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Reforma universitária e educação superior

Ana Lúcia A. Gazzola

Os debates em torno da reforma universitária, definida, em janeiro de 2004, como uma das prioridades do Ministério da Educação, estão ganhando a abrangência e a densidade adequadas a uma questão cuja relevância é insuspeita. Setores diversos da sociedade têm apresentado, em fóruns distintos, contribuições para que a proposta final venha a promover o salto de qualidade que todos desejam. Estão em causa os princípios mais gerais da Reforma, seus objetivos e as medidas nela sugeridas. Em particular, os atuais dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), herdeiros e co-protagonistas dessa discussão, vêm dedicando particular atenção a essa temática, como atesta o documento Reforma Universitária: proposta da Andifes para a reestruturação da Educação Superior no Brasil. A complexidade própria da educação superior, a vitalidade duramente construída do parque universitário nacional, os patamares muito exíguos das matrículas no ensino superior, em especial no ensino superior público, a dificuldade de contar com políticas de médio e longo prazo, o crescimento desordenado do sistema privado, atestam, entre outros fatores, a amplitude dos problemas em jogo. Estamos, certamente, diante de uma oportunidade para a efetivação de mudanças de porte, que incidam sobre a educação superior como um todo e que, mais especificamente, viabilizem as condições para o fortalecimento duradouro das instituições públicas de ensino superior. Por outro lado, é de se esperar que sejam propostas novas formas de interação entre a universidade e a sociedade, respeitadas, simultaneamente, a identidade das instituições de ensino e as demandas sociais.

Julgamos, à vista disso, que se torna necessário trazer alguns pontos de alcance mais abrangente para a discussão, acerca dos quais a proposta de Reforma ora em debate deverá se pronunciar com clareza.

É preciso reafirmar a educação superior como uma política de Estado, protegida contra a volatilidade dos governos e abrigada em medidas de longo prazo. Compreendida como política de Estado, pensada de forma associada a outras políticas de longo prazo, a educação superior estará sendo considerada bem público inegociável e componente decisivo do planejamento nacional. A desatenção à educação superior, solo majoritário do desenvolvimento científico, tecnológico e cultural, teria como conseqüência inevitável sobre as nações a renúncia à soberania. Por outro lado, devemos pensar a educação superior no país como um sistema nacional, com as instituições públicas atuando como referência, que possibilite tratar, de forma orgânica e integrada, a diversidade de tipos e perfis institucionais situados nesse nível de ensino e que busque fazer com que este atinja padrões de qualidade sempre mais avançados e atue de acordo com o interesse público. Garantir, através de marcos reguladores, a qualidade do sistema diante da expansão vertiginosa da iniciativa no campo da educação superior, zelar por sua distribuição mais homogênea no território nacional e garantir um tratamento mais eqüitativo às áreas do conhecimento são desafios cujo enfrentamento não pode mais ser adiado.

No domínio do sistema público de educação superior, a viabilização desses dois princípios básicos, responsáveis pelo horizonte mais amplo a partir do qual a educação superior no país deve ser pensada, depende da adoção de medidas adicionais. Princípios e medidas, vistos de forma integrada, certamente darão lugar a um novo cenário da educação superior brasileira, seja pública seja privada. Tais medidas, igualmente imprescindíveis, dizem respeito à implementação da autonomia, à definição das formas de financiamento e à implantação de uma política adequada de recursos humanos. A idéia de autonomia, matéria constitucional, não diz respeito somente a uma tomada de decisão no plano financeiro e jurídico. Trata-se de um processo que, além de disposição política, envolve redefinições conceituais e operacionais de grande envergadura, que incidirão, inclusive, sobre o plano da gestão acadêmica e institucional. Tão decisivo quanto a questão da autonomia é o problema do financiamento. Ao longo da última década, a destinação de recursos públicos às Ifes sofreu uma drástica redução, cujas conseqüências perversas no cotidiano dessas instituições é cada vez mais visível. A definição das formas de financiamento e a reafirmação do compromisso inequívoco do Estado com a educação superior pública propiciarão a inversão dessa tendência histórica e o estabelecimento de um investimento, planejado e contínuo, na modernização e no crescimento da educação pública. A isto some-se o difícil problema dos recursos humanos. Anteriormente a quaisquer medidas relativas à implementação de uma política adequada de recursos humanos, será preciso constituir e dar provimento a um detalhado mapa da reposição da força de trabalho perdida pelas Ifes sobretudo a partir dos anos 90. Juntamente com essa reposição, torna-se necessária a elaboração de planos únicos de carreira, para docentes e servidores técnicos e administrativos, condizentes com as condições atuais das instituições universitárias. A complexidade das novas tarefas decorrentes da modernização das instituições, a diversificação das funções e o ajustamento da remuneração à qualificação devem, entre outros fatores, encontrar um lugar nas diretrizes constitutivas dos planos de carreira.

Não é difícil ver o grau de complexidade das questões associadas à educação superior no Brasil. De sua resolução, entretanto, depende, em boa parte, o futuro desta nação no cenário da economia globalizada de nossos dias. Consciente da gravidade que marca esse momento e da responsabilidade que lhe cabe, a Andifes continuará a não medir esforços para a construção de uma proposta que leve à ambicionada reestruturação da educação superior no país.

Ana Lúcia Almeida Gazzola é presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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Atualizado em 10/09/2004

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