No fim de janeiro teve início a consulta  pública sobre o anteprojeto de lei para a proteção de dados pessoais, promovida  pelo Ministério da Justiça. A finalidade é regular o uso dos dados pessoais por  empresas, Estado e organizações, garantindo segurança, limites de uso e o  controle do cidadão sobre como suas informações são usadas. Ao todo, são 52  artigos distribuídos em nove capítulos, sobre os quais é possível opinar no portal da consulta pública  até 30 de abril.
 Uma lei sobre proteção de dados é urgente, de  acordo com Vinicius Wagner Oliveira Santos, doutorando em Política Científica e  Tecnológica na Unicamp e membro da Rede Lavits: “vivemos em uma  sociedade da informação, em que grande parte de nossas  vidas é vinculada, atrelada e operacionalizada pelo digital, com práticas  intensas de coleta e tratamento de informações sobre os indivíduos”. O  pesquisador também relaciona alguns pontos-chave que devem trazer discussões,  como as definições sobre dados e a questão do consentimento de uso. 
 No anteprojeto de lei, dado pessoal é  definido como “dado relacionado à pessoa natural identificada ou identificável,  inclusive a partir de números identificativos, dados locacionais ou  identificadores eletrônicos”. As referências mais imediatas são nome, endereço,  documento de identidade e CPF, no entanto, existem diversas informações que  também permitem a identificação, como o endereço IP, número do celular ou mesmo  uma foto. Além disso, a proposta também traz definições sobre dados sensíveis,  aqueles que permitem identificar características pessoais como religião,  opinião política e vida sexual, e sobre dados anônimos, a partir dos quais não  é possível identificar uma pessoa. 
 Com o crescimento da internet, esses dados  são facilmente coletados, seja por meio do preenchimento de um cadastro para um  site de compras online ou em redes sociais. Empresas como Google e Facebook  lucram a partir do tratamento dos dados coletados, que lhes permite vender  publicidade direcionada. Nesse ponto, são relevantes as questões sobre dados  sensíveis, consentimento de uso e tratamento (que são as ações referentes à  coleta, armazenamento, processamento e distribuição a terceiros, entre outras).  “Por exemplo, o que ficar estabelecido em lei sobre a questão do consentimento  terá impacto direto na forma como grandes empresas provedoras de  conteúdo/serviços formulam e põem em prática os famigerados ‘termos e condições  de uso’. Eles são altamente abusivos do ponto de vista do usuário, sendo que,  em diversos casos, é como se assinássemos um cheque em branco para as empresas  usarem nossos dados da maneira que bem entenderem”, explica Santos. 
 Empresas que, de alguma forma, lucram com o  tratamento de dados pessoais coletados no Brasil estarão sujeitas a essa lei –  mesmo as gigantes internacionais como o Google. Além disso, os dados pessoais  também fazem parte do chamado big data, que é a análise de um grande  volume de dados para encontrar informações úteis a uma empresa ou negócio. Com  o crescimento desse setor, que é impulsionado pelo aumento do uso de smartphones  e, futuramente, pela Internet das Coisas, torna-se ainda mais relevante a  existência de uma lei que proteja os indivíduos e estabeleça limites para a  exploração econômica de suas informações pessoais.  
 Por ser um tema relevante ao mercado,  provavelmente existirão pressões econômicas em torno da aprovação da lei, como  aconteceu e continua acontecendo com o Marco Civil da Internet. Segundo um  relatório publicado pelo International Data Corporation (IDC), o mercado que  envolve a análise de dados deve movimentar 125 bilhões de dólares no mundo todo  em 2015. 
 Diante dos interesses econômicos envolvidos,  a participação popular é fundamental para garantir a criação de uma lei capaz  de oferecer proteção plena aos dados pessoais. A discussão do anteprojeto é  apenas a etapa inicial do processo, que ainda passará pela aprovação no  legislativo e posterior regulamentação. “A mobilização popular é sempre  importante nesses momentos, mas ela não pode parar nesta etapa, necessita  continuar até o fim, como foi e continua sendo com o Marco Civil da Internet”,  pondera Santos. 
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