Barra de navegação do site

Página inicial Carta ao Leitor Reportagens Notícias Entrevistas Resenhas Radar da Ciência Links Opinião Observatório da Imprensa Busca Cadastro Reportagens

Reforma universitária

Gabriel Mário Rodrigues

A LDB em vigor desde 1996 não se caracteriza como proposta de reforma educacional, constatação que, aliás, pode também ser estendida à LDB anterior. De modo geral, ainda estamos sob o signo de uma concepção de educação e de sistema de ensino idealizados e desenhados dentro das idéias e circunstâncias que prevaleciam em meados do século passado. Foram mais regulamentos gerais que novas propostas de ensinar. Não houve mudança.

Do ponto de vista administrativo, tributário e fiscal, a federação brasileira claudica hoje, muito mais do que antes, diante do elevado nível de concentração de poder político e financeiro da União. Municípios e estados arrecadam cada vez menos, ao tempo em que assumem cada vez mais encargos.

Dentro desse quadro, a federação educacional brasileira revela-se impraticável. Enquanto perdurar, o principal fator de qualidade no ensino fundamental e médio – o seu corpo docente – não responderá, com a urgência requerida, a qualquer política de transformação. Nem o ensino superior conseguirá, no que lhe cabe nessa tarefa (a formação para o magistério) contribuir decisivamente para a melhoria de desempenho e qualidade nesses níveis de ensino.

Uma sociedade democrática, pluralista e libertária depende de uma população mais ou menos educada – vale dizer, precisamos avançar na direção de um sistema educacional duplamente eficaz, capaz não só de abrigar por mais tempo maiores contingentes de estudantes, como também de provê-los com as mínimas condições de exercício consciente e produtivo de sua cidadania.

Os objetivos de eficácia não se viabilizarão, no entanto, sem o deslocamento de vultosos recursos para a educação escolar. Na falta disso, a expansão e a qualidade da oferta de ensino superior continuará refém do estudante egresso do ensino médio – e não há alternativa para isso. A associação direta entre melhor educação e maior disponibilidade de recursos gerados a partir do desenvolvimento econômico precisa ser superada. Não haverá desenvolvimento econômico com uma população medianamente deseducada – como é o caso atual – da mesma forma como não haverá educação de qualidade onde faltarem recursos.

Não se trata, portanto, de uma questão de alocação de recursos, mas de uma opção política de grande envergadura. As visões de futuro do ensino superior brasileiro terão sempre como referência a adversidade de hoje, as circunstâncias atuais e os problemas e suas causas determinantes, bem como as propostas de mudança que estão em curso atualmente.

Os objetivos e metas do Plano Nacional de Educação dificilmente serão concretizadas até 2010, período de sua vigência. Isso não invalida o fato de que o Plano ainda se mantém como instrumento legal de orientação da ação do governo e dos agentes educacionais; e de que ele se mantém como instrumento de planejamento que pode (e deve) ser objeto de atualização periódica, de forma a ajustar aqueles objetivos e metas ao que efetivamente possa ser cumprido, segundo sejam as demais políticas governamentais para o setor social, sem perda de sua função indicativa e ordenadora. A reforma do ensino superior que está em curso deverá incorporar medidas governamentais que viabilizem o cenário descrito para o ensino superior e do qual constem:

- autonomia de fato para as universidades;

- mecanismos de liberação progressiva dos controles de preços do ensino de graduação no setor privado, como contrapartida a padrões de qualidade observados, vis a vis aos parâmetros de qualidade fixados pelo poder público;

- reformulação e modernização das estruturas acadêmicas, sob os pontos de vista de: redução dos encargos acadêmicos e dos custos operacionais no ensino de graduação; e redução dos controles sobre os meios e melhoria dos controles sobre os fins em instituições privadas de ensino superior;

- simplificação da legislação de ensino e racionalização dos procedimentos burocráticos de controle, valorizando a autonomia pedagógica das instituições de ensino e o papel das agências especializadas em acreditação de instituições e cursos;

- flexibilização das normas e controle do Ministério da Educação, valorizando a liberdade de gestão e a racionalidade administrativa própria do regime jurídico de direito privado e fortalecendo o papel das agências especializadas em acreditação;

- implantação de um sistema de avaliação baseado em agências especializadas de acreditação;

- criação de mecanismos de estímulo ao crescimento das demandas em ciência e tecnologia por parte do setor produtivo privado.

- utilização intensiva de novas tecnologias de ensino e aprendizagem, com a conseqüente diminuição da duração dos cursos e dos custos no ensino de graduação, através da adoção de novos arranjos curriculares.

“O quartel do século que acaba de passar, abrange um período excepcional da história da educação. Foi o mais extraordinário período de desenvolvimento educacional americano. Em nenhum espaço igual de tempo, na América ou em outra parte do mundo foi marcado por mudanças mais importantes da filosofia, da ciência, da prática de ensino e da administração escolar”, são palavras escritas em 1925 na introdução do livro Twenty five years of american education. Decorridos quase um século, podem ser perfeitamente aproveitadas em qualquer intróito de publicação atual assemelhada, o que demonstra que as épocas não mudam.

Desde a educação das sociedades primitivas, onde a aprendizagem era exercida com o propósito de obter alimentos, vestuário e abrigo, até hoje, o processo de ensino para o desenvolvimento da humanidade é objetivo a ser concretizado por todas as gerações. Talvez não haja atividade onde, em todas as partes do mundo, não tenha sido sempre preocupação de pessoas e governantes.

Também por mais paradoxal que seja e por maiores investimentos que foram realizados, nunca se conseguiu um consenso a respeito para a melhor solução da estratégia ideal. Kierman Egan, em seu livro A mente educada, enfatiza: “A educação é um dos maiores consumidores de dinheiro público no mundo ocidental e emprega uma força de trabalho maior que praticamente qualquer outro agente social. Os objetivos do sistema de educação – incrementar a competitividade das nações e auto-realização dos cidadãos – devem justificar o imenso investimento de dinheiro e energia. Apesar de todos esses esforços de recursos humanos e financeiros é difícil encontrar alguém, fora ou dentro do sistema, satisfeito com o desempenho da atividade. Os diagnósticos da moléstia são tantos e os remédios recomendados tão variados que, nunca se chega a um consenso e a uma objetiva ação.”

A descontinuidade administrativa e a indefinição de políticas para a área são males difíceis a serem corrigidos em razão das rápidas mudanças sociais, econômicas e tecnológicas pelas quais o mundo passa. O sistema de ensino superior precisa de paz e confiança do poder público para poder trabalhar em função das necessidades do país e dos alunos. Sofre intensamente com o descompasso da administração e, queiram ou não, há atualmente muito tempo perdido.

É sabido que a educação superior em todo o mundo experimenta uma reorientação dramática na expectativa da preparação de uma mão de obra que se encontra em profunda transformação. Enquanto as solicitações para a indústria estão diminuindo profundamente, cresce a demanda para o setor de serviços.

O maior problema da iniciativa privada é a crescente e asfixiante subordinação aos controles e trâmites burocráticos que na maioria das vezes induzem ao abortamento ou ao retardamento de projetos institucionais, quando o mercado exige celeridade máxima. E há um sem número de ações de governo que demonstram a implicância contra a educação privada, quer pelas contradições nos pronunciamentos pela mídia, quer pelas ações regulatórias que só infernizam o setor por meio de esdrúxulas normas inibidoras. Sobretudo quando o mercado precisa se mexer e se desenvolver pelas próprias pernas, neste acirrado momento de competitividade.

Gabriel Mário Rodrigues é presidente do SEMESP – Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo, e reitor da Universidade Anhembi Morumbi.

Versão para impressão

Anterior Proxima

Atualizado em 10/09/2004

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2004
SBPC/Labjor
Brasil