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Falta de conhecimento sobre
fauna marinha preocupa pesquisadores

A escassez de pesquisas sobre espécies marinhas no Brasil pode custar caro ao meio ambiente. Especialistas no estudo dos peixes (ictiologistas) estão preocupados com a sobrevivência de animais ainda desconhecidos, que habitam as águas brasileiras e adjacências. Como ainda não há um levantamento detalhado sobre a fauna oceânica local, muitas espécies estão ameaçadas, entre elas uma quimera recém-descoberta no Brasil.

As quimeras pertencem ao grupo das raias e dos tubarões. Habitam a região do talude continental, área oceânica a cerca de 200 km do litoral, numa profundidade de 450 a 700 metros. Nesse ambiente, onde não há luz e as temperaturas são muito baixas, os animais são geralmente primitivos e sensíveis a alterações. Além disso, seus metabolismos e ciclos reprodutivos são bastante lentos, quando comparados aos das espécies que vivem próximas à superfície.

"O ciclo reprodutivo das quimeras ainda é desconhecido. Mas sabe-se que, entre um período de procriação e outro, passam-se pelo menos dois anos. Isso para gerar apenas um ovo", explica o biogeógrafo Jules Soto, coordenador do Museu Oceanográfico da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina. Soto identificou e descreveu a nova espécie de quimera descoberta, batizada de Hydrolagus matallanasi, junto com o pesquisador Carolus Vooren, da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (Furg). O nome é uma homenagem ao ictiólogo espanhol Jesús Matallanas, da Universidade Autônoma de Barcelona.

Pesca indiscriminada
A pesca indiscriminada pode afetar o equilíbrio da fauna em todas as regiões oceânicas, inclusive nas mais profundas. A própria Hydrolagus matallanasi foi descoberta por um barco de pesca comercial, em 2001. A embarcação pertencia a uma frota espanhola que pescava perto das águas brasileiras, com autorização do governo. Felizmente, permissões desse tipo estão condicionadas à presença de observadores brasileiros a bordo. Foi assim que o primeiro exemplar chegou às mãos de Soto e Vooren.

"O Brasil está explorando regiões ainda desconhecidas. Isso pode destruir o habitat de espécies que só existem ali. Os ambientes de alta profundidade são tão ou mais vulneráveis que os recifes de corais, que são protegidos por lei. Habitantes dessas regiões são muito sensíveis, qualquer interferência é desastrosa para eles", alerta Soto. "É preciso pesquisar muito antes de se permitir a pesca nesses lugares. Hoje, no Brasil, os pescadores pescam onde bem entendem. O aumento da produção pesqueira sem controle tem um preço alto, que vamos pagar no futuro", completa.

Para tentar reverter o quadro, o Brasil iniciou, em 1997, o Programa de Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva (Revizee). O objetivo é propor formas de exploração que não ameacem a sobrevivência das espécies que vivem na zona econômica exclusiva, área que se estende desde o limite exterior do mar territorial (que tem 22,2 km de largura) até 370 km da costa, no caso do Brasil. Mas segundo o pesquisador da Univali, apesar da iniciativa louvável, o país ainda não teve tempo suficiente para garantir a preservação desses animais.

Elo perdido
Mesmo com sua grande biodiversidade marinha, o Brasil ainda não tem tradição na pesquisa de animais de águas profundas. Segundo o pesquisador Adriano Lima, do Museu Nacional, no Rio de Janeiro (RJ), o único navio oceânico em funcionamento dedicado a esse tipo de investigação é o Atlântico Sul, que pertence à Furg. A embarcação, entretanto, opera com dificuldades.

"Temos poucas coleções para análise de material e comparação de exemplares no país. Nunca tivemos grandes expedições em águas profundas. É um estudo que requer muito trabalho, são necessários cabos e redes especiais, maior espaço no convés e uma série de aparatos, além de uma tripulação capacitada. Para cada mil metros de profundidade, são necessários 5 mil metros de cabos de aço", comenta Lima.

Por todas as dificuldades, a descoberta de Soto e Vooren adquiriu um brilho especial. Em primeiro lugar, por ser a primeira espécie descrita inicialmente no Atlântico Sul. Os pesquisadores acreditam, inclusive, que ela seja endêmica. Em segundo lugar, por sua importância histórica. A quimera tem ancestrais de 350 milhões de anos e, nos últimos 150 milhões de anos, evoluiu muito pouco.

No processo de revisão do trabalho de descrição, a pesquisadora Dominique Didier, da Academia de Ciências da Filadélfia, dos EUA, definiu a quimera como o elo que faltava na cadeia evolutiva do grupo. Até então, as espécies conhecidas tinham em média 80 cm de comprimento, bem mais que aquelas encontradas em fósseis. A Hydrolagus matallanasi é menor, com cerca de 40 cm, e portanto, mais semelhante aos seus antepassados.

Quimera da espécie Hydrolagus matallanasi descoberta no Brasil
Quimera da espécie Hydrolagus matallanasi descoberta no Brasil

Desde 2001, já foram coletados 21 espécimes da nova quimera. O peixe foi comparado a outras espécies até que ficasse comprovado seu ineditismo. No mês que vem, será publicado um artigo descrevendo o animal na revista científica Zootaxa, da Nova Zelândia.

As quimeras

As quimeras são peixes cartilaginosos, pertencentes à classe dos condrictes. Distinguem-se dos tubarões e das arraias, que pertencem à mesma classe, por apresentarem apenas uma fenda branquial (tubarões e arrais têm pelo menos cinco). São ovíparas, não apresentam escamas e possuem calda e um espinho venenoso no dorso. As terminações nervosas são expostas e funcionam como sensores, para detectar predadores e presas, e como meio de comunicação com outras quimeras.

 

Atualizado em 22/06/04
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