José Luiz da Costa

É coordenador executivo do Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Campinas (Ciatox) e professor livre-docente pela Unicamp. Doutor em química analítica pela USP, Costa está à frente do Laboratório de Toxicologia Analítica da Unicamp. Foi perito criminal da Superintendência da Polícia Técnico-Científica de São Paulo e presidente da Sociedade Brasileira de Toxicologia.

Em 2021, foi o primeiro latino-americano a receber um prêmio de toxicologia forense pela The International Association of Forensic Toxicologists (Tiaf), o Achievement Award, em reconhecimento ao seu desempenho tanto na pesquisa como na toxicologia forense.

Por Paula Gomes

Quais são os principais desafios da pesquisa em toxicologia no Brasil?

A pesquisa no Brasil tem dificuldades crônicas, de financiamento à burocracia. Na toxicologia, em especial a toxicologia forense, trabalhamos com muitos materiais controlados, que precisam ser importados. E é uma dificuldade enorme para ter acesso a eles. Esse é um problema que se arrasta há décadas.

Às vezes você tem o recurso financeiro, mas não consegue comprar esses materiais. São licenças de dificílima obtenção. Isso atrasa demais a pesquisa. Não é raro que demore seis meses para conseguirmos comprar um padrão necessário ao diagnóstico de uma intoxicação. 

O laboratório de toxicologia da Unicamp mantém um diálogo com órgãos policiais (oferece análises laboratoriais para auxiliar casos específicos e treinamento a peritos). Qual a importância dessa relação para a pesquisa, para a força policial e para a sociedade?

O Laboratório de Toxicologia Analítica foi adquirindo muita experiência nesses últimos anos nas áreas de identificação e caracterização de novas substâncias psicoativas e diagnóstico de intoxicações. Também temos equipamentos muitos sofisticados, capazes de realizar análises mais sensíveis, que outros laboratórios não possuem. 

Assim, conseguimos repassar essa experiência para os laboratórios oficiais e ajudá-los na identificação de substâncias – e também na importante detecção de novas substâncias psicoativas, as chamadas NSPs. Desta forma, a população brasileira se beneficia. Nós também oferecemos treinamento para peritos. É uma relação de benefício mútuo – e entendo que esse também seja um dos papeis da universidade, o de formar recursos humanos.

Do ponto de vista de pesquisa, essa troca gera dados e achados importantes. No caso do ensino, os alunos da universidade aprendem também com os peritos criminais que nos procuram. Há ainda peritos criminais que são alunos de mestrado e doutorado da Unicamp, que conduzem as suas pesquisas e trazem para o laboratório novas informações, baseadas em suas vivências. Essa experiência compartilhada é muito rica. 

Para a sociedade, essa relação traz muitos benefícios, pois produz uma capacidade de resposta que não seria possível sem altos investimentos. Esses equipamentos são muito caros e você não precisa tê-los em todos os lugares – para exames que às vezes são feitos poucas vezes por ano. Assim, podemos maximizar o investimento público.

 Como surgiu seu interesse pela área da toxicologia?

O interesse pela toxicologia nasceu nos primeiros anos da graduação, já na iniciação científica, na Faculdade de Alfenas. Eu sempre tive muito interesse pela toxicologia, especialmente pelo tema das drogas de abuso. Na graduação, fiz iniciação científica dentro do laboratório de toxicologia e trabalhei com um projeto de análise de cocaína em urina.

Entrei na Polícia Científica de São Paulo em 2002, e em 2004 fui admitido como professor na Faculdade Oswaldo Cruz. A carreira docente foi praticamente paralela com a de perito criminal. E a de pesquisador também, porque quando fui aprovado para perito criminal, eu já estava no mestrado. A linha de pesquisa do meu mestrado já era em toxicologia forense. Acho que as coisas sempre caminharam mais ou menos em paralelo comigo, a perícia criminal, o ensino e a pesquisa.

Quando abriram o concurso de docente em toxicologia na Unicamp, vi como uma oportunidade de me dedicar ao ensino e à pesquisa. Além disso, sempre tive uma colaboração muito grande com o Ciatox de Campinas. Mas a Polícia Científica nunca saiu de mim. Continuo sempre colaborando muito com meus colegas desse setor, no Brasil inteiro.

Como é o cenário da pesquisa em toxicologia forense no Brasil?

Há grupos importantes na toxicologia forense no país como na USP, com o professor Maurício Yonamine; no Rio Grande do Sul, com os professores Thiago Franco de Oliveira e a professora Sarah Eller; e o grupo do professor Bruno Spinosa de Martinis, na USP Ribeirão, por exemplo, só para citar alguns. Nosso grupo da Unicamp está também entre esses núcleos de pesquisa que vem se destacando. Temos contribuído bastante nesse últimos 10 anos, fomentando um crescimento exponencial do Brasil na produção científica internacional na área.

O número de publicações do grupo cresceu muito. Não só o número como a qualidade da nossa produção científica. Temos publicações importantes nas áreas de pesquisa básica, estudos de metabolismo, desenvolvimento de métodos, métodos miniaturizados, métodos de preparo de amostra, relatos de caso etc. Trabalhamos em diversas linhas diferentes, e somos um dos grupos de pesquisa que mais publica em toxicologia forense do Brasil.