Carlos Vogt – A história do Nudecri

Por Mayra Trinca

Imagem: Renan Garcia/Unicamp

Carlos Vogt é hoje um dos grandes nomes do meio acadêmico, com extensa carreira de pesquisa e gestão em diferentes instituições científicas. 

Na vanguarda, sempre atento a questões de comunicação e linguagem, seja na criação do Observatório da Imprensa ou da revista ComCiência, exemplos de pioneirismo do jornalismo digital no Brasil.

Foi reitor da Unicamp, vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e presidente da Fapesp. Integrou também a implantação da Univesp – Universidade Virtual do Estado de São Paulo.

Não é comum encontrar um núcleo de pesquisa em criatividade. Como surge o Nudecri?

O Nudecri foi formado em 1985, quando José Aristodemo Pinotti estava na reitoria. Ele nasce junto com o programa de núcleos interdisciplinares da Unicamp, e vem antes do Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb) e do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) que compõem o Nudecri hoje. A ideia na época era promover atividades multidisciplinares que envolvessem processos criativos. Começou com dois programas principais, o Aquarelas do Brasil, que trazia artistas de música popular brasileira para se apresentarem no campus, e o Artista Residente, para aproximar artistas e escritores da rotina da universidade. Com o tempo, o núcleo vai se tornando mais acadêmico.

O programa de residência é o mesmo realizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IdEA) ainda hoje?

É e não é. Conforme o Núcleo foi se voltando para outras atividades, o programa acabou sendo deixado de lado. Em 2017, quando o Marcelo Knobel estava na reitoria, e com a consolidação do IdEA, pensamos que era a oportunidade para trazer o programa de volta, uma forma de manter vivo o projeto que foi tão importante na história da Unicamp. E quisemos homenagear a primeira artista residente, que foi a Hilda Hilst, em 1985. Por isso hoje temos o Programa “Hilda Hilst” do Artista Residente. Derivado dele surgiu também o  Programa “Cesar Lattes” do Cientista Residente, em homenagem a esse grande cientista brasileiro.

Em que momento aparecem os laboratórios?

O Labeurb veio primeiro. Quando eu estava na reitoria, no começo da década de 1990, o Eduardo Guimarães me procurou com a ideia de um laboratório de estudos do urbano. O projeto foi inspirado na residência artística de Joan Villà, que tinha um projeto de construção de moradias populares e que originou a Casa do Lago, a moradia estudantil da Unicamp e mesmo algumas construções que hoje fazem parte do Labeurb. Eduardo e Eni Orlandi eram da linguística, assim como eu, e a partir daí tiveram a ideia de fazer um projeto que estudasse a cidade a partir da linguagem.

O Labjor foi formado depois, então? Como ele entra na história?

Em 1993, o Alberto Dines estava em Portugal, pesquisando para o livro Vínculos de fogo, e despertou uma vontade de criar algum curso que aproximasse o jornalismo da universidade. Eu estava na reitoria na época e aproveitei uma viagem para me encontrar com ele. Dessa conversa começou a surgir o que viria a ser o Observatório da Imprensa. De volta ao Brasil, conversei com José Marques de Melo, da USP e, juntos, nós três organizamos um evento, que depois virou livro, chamado A imprensa em questão. Desse encontro elaboramos a ideia de um projeto inspirado no modelo americano, que vê o jornalismo como uma especialização de outras áreas de formação. O estudante se forma em física, química, literatura, ciências sociais, linguística, enfim, nas diferentes áreas do conhecimento e aí vai se dedicar à questão da divulgação e do jornalismo científico. Daí surge o Labjor.

Isso tem tudo a ver com os primeiros cursos oferecidos pelo Nudecri, que sempre teve uma forte ligação com o jornalismo especializado?

O primeiro curso oferecido foi de jornalismo esportivo, mas que teve uma única edição. Depois, em 1997, conseguimos um financiamento Pronex (Programa de Apoio aos Núcleos de Excelência) de mais de R$ 1 milhão. Com ele, Labjor e Labeurb se unem na criação de um curso de pós-graduação latu sensu em jornalismo e divulgação científica. Assim, conseguimos chamar vários profissionais da área para darem aula na primeira turma, em 1999. Depois, os alunos foram ficando e dando corpo a uma equipe permanente.

De tantas opções de especialização, por que decidiram ir para a ciência?

Nós precisávamos, digamos, nos reinventar, procurar um nicho de atuação. Conversei com Eduardo Guimarães e discutimos essa ideia da divulgação e do jornalismo científico. Nós propusemos o curso de especialização e a criação da revista ComCiência. A revista foi pensada como um laboratório para o exercício efetivo da produção de texto. É uma revista pioneira porque possibilita a atuação profissional dos nossos alunos ao mesmo tempo que é uma revista de divulgação.

Falando em pioneirismo, os cursos do Nudecri se destacam nesse sentido. Houve a especialização, o primeiro curso stricto sensu em divulgação científica do país, que é o mestrado, e agora em 2026 começa a primeira turma do doutorado, primeiro e único do Estado de São Paulo. Como você avalia a trajetória do núcleo nesses anos?

É uma história de realizações que foram criando uma referência. O laboratório foi pioneiro nas iniciativas de desenvolvimento da divulgação científica e do jornalismo científico, especialmente na formação de profissionais nessas áreas. Dessa forma, contribuindo de maneira bastante significativa para o desenvolvimento institucional da cultura científica, que envolve todas essas atividades.