REVISTA ELETRÔNICA DE JORNALISMO CIENTÍFICO


Editorial
Inovar para quê?
Por Carlos Vogt
10/07/2013

O Brasil sabe que precisa inovar e que a inovação é o princípio-chave da capacidade de desenvolvimento e competitividade que precisa adquirir para sair do estado de medianidade a que sua economia chegou e no qual estacionou há uns bons anos.

Como foi dito aqui mesmo na ComCiência, nº 148, de 10 de maio de 2013, para sair do estágio de renda média em que se encontra e passar para a situação de renda alta, que se almeja, o país não pode deixar de fazer a lição aplicada de transformações indispensáveis na educação, nas comunicações físicas, logísticas e virtuais, nos sistemas de tributação, na sua cultura política e administrativa.

Hoje o país é refém de si mesmo: por dentro emperra, por fora vive emperrado.

Talvez a melhor imagem desse emperramento nacional seja dada, na prática e simbolicamente, pelos grandes congestionamentos de caminhões, carregados de grãos da super safra nacional, que engasgam nos gargalos dos portos que não conseguem dar escoamento adequado à maior fonte de riqueza na composição do nosso produto interno bruto. Sem contar que os preços praticados para os mecanismos e as operações de exportação criam mais entraves e dificuldades para somarem-se às tantas outras que palmilham os caminhos desses produtos até o destino de seu desembarque.

Tudo é atravancado, difícil e moroso e, mesmo quando as leis e os incentivos oficiais parecem anunciar aberturas de presteza e agilidade, os resultados acabam em pequenas frestas de luz e em cascatas de burocracia.

Recentemente, a indústria brasileira, através de suas entidades organizacionais, depois de inúmeras constatações de desempenho pífio da economia, chamou a atenção do governo para o isolamento do país em relação às iniciativas de constituição de novos mercados internacionais e para os efeitos constrangedores na economia produzidos pela falta de ações efetivas do país no estabelecimento de acordos bilaterais de comércio sem as amarras e impedimentos a que nos obriga o Mercosul.

Aqui também é preciso inovar, e com urgência, assim como é urgente fazê-lo no plano geral de gestão do público, do privado e de suas relações para a eficiência e a eficácia das políticas públicas voltadas ao desenvolvimento do país.

Qualquer que sejam os indicadores adotados para dar a posição relativa do Brasil quanto ao seu desempenho em inovação tecnológica, o resultado tem sido sempre ruim, como o que se verifica no ranking da escola de negócios IMD Foundation Board (World Competitiveness Yearbook) em que o país aparece, em 2012, em 46º lugar, atrás de Hong Kong, Japão, EUA, Alemanha, Suíça, Cingapura, Coreia do Sul, Suécia, França, mas também de China, Chile, Índia, México, Peru, Malásia, Irlanda, Austrália, Itália, Espanha.

Bom não está, mas pode ficar pior, se não houver uma mudança radical na cultura das relações das forças produtivas da riqueza e do conhecimento em relação ao papel fundamental que a tecnologia e a inovação desempenham no mundo contemporâneo e na competitividade e sucesso das nações nos mercados internacionais e na economia global.

Nosso aparato legal para a inovação é já poderoso. É preciso fazê-lo funcionar, levando as empresas a assumirem a liderança que lhes cabe nas dinâmicas inovadoras de processos e produtos e na produção de conhecimento aplicado e aplicável à pesquisa e desenvolvimento, de modo a rompermos os limites do imediatismo da simples reprodução industrial e da voracidade reprodutiva do capital e do lucro.

Inovar é condição para crescer em lucro e riqueza, mas é também, paradoxalmente, a quebra do ritmo da mesmice do círculo, ou do quadrado produção, produto, reprodução, consumo que pode constituir a ilusão – que, no caso, é nossa –, de que o país encontrou o caminho da felicidade social semeada e distribuída pelas políticas assistencialistas que se resultam no bem-estar imediato das populações favorecidas, correm, contudo, o risco de não terem fôlego para permanecerem ativas a longo prazo.

O dispêndio de P&D no país é, pelos dados do IBGE, de 2010, de apenas 1,16% do PIB nacional. Nesse ano, em termos absolutos, o país investiu R$ 43,7 bilhões, dos quais 53% vieram de recursos públicos federais (37%) e estaduais (16%), e 47% de fontes empresariais.

O número de patentes concedidas pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI, para residentes, ao longo da última década, nunca chegou a mil por ano, sendo que, em 2011, foram concedidas 725 patentes para residentes e 3.076 para não-residentes.

O percentual de empresas que implementam inovações de produto é de 23.7% e, de processo, 32.1%, sendo que, em 2008, a taxa de inovação na indústria era de 38.1% e, em serviços, 46.5%.

Os números não são bons quando comparados com os indicadores de países que têm posição de real destaque, em tecnologia e inovação no cenário mundial. E prometem piorar, quando se considera a inovação tecnológica no país, não do ponto de vista incremental, mas do ponto de vista da efetiva invenção do novo para a criação de novos produtos, processos e serviços para o mercado global.

Faltaria ao Brasil traços de cultura técnica e científica cuja ausência explicaria a nossa falta de apetite para a inovação?

Que traços, então, seriam esses? A inovação depende, de um lado, da cultura tecnológica, propriamente dita, do país, e, de outro, da cultura para a tecnologia, que cria as condições gerais de propensão para inovar.

São esses os dois traços que caracterizam a, cultura tecnocientífica de um país: a capacidade estrutural para inovar e a propensão cultural para a inovação.

Não há dúvida de que o Brasil tem propensão e lhe falta capacidade nas estruturas de gestão e de adoção de modelos adequados ao desenvolvimento baseado na competitividade, de produtos, processos e serviços, para além do consumo doméstico.

Tanto o país tem propensão para inovar que estão aí para prová-lo os casos da Embraer e do agronegócio.

Falta-nos, de verdade, uma concepção ousada, nova, refundadora da nossa ambição no mundo e de nosso papel para nós próprios diante dos desafios de bem-estar social e cultural de nossa população.

Propensão não falta. Falta, contudo, a gestão que a transforme de força em tendência e de tendência em condição estrutural para a realização do novo. Falta uma gestão inovadora para o país.