Algoritmos, monolitos

Por Carlos Vogt

Hal e “”Heuristic Algoritmic” são nomes que aparecem nos romances 2001 e 2010, de Arthur C. Clarke, parceiro e inspirador do célebre filme de Stanley Kubrick 2001 – uma odisseia no espaço, de 1968, cujo roteiro produziu em parceria com o diretor e cuja inspiração foi buscada, original e mais diretamente, no seu conto A sentinela, de 1951.

No filme de Kubrick, um monolito aparece três vezes.

A primeira, logo no início, no surgimento da espécie humana, logo dividida entre a violência e a inteligência. O bloco de pedra, compacto em sua eloquência muda, é tocado com cautela pelos hominídeos. Na poesia sonora da valsa Danúbio azul de Johan Strauss II e ao som poético de Also sprach Zarathustra de Richard Strauss, somos lançados às imagens da evolução do homem, segundo um roteiro que tem também a inspiração do filósofo Friedrich Nietzsche.

A segunda vez, o monolito aparece como um artefato misterioso enterrado há quatro amilhões de anos. Da base Clavius, na Lua, sai uma expedição, de que faz parte o dr. Heywood R. Floyd, um dos protagonistas do filme. É o mesmo monolito preto, que agora emite um sinal de rádio muito alto, enquanto os membros da expedição posam para uma fotografia na sua frente.

A terceira vez, na quarta e última parte do filme, agora em Júpiter, Hal 9000 está presente na nave Discovery e comanda a maior parte das operações.

O dr. David Bowman, o dr. Frank Poole e mais três cientistas com hibernação criogênica formam, além de Hal, a tripulação. Hal acaba matando o dr. Poole, assim como os cientistas em hibernação, ao desligar suas funções vitais e é, ele próprio, desligado por Bowman, regredindo a um estágio de programação antiga da memória, cantando a canção Daisy Bell para Bowman.

Bownam irá, então, em seu casulo extraveicular, encontrar um outro monolito, que irá arrastá-lo por um túnel de luzes coloridas adentro, ganhando cada vez mais velocidade, por estranhas paisagens e por passagens estranhas até ver-se envelhecendo e já velho numa cama, ao lado da qual está o monolito que acompanha e comanda a execução do programa em que Bownam, transformado, enfim, num feto, envolto por uma luz transparente, flutua no espaço ao lado da Terra.

Hal 9000 tem uma receita, um algoritmo para ditar os procedimentos a serem seguidos na nau Discovery One. A inteligência humana de Bownam o abate e o faz regredir ao estágio infantil da memória. Bownam, se não é propriamente abatido, sucumbe, contudo, às mutações que os dois monolitos, um na Lua e outro em Júpiter, imprimem, em suas aparições, ao cosmos e a tudo que ele contém e que nele está contido, inclusive à vida humana.

O bloco compacto de pedra é imune à sensibilidade tradicional, mas é sensível à força de seu mistério que é feito de permanência e mudança. O seu peso e a sua imobilidade são a constância da mudança e da leveza do universo que se transforma e renasce sempre igual e diferente no equilíbrio das leis e do acaso dessas transformações.

O monolito é uma caixa de algoritmo que dita o comportamento insólito do ser previsível que está em gestação.