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Carlos Bloch

CGEN quer criminalizar a biopirataria
Cristina Maria do Amaral Azevedo

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CGEN quer criminalizar a biopirataria

 

O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético reconhece que a Medida Provisória que regulamenta a legislação atual não permite que se estabeleça sanções penais que impeçam a exploração econômica não autorizada do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado. Uma das atribuições do CGEN é buscar tipificar essa atividade como crime. Esta é uma das questões tratadas na entrevista de Cristina Maria do Amaral Azevedo, coordenadora técnica do Departamento do Patrimônio Genético, que exerce a função de Secretaria Executiva do CGEN, mestre em Ciência Ambiental e que coordenou, de 1997 a 2002, o Grupo de Trabalho sobre Acesso a Recursos Genéticos da Secretaria do Meio Ambiente do estado de São Paulo. Esse grupo propôs um Projeto de Lei estadual sobre a matéria.

ComCiência - Quais serão as novas atribuições do CGEN no que se refere à proteção do patrimônio genético e conhecimento tradicional brasileiro? Existem propostas de mudanças no que diz respeito ao acesso e remessa para o exterior?
Cristina Maria do Amaral Azevedo -
As atribuições do CGEN, de caráter deliberativo e normativo, foram estabelecidas pela Medida provisória 2.186-16/2001. O Ministério do Meio Ambiente considera que é importante que a Medida Provisória continue em vigor até que seja finalizado o processo legislativo - há 3 Projetos de Lei (PL): o PL 4842/98 (substitutivo do senador Osmar Dias sobre o PL da então senadora Marina Silva), o PL 4579/98 (do então deputado Jaques Wagner) e o PL 1953/99 (do deputado Silas Câmara). A fim de otimizar, agilizar e simplificar a emissão de autorizações para coletas e remessas de material biológico, o CGEN solicitou à sua secretaria executiva que estabeleça juntamente com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o CNPq e o Ibama, uma proposta para criação de um sistema integrado de gestão do patrimônio genético.

ComCiência - A nova configuração do CGEN propiciará uma participação efetiva dos diversos segmentos nas decisões do Conselho? A ausência de representantes da sociedade civil no CGEN compromete o princípio de abrir espaços para os diversos segmentos participarem das decisões?
Azevedo -
Foram convidadas instituições representantes do setor acadêmico, setor privado, ONGs ambientalistas, comunidades locais (de remanescentes de quilombos, agricultura familiar, extrativistas), povos indígenas e estados. O Ministério Público também foi convidado. Todas as instituições contatadas encararam o convite como um sinal bastante positivo da atual gestão do Ministério do Meio Ambiente para que caminhemos na direção do estabelecimento de normas que atendam aos anseios dos vários setores. Porém, até que seja finalizado o processo legislativo, os convidados permanentes terão direito a voz, mas ainda não terão direito a voto, pois a MP estabelece que o Conselho será constituído apenas por órgãos e entidades da administração pública federal. Após abrir o CGEN à participação da sociedade, o Ministério do Meio Ambiente propôs a criação de uma Câmara Temática com a participação paritária da sociedade para, em 60 dias, propor os pontos básicos do que deve ser a Lei de Acesso aos recursos genéticos, repartição de benefícios e proteção dos conhecimentos tradicionais no Brasil. Os trabalhos desta Câmara Temática já foram iniciados e têm se baseado nos PLs existentes, além da MP.

ComCiência - Como o Conselho pretende combater a biopirataria?
Azevedo -
O CGEN reconhece que, por conta da característica da legislação atual -uma Medida Provisória - esta não pode estabelecer sanções penais e portanto não pode tipificar como crime a exploração econômica não autorizada do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado. Neste sentido, o Executivo Federal, ainda na gestão passada, encaminhou o PL 7211/2002 propondo emenda à Lei de Crimes Ambientais. Atualmente, o Departamento de Patrimônio Genético do MMA, que exerce a função de Secretaria Executiva do CGEN, tem acompanhado a tramitação deste PL no Congresso, a fim de garantir uma interface adequada com a legislação atual e a coerção das ações que impedem o Estado de implementar a repartição justa e eqüitativa dos benefícios provenientes da exploração econômica do patrimônio genético e dos conhecimentos tradicionais associados.

É necessário não perder a dimensão mais importante do tema, qual seja, garantir que a ação lesiva seja coibida de maneira adequada. E, para isso, o Brasil também está atuando internacionalmente, juntamente com os outros países megabiodiversos, buscando junto à Organização Mundial do Comércio garantir que o reconhecimento de direitos de propriedade industrial seja condicionado à indicação de origem do material ou do conhecimento tradicional, da comprovação da obtenção do Consentimento Prévio Informado e da repartição de benefícios.

ComCiência - O conhecimento científico será utilizado para legitimar a proteção ao conhecimento tradicional? Quais as implicações disso? Há perspectivas de que o Conselho discuta mudanças na legislação que levem em consideração a lógica singular de produção e circulação dos conhecimentos tradicionais?
Azevedo -
A proteção dos conhecimentos tradicionais tem sido encarada pelo CGEN como premente e, deste modo, foi instituída - no ano passado - uma Câmara Temática com a finalidade específica de detalhar procedimentos com base na legislação vigente - Medida Provisória. Ao mesmo tempo, a Câmara Temática que está discutindo os pontos básicos para uma nova legislação deverá buscar as adequações necessárias a fim de garantir uma proteção adequada aos detentores desses conhecimentos. É preciso lembrar que alcançar este objetivo é um desafio que tem sido perseguido por vários países e instituições. A Organização Mundial para Propriedade Intelectual, por exemplo, está estudando a possibilidade de propor um regime de proteção sui generis para os conhecimentos tradicionais. O Peru promulgou recentemente uma lei específica para a proteção dos conhecimentos tradicionais, que certamente proporcionará subsídios para as discussões aqui no Brasil. É importante ressaltar que a abertura do CGEN tem permitido a participação de representantes dos setores mais interessados neste assunto particular - os detentores de conhecimentos tradicionais associados. É preciso lembrar também que o Brasil já possui sua Política Nacional de Biodiversidade que possui em seu componente 5 diretrizes para tratar deste tema.

Atualizado em 10/04/03

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