretudo, em autores que tinham concebido novas  metodologias de análise econômica, ou que mais tinham contribuído  para o desenvolvimento de alguns ramos da ciência econômica durante  esse período. 
 
  A primeira  metodologia consagrada foi a econometria, isto é, a aplicação  sistemática da estatística analítica na ciência econômica,  através da atribuição do primeiro Prêmio Nobel da Economia em  1969 a Ragnar Frisch (Noruega, 1895-1973) e Jan Tinbergen (Países  Baixos, 1903-1994). Bastante mais tarde, foi igualmente reconhecido o  papel, neste campo, de Trygve Haavelmo (Noruega, 1911-1999, prêmio  de 1989). 
 
  Seguiram-se: 
 
  • A  análise das relações intersetoriais, pela atribuição do prêmio  de 1973 a Wassily Leontief (EUA, nascido na Rússia, 1906-1999). 
  • As  técnicas de otimização da afetação de recursos, pela atribuição  do prêmio de 1975 a Leonid Kantorovich (União Soviética,  1912-1986) e Tjalling Koopmans (EUA, nascido nos Países Baixos,  1910-1985). 
  • A  contabilidade nacional, isto é, a medição dos níveis de atividade  econômica e de satisfação de necessidades, pela atribuição do  prêmio de 1984 a Richard Stone (Grã-Bretanha, 1913-1991). 
  No  que respeita aos principais desenvolvimentos de ramos da ciência  económica, há que referir: 
 
  • O  estudo do crescimento econômico, quer numa perspetiva  predominantemente empírica, pela atribuição do prêmio de 1971 a  Simon Kuznets (EUA, nascido na Rússia, 1901-1985), quer na  perspectiva da análise da situação dos países menos  desenvolvidos, por meio da atribuição do prêmio de 1979 a Theodore  Schultz (EUA, 1902-1998) e Arthur Lewis (EUA, nascido nas Índias  Ocidentais Britânicas, hoje Santa Lúcia, 1915-1991), quer na  perspetiva predominantemente teórica, por meio da atribuição do  prêmio de 1987 a Robert Solow (EUA, 1924). 
  • A  teoria microeconómica, isto é, a explicação de como uma economia  de mercado funciona a partir da análise do comportamento dos agentes  econômicos, quer na perspetiva do equilíbrio geral, por meio da  atribuição do prêmio de 1972 a Kenneth Arrow (EUA, 1921) e do  prêmio de 1983 a Gérard Debreu (EUA, nascido na França,  1921-2004), quer na perspetiva da teoria dos mercados, pelo prêmio  de 1988 a Maurice Allais (França, 1911-2010). 
  • A  teoria do bem-estar, isto é, a análise da relação entre os  mecanismos de mercado e a satisfação das necessidades dos seres  humanos, por meio da atribuição do prêmio de 1972 a John Hicks  (Grã-Bretanha, 1904-1989). 
 • A  teoria das flutuações econômicas, pelo prêmio de 1974 a Gunnar  Myrdal (Suécia, 1898-1987) e Friedrich von Hayek (EUA, nascido na  Áustria, 1899-1992). 
  • A  teoria da moeda, pela atribuição do prêmio de 1976 a Milton  Friedman (EUA, 1912-2006) e, bastante mais tarde, do prêmio de 1999  a Robert Mundell (EUA, nascido no Canadá, 1932). 
  • A  teoria do comércio internacional, por meio da atribuição do prêmio  de 1977 a Bertil Ohlin (Suécia, 1899-1979) e James Meade  (Grã-Bretanha, 1907-1995). 
 
  Um  caso especial é, sem dúvida, o de Paul Samuelson (EUA, 1915-2009),  a quem foi atribuído o segundo Prêmio Nobel da Economia, em 1970.  Na verdade, suas contribuições foram decisivas em campos muito  variados, desde a metodologia sobre a teoria dos bens públicos,  passando, entre outros, pelos domínios do comércio internacional,  dos ciclos econômicos e do comportamento do consumidor, como  reconheceu a Academia das Ciências da Suécia ao referir-se ao  "trabalho científico através do qual desenvolveu a teoria  econômica estática e dinâmica e contribuiu ativamente para elevar  o nível de análise da ciência económica". Samuelson foi,  além disso, autor do manual de ciência econômica mais difundido  desde a Segunda Guerra Mundial. 
  A  partir de finais da década de 1970, o perfil das atribuições do  Prêmio Nobel da Economia começou a mudar gradualmente. Em primeiro  lugar, por as atribuições contemplarem sobretudo contribuições  mais recentes, apresentadas nas últimas décadas do século XX e  princípios do século XXI. Em segundo lugar, por se distribuírem  não só pelos tradicionais ramos da ciência ecoôómica e por  algumas inovações metodológicas, mas também pelo estudo do  funcionamento das organizações econômicas, nomeadamente das  empresas, e pelo estudo dos mercados financeiros, estes com grande  proeminência quantitativa. 
 
  O  Prêmio Nobel da Economia foi pela primeira vez atribuído a uma  contribuição no domínio do estudo do funcionamento das  organizações econômicas em 1978, com Herbert Simon (EUA,  1916-2001). Bastante mais tarde veio o reconhecimento da contribuição  de Oliver Williamson (EUA, 1932, prêmio de 2009). 
 
  O  Prêmio Nobel da Economia foi pela primeira vez atribuído a uma  contribuição no domínio do estudo dos mercados financeiros em  1981, com James Tobin (EUA, 1918-2002). Seguiram-se Franco Modigliani  (EUA, nascido em Itália, 1918-2003, prêmio de 1985), Harry  Markowitz (EUA, 1927, prêmio de 1990), Merton Miller (EUA,  1923-2000, prêmio de 1990), William Sharpe (EUA, 1934, prêmio de  1990), Robert Merton (EUA, 1944, prêmio de 1997), Myron Scholes  (EUA, nascido no Canadá, 1941, prêmio de 1997), Eugene Fama (EUA,  1939, prêmio de 2013), Lars Peter Hansen (EUA, 1952, prêmio de  2013) e Robert Shiller (EUA, 1946, prêmio de 2013). 
 
  O  estudo dos tradicionais ramos da ciência econômica foi fundamental  para a atribuíção dos seguintes prêmios: 
 
  • Pelo  trabalho no domínio da teoria das flutuações econômicas, a  Lawrence Klein (EUA, 1920-2013, prêmio de 1980), Finn Kydland (EUA,  nascido na Noruega, 1943, prêmio de 2004) e Edward Prescott (EUA,  1940, prêmio de 2004). 
  • Pelo  trabalho no domínio das estruturas de mercado e da regulação  pública, a George Stigler (EUA, 1911-1991, prêmio de 1982). 
  • Pelo  trabalho no domínio da macroeconomia, isto é, da explicação de  como uma economia de mercado evolui, com base na análise de  agregados obtidos estatisticamente pela contabilidade nacional, a  Robert Lucas (EUA, 1937, prêmio de 1995), Edmund Phelps (EUA, 1933,  prêmio de 2006), Thomas Sargent (EUA, 1943, prêmio de 2011) e  Christopher Sims (EUA, 1942, prêmio de 2011). 
  • Pelo  trabalho no domínio da teoria dos incentivos e da informação  assimétrica, a James Mirrlees (Grã-Bretanha, 1936, prêmio de  1996), William Vickrey (EUA, nascido no Canadá, 1914-1996, prêmio  de 1996), George Akerlof (EUA, 1940, prêmio de 2001), Michael Spence  (EUA, 1943, prêmio de 2001) e Joseph Stiglitz (EUA, 1943, prêmio de  2001). 
  • Pelo  trabalho no domínio da teoria do bem-estar, a Amartya Sen  (Grã-Bretanha, nascido na Índia, 1933, prêmio de 1998). 
  • Pelo  trabalho no domínio da econometria, a James Heckman (EUA, 1944,  prêmio de 2000), Daniel McFadden (EUA, 1937, prêmio de 2000),  Robert Engle (EUA, 1942, prêmio de 2003) e Clive Granger (EUA,  nascido na Grã-Bretanha, 1934-2009, prêmio de 2003). 
  • Pelo  trabalho no domínio da geografia econômica, isto é, da análise da  localização das atividades económicas, a Paul Krugman (EUA, 1953,  prêmio de 2008). 
  • Pelo  trabalho no domínio da análise dos bens coletivos, a Elinor Ostrom  (EUA, 1933-2012, prêmio de 2009). (Note-se que Elinor Ostrom foi a  primeira, e até hoje única, senhora laureada com um prêmio ainda  quase exclusivamente atribuído a personalidades do sexo masculino.) 
  • Pelo  trabalho no domínio da teoria dos mercados, a Peter Diamond (EUA,  1940, prêmio de 2010), Dale Mortensen (EUA, 1939-2014, prêmio de  2010), Christopher Pissarides (Grã-Bretanha, nascido em Chipre,  1948, prêmio de 2010), Alvin Roth (EUA, 1951, prêmio de 2012),  Lloyd Shapley (EUA, 1923, prêmio de 2012) e Jean Tirole (França,  1953, prêmio de 2014). 
 
  Algumas  inovações metodológicas e explorações de novos domínios foram  igualmente fundamentais para a atribuição de prêmios: 
 
  • A  análise das bases contratuais e constitucionais da teoria da  decisão, com James Buchanan (EUA, 1919-2013, prêmio de 1986). 
  • A  análise da delimitação da empresa por meio da comparação dos  custos de produção interna, ou custos de organização, com os  custos de aquisição, ou custos de transação, e da base  institucional dos direitos de propriedade por Ronald Coase (EUA,  nascido na Grã-Bretanha, 1910-2013, prêmio de 1991). 
  • A  extensão das técnicas de análise da economia a comportamentos e  fatos não econômicos por Gary Becker (EUA, 1930-2014, prêmio de  1992). 
  • A  aplicação das técnicas de análise da economia à história,  especialmente à história econômica, por Robert Fogel (EUA,  1927-2013, prêmio de 1993) e Douglass North (EUA, 1920, prêmio de  1993). 
  • A  teoria dos jogos, esta, porventura, pela primeira vez de forma  surpreendentemente tardia, com John Harsanyi (EUA, nascido na  Hungria, 1920-2000, prêmio de 1994), John Nash (EUA, 1928, prêmio  de 1994), Reinhard Selten (Alemanha, 1930, prêmio de 1994), Robert  Aumann (Israel, nascido na Alemanha, 1930, prêmio de 2005) e Thomas  Schelling (EUA, 1921, prêmio de 2005). 
  • A  economia experimental, isto é, o desenvolvimento da indução  econômica com base, não em material histórico, como era  tradicional, mas no desempenho de papéis por agentes econômicos em  experiências laboratoriais, com Vernon Smith (EUA, 1924, prêmio de  2002). 
  • O  esforço de integração da pesquisa psicológica na análise  econômica, dando origem à chamada economia comportamental, por  Daniel Kahneman (EUA, nascido no mandato britânico da Palestina,  hoje Israel, 1934, prêmio de 2002).  
  • A  teoria da conceção de mecanismos, com Leonid Hurwicz (EUA, nascido  na Rússia, 1917, prêmio de 2007), Eric Maskin (EUA, 1950, prêmio  de 2007) e Roger Myerson (EUA, 1951, prêmio de 2007). 
 
  É  clara a diversidade de temas e abordagens reconhecidos na atribuição  dos prêmios Nobel da Economia. Mas também é clara a sua orientação  exclusiva para o que é habitualmente denominado a corrente principal  da ciência econômica mainstream  economics.  Inversamente, poderá, porém, sugerir-se que é o reconhecimento,  por meio de um Prêmio Nobel, que demarca o que é, ou não, a  corrente principal da ciência econômica. Na verdade, se  metodologias como a econometria e a teoria dos jogos, e abordagens  como as habitualmente classificadas como neoclássicas, keynesianas e  neokeynesianas (as quais, de uma forma muito simplificadora, se podem  identificar como as abordagens do manual de Paul Samuelson  anteriormente mencionado) foram alvo de reconhecimento quando já  constituíam a corrente principal da ciência econômica, pode  dizer-se que os prêmios atribuídos a autores  associados a  metodologias como a economia experimental e a abordagens  habitualmente classificadas como monetaristas, da nova escola  clássica e da escola neoaustríaca, contribuíram para a aceitação  dessas metodologias e abordagens como parte da corrente principal da  ciência econômica. Além disso, não deve ser deixada em claro a  tendência para os campos de estudo dos laureados terem evoluído de  um predomínio da macroeconomia para um predomínio da microeconomia,  teoria das organizações e teoria dos mercados financeiros, mais um  sinal das mudanças no interior da própria ciência econômica. 
 
 Nuno  Valério é professor do Instituto  Superior de Economia e Gestão (ISEG – Universidade de Lisboa). Foi presidente  da Associação Portuguesa de História Econômica e Social e da  Associação Portuguesa de História das Relações Internacionais. 
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