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                             O turismo de negócios  e eventos é um setor da economia que experimentou uma extraordinária  expansão na última década. Dados de estudos acadêmicos sobre o  setor e de agências e associações mostram que eles alavancam as  visitas em vários países, e o Brasil é um deles, trazendo divisas.  Porém, o que se constata é que faltam informações que possam  reforçar esse tipo de turismo, de modo a mitigar os problemas que  são trazidos, como melhorar a infraestrutura dos principais eventos  e pontos turísticos e lidar melhor com a sazonalidade. 
 Segundo dados da  International Congress and Convention Association (ICCA), em 2003, um  total de 62 eventos internacionais foram realizados em 22 cidades do  Brasil; em 2013, esse número saltou para 315, em 54 cidades. Em 2014,  ano de Copa do Mundo, o número foi um pouco menor: 291, ainda assim  foi o décimo país em total de encontros, o primeiro sendo os EUA,  com 831.  
Pelos dados do Ministério  do Turismo, o gasto médio diário de turistas em  viagem a negócios em 2013 era de US$ 102,18, cerca de 50% a mais do  que o gasto médio diário de turistas de lazer. Em 2014,  foi de US$ 127, quase o dobro do gasto dos turistas de lazer. Já no  levantamento “Impactos Econômicos dos Eventos Internacionais  Realizados no Brasil” da Fundação Getúlio Vargas (FGV), para a  Embratur de 2014,  a diferença é ainda maior: US$ 329,39 de gasto diário médio dos  turistas de negócios e eventos contra US$ 73,77 do turista em viagem  de lazer. Na mesma pesquisa em 2007/8,  o valor de gasto diário médio do turista de negócio foi de US$  285,10. 
Outro estudo que traz  dados do setor, do Ministério do Turismo – Estudo  da Demanda Turística Internacional – aponta que  25,6% dos estrangeiros que vieram ao Brasil em 2013 eram turistas de  negócios (em 2007 eram 27,4%), desses, 48,3% na cidade de São Paulo  e 23,9% na do Rio de Janeiro. Negócios são o segundo motivo mais  citado pelos estrangeiros para a visita ao país, sendo o primeiro, o  lazer. 
A despeito desse vigor  econômico, o turismo de negócios como tema de pesquisas acadêmicas  no Brasil parece bastante incipiente. Uma busca na base bibliográfica  da SciELO não retorna nenhum resultado com o uso do termo “turismo de  negócios” ou “business tourism” no campo de título ou de  assunto contra 79 artigos com “turismo” no título (72 “tourism”)  e 112 no assunto (123 “tourism”). Na base da Red de Revistas  Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal, Redalyc,  apenas 8 resultados (em português e espanhol) são encontrados na  busca por “turismo de negócios” no campo de título do artigo e  7 no campo de palavras-chave. 
“Acredito que a falta  de produção a respeito do assunto esteja mais relacionada à  dificuldade de obtenção de dados junto a empresários do que uma  falta de interesse pelo assunto”, diz a administradora e doutora em  engenharia de produção, Deborah Moraes Zouain, da Escola Brasileira  de Administração Pública e de Empresas da FGV. Atual editora da  Revista Acadêmica Observatório de Inovação do Turismo da  Ebape/FGV, ela complementa: “De forma geral, os empresários estão  com o tempo cada vez mais escasso e o acesso a eles para coleta de  dados primários se torna cada vez mais difícil e burocrático, o  que leva o pesquisador a buscar fontes secundárias ou optar por  outra temática de estudo”. 
A turismóloga e  doutora em ciências da comunicação, Debora Cordeiro Braga, da  Escola de Comunicação e Artes da USP, destaca o número  relativamente reduzido de pesquisadores: “O tema é estudado por  alguns pesquisadores de São Paulo, Fortaleza, Salvador e Natal, mas  são poucos os artigos publicados”. 
Essa falta de pesquisas  pode ser um problema. Apesar da importância econômica do turismo de  negócios em São Paulo, “o poder público não dá a devida  importância para esse segmento, que também demanda transporte  público, utiliza restaurantes, frequenta casas de show e faz  compras”, diz Braga. E continua: “O congestionamento na região  dos grandes espaços de exposição e nos hotéis em épocas de  eventos corporativos afeta a todos, assim, políticas públicas são  necessárias. As pesquisas podem, e devem, ser as referências para  convencer empresários e poder público sobre as necessidades e  especificidades desse segmento.” 
Um nome, múltiplos  significados 
Nessa escassa  literatura e nos diversos relatórios de órgãos e empresas de  turismo é possível notar uma grande variação no entendimento do  que exatamente seja o turismo de negócios. Para alguns teóricos, a  viagem a negócios nem sequer se constitui em turismo por não ter o  lazer como objetivo primordial. 
Para a Organização  Mundial do Turismo (OMT), um evento (meeting) é  uma reunião com, no mínimo, 10 pessoas durante pelo menos 4 horas  em um espaço alugado. Esses encontros podem se chamar convenções,  conferências, congressos, feiras comerciais, exposições,  incentivos, encontros empresariais e de negócios. A inclusão de  viagens a negócios como atividade turística pelo órgão foi  baseada mais no uso e na demanda sobre bens e serviços turísticos  do que pela natureza e razões da atividade. A IMEX,  exibição mundial de viagem de incentivo, encontros e eventos, por  sua vez, adota como definição de turismo de negócios: a “provisão  de instalações e serviços para os milhões de delegados que  anualmente participam de encontros, congressos, exibições, eventos  de negócios, viagem de incentivo e hospitalidade corporativa”. 
Zouain esclarece que  “hoje, o Ministério do Turismo denomina turismo de negócios e  eventos aquele grupo pessoas que viaja para reuniões de negócios,  visitas técnicas ou para participar de eventos, convenções,  simpósios, lançamentos, mostras, exposições, feiras, entre  outros”. 
Definição similar é  adotada por Braga: “Turismo de negócios é aquele em que o  deslocamento até o destino é motivado por questões ligadas à  atividade laboral e ao desenvolvimento profissional”. A professora  da USP diz ainda que, pensando nesse sentido, “participar de um  curso de especialização ou de aperfeiçoamento pago pelo próprio  interessado é negócio, no meu entendimento. Ao mesmo tempo uma  viagem para assinar um contrato ou participar de uma reunião com  outras duas pessoas, sem pernoite no local é turismo de negócios,  ficar cinco dias visitando clientes com as despesas pagas pela  empresa é turismo de negócios. Viajar para um evento de premiação  ou comemorativa da área é negócio etc.” 
É possível que essa  variação nas definições explique, por exemplo, as diferenças dos  valores estimados dos gastos dos turistas de negócios de um estudo  para outro. 
Nem tudo são flores 
Os impactos positivos  são muito evidenciados especialmente nos relatórios de órgãos e  empresas ligadas ao turismo. 
Do relatório de  “Impactos Econômicos” da FGV de 2007/8 podemos destacar o trecho  na página 8: “A realização de eventos, quando planejada  adequadamente, propicia a demanda de produtos e serviços de diversos  segmentos da economia, desenvolvimento da infraestrutura, geração  de receitas e de mão de obra direta e indireta, preservação do  patrimônio natural e cultural, além da troca de experiências entre  turistas e a população local”. 
Na região  metropolitana de Campinas, interior do estado de São Paulo,  caracterizada por um grande número de empresas, parques  tecnológicos, universidades e institutos de pesquisa, segundo  reportagem do jornal Correio  Popular de 28 de outubro de 2013, o turismo de  negócios movimenta cerca de R$ 1 bilhão ao ano; correspondendo a  90% dos turistas (nacionais e internacionais) que visitam as cidades  que compõem a região. 
Em São Paulo, de  acordo com os dados do Observatório  de Turismo e Eventos da SPTuris, empresa municipal de  turismo e eventos, para 2014 eram esperados 8 milhões de turistas de  negócios e 3 milhões de turistas de eventos, gerando R$ 9 bilhões  em receitas, ou 80% do total de receitas em turismo na cidade. 
Os resultados do estudo  de “Impactos Econômicos” da FGV de 2014 indicam que para 42,1%  dos turistas de negócios a imagem em relação à cidade sede do  evento melhorou, sendo que 3 em 4 dos entrevistados indicaram uma  avaliação positiva. 
 Das 19 cidades entre os principais destinos de turismo de negócios,  12 são das regiões Sudeste e Sul; 4 do Nordeste e 2 do Norte; além  de Brasília. Mas, como alerta Zouain, considerar que haja apenas  impactos positivos é uma visão um tanto míope. Sobre os problemas  ocasionados pelo turismo de negócios, Braga aponta os que considera  mais importantes: “Os impactos socioculturais estão ligados à  prostituição e uso conjunto de mobiliário urbano que não é  pensado para um fluxo turístico contínuo e em volume considerável”.  
Outra desvantagem  mencionada por Zouain é o alheamento do turista de negócios em  relação à cultura local em comparação com o turista de lazer.  “De forma geral, esse turista viaja para o destino para participar  de uma atividade empresarial ou um evento e todo o seu tempo e  recurso fica nesta localidade; é como se ele estivesse em uma bolha  e sua relação com a comunidade local, cultura e o ambiente como um  todo fosse quase nula”, diz. Não é um alheamento total, no  entanto. Em “Impactos Econômicos” de 2014, cerca de um terço  dos respondentes pretendiam permanecer no país por mais dias do que  a duração do evento e quase 8% do gasto diário médio era dedicado  à cultura e lazer. No relatório de 2007/8, aproximadamente dois  terços dentre os que pretendiam ficar mais tempo indicaram como  motivo o lazer; dentre os mais de 90% que pretendiam retornar ao  país, três quartos o fariam para lazer. 
A  concentração do setor turístico na área de negócios e eventos  também traz riscos. De um lado os investimentos voltados  especialmente para a área ajudam a fortalecer a cadeia de bens e  serviços. “No entanto, evidencia-se esse risco relacionado à  sazonalidade e ao ambiente macro econômico como um todo, dependendo  do destino os impactos podem ser de mercados regionais, nacionais ou  até mesmo internacionais”, pondera Zouain. “Para tanto, devem  ser pensadas estratégias de se mitigar esses riscos e potencializar  os benefícios para o local”, conclui. 
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