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Esgoto e lixo poluem o mar

A terra possui 71% de sua superfície coberta com água. Desses 71%, o mar é responsável por 97,2%. Dessa forma, é inegável que o mar representa uma parte fundamental da biosfera sendo, também, considerado fonte importante de recursos energéticos, alimentares e minerais, muitos deles renováveis.

Apesar de o homem achar que, por possuir uma área extensa, o mar conta com uma infinita capacidade de prover recursos naturais e absorver todos os resíduos que são nele despejados, isso não é verdadeiro. Cada vez mais, poluentes de diferentes tipos e graus de toxicidade são lançados no meio-ambiente marinho e, conseqüentemente, ocasionam vários tipos de problemas.

A poluição marinha é definida oficialmente pela International Commission for the Exploitation of the Seas (ICES) - Comissão Internacional para a Explotação dos Oceanos como "a introdução pelo homem, direta ou indiretamente, de substâncias ou energias no meio marinho que resultam em efeitos deletérios como prejuízo aos recursos vivos; prejuízo à saúde humana; dificuldade das atividades marítimas, inclusive a pesca; impedimento da utilização da água para os fins adequados e redução das amenidades".

Mônica Costa, professora do Departamento de Oceanografia Química, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), afirma que existe um consenso mundial entre os pesquisadores com relação às prioridades no campo de pesquisa sobre poluição marinha. Essas prioridades são aquelas que apresentam conseqüências imediatas em nível social.

No Brasil, segundo Mônica, existem duas linhas prioritárias de pesquisa que atingem os mais de 8 mil quilômetros de costa. O primeiro e principal é o da contaminação marinha e costeira por esgoto e lixo, cujas conseqüências ambientais e sociais são sentidas de forma instantânea. Além disso, a descarga sedimentar dos rios proveniente do desmatamento e do mau uso do solo, contribuem para o aumento da contaminação das áreas costeiras.

A segunda linha envolve pesquisas sobre contaminação por poluentes químicos, principalmente hidrocarbonetos de petróleo e outros compostos orgânicos persistentes, além, é claro, dos metais pesados. A pesquisadora ressaltou que, no caso dos poluentes químicos, essa contaminação é freqüentemente pontual, uma vez que depende de pontos de exploração e operações com cargas de petróleo e isso não ocorre em toda extensão da costa brasileira.

De acordo com Mônica, cidades como Recife (PE), por exemplo, acabam pagando pela falta de planejamento na ocupação do solo. Metade da população de Recife vive em favelas, muito abaixo da linha da pobreza, e não possui acesso à higiene sanitária. O lixo e o esgoto produzidos nesses locais não segue o destino correto e, conseqüentemente, acarretam uma contaminação costeira e marinha, alterando a vida de quem vive perto do mar e de quem vive dos recursos do mar.

Portanto, recuperar o meio-ambiente costeiro depende essencialmente de uma combinação de esforços que passam por humanizar a vida da população até a aplicação adequada de recursos financeiros para recuperar áreas já muito contaminadas ou degradadas.

Um dos trabalhos de pesquisa que Mônica Costa realiza atualmente é o da diagnose da saúde das praias. A meta é quantificar dois tipos de dados. O primeiro, sobre as diferentes formas de poluição que atingem uma praia obtidos em campo e, o segundo, saber junto à população que freqüenta as praias o que elas consideram ser uma praia limpa e sem contaminação. Essa pesquisa visa gerar subsídios com bases científicas para a implantação de ações gerenciais que garantam tanto a conservação ambiental quanto o uso sustentável das praias pelas pessoas.

Grupos de poluentes
O Dr. Gilberto Fillmann, do Laboratório de Microcontaminantes Orgânicos e Ecotoxicologia Aquática da Furg (Fundação Universitária do Rio Grande) explica que, no Brasil, existem poucos grupos de pesquisas sobre poluição marinha. O professor mencionou que, como existem vários tipos de contaminação do mar, os grupos espalhados pelo Brasil estão na árdua missão de conhecer o problema e propor soluções. Trata-se de um trabalho de pesquisa de longo prazo.

Gilberto informou que existem pesquisas para os seguintes grupos de contaminantes marinhos: os chamados prioritários (nutrientes inorgânicos, metais, hidrocarbonetos de petróleo, organoclorados, organoestanhos, dioxinas e furanos) e os não-prioritários (retardantes de fogo, entre dezenas de outros).

O grupo mais conhecido e especialmente citado acima é o dos nutrientes inorgânicos, que carregam altas dosagens de fosfato e nitrogênio e tem como agente causador os esgotos urbanos despejados no mar, principal origem de microorganismos causadores de doenças como hepatite, por exemplo.

Os metais, originados da descarga elevada de poluentes pelas indústrias têxtil, química, alimentar e de papel e celulose, tornaram-se objetos de pesquisas. Os litorais de Santos, Ubatuba, São Sebastião, Sepetiba (RJ), Paranaguá (PR) e a Bahia de Todos os Santos são locais monitorados e pesquisados por mais de 20 laboratórios, que controlam os níveis de toxicidade das águas.

Outro grupo de contaminantes bastante conhecido é o hidrocarbonetos do petróleo. Como grande parte das jazidas estão em alto mar, a possibilidade de derramamento, a perda no transporte e na queima do petróleo são responsáveis por essa substâncias tóxicas na água do mar. Além disso, o uso diário do petróleo e derivados, como a gasolina, também aporta uma carga significativa deste contaminante.

Um grupo considerado de alta capacidade tóxica é o organoclorados. Essas substâncias estão presentes na composição de praguicidas, inclusive no proibido DDT. Esses organoclorados persistem no ambiente por muitos anos e são remobilizados do solo para o veio aquático e daí seguem rumo ao oceano.

O grupo dos organoestanhos, presentes em tintas de embarcações, tem sido objeto de estudo por um grupo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). O organoestanho também é proibido em praticamente todo o mundo, porém, no Brasil, ainda persiste. Está prevista, para o ano de 2006, a total erradicação desses componentes tóxicos do planeta. Essas substâncias são capazes de afetar os hormônios dos peixes provocando, inclusive, o hermafroditismo, ou seja, a troca de sexo de invertebrados.

As dioxinas e furanos, que pertencem à categoria dos organoclorados, são considerados de alta toxicidade, pois são sub-produtos industriais derivados da produção de praguicidas e plásticos. Fazem parte do grupo denominado POPs (poluentes orgânicos persistentes). Depois de liberados no meio ambiente, não se degradam facilmente. Penetram na cadeia alimentar onde acumulam-se nos tecidos gordurosos dos animais. Os POPs não são solúveis em água e não são metabolizados com facilidade. Ocorre, então, o processo de bioacumulação, que afetam os animais do topo da cadeia alimentar. Nela está incluído o homem. Os POPs são substâncias que causam câncer e afetam o sistema imunológico e cardiovascular. Ainda são encontrados em pequenas quantidades.

Há também o grupo dos chamados Não-prioritários, que englobam polifluorados e polibromados (retardantes de fogo). Pouco se conhece sobre o seu comportamento e toxicidade ambiental. Estão presentes, por exemplo, na composição do plástico que envolve fios de tensão. Segundo o prof. Fillmann, ainda é uma categoria que merece atenção e que muito mais se deve descobrir no decorrer das pesquisas.

Gilberto Fillmann não soube precisar a quantidade exata de laboratórios de pesquisa existentes hoje, no país, que estudam a poluição marinha, porém, afirma que as pesquisas ainda encontram-se em um estágio onde se pode considerar que há, ainda, muito a fazer.

(JB)

 
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Atualizado em 10/03/2003
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