Barra de navegação do site

Página inicial Carta ao Leitor Reportagens Notícias Entrevistas Resenhas Radar da Ciência Links Opinião Observatório da Imprensa Busca Cadastro Reportagens

Tenotã – mõ. Alertas sobre os conflitos sociais e prejuízos ambientais dos projetos de hidrelétricas no rio Xingu, Pará, Brasil

A. Oswaldo Sevá Filho

O que quer dizer Tenotã-mõ? E o que isso tem a ver com o problema das hidrelétricas?

Retrospectiva necessária: Em fevereiro de 1989, o maranhense José Antonio Muniz Lopes, diretor da Eletronorte, compôs a mesa dos trabalhos no Encontro dos Povos Indígenas, realizado no ginásio coberto de Altamira, cidade paraense que fica perto do cruzamento da rodovia Transamazônica com o rio Xingu. Índias e índios de várias etnias vieram se manifestar bem em frente aos palestrantes, alguns falando em sua língua ao microfone e sendo traduzidos. A jovem mãe Tu Ira chegou gritando em língua kaiapó, gesticulando forte com o seu terçado (tipo de facão com lâmina bem larga, muito usado na mata e na roça). Colou na mesa, mirou o engenheiro Muniz, seu rosto redondo de maçãs salientes, traços de algum antepassado indígena, e com a lâmina do terçado, pressionou uma e outra bochecha do homem, para espanto geral. Um gesto inaugurador... Situação que merece uma palavra-chave, usada na língua dos índios Araweté da Terra Ipixuna, no médio Xingu, recolhida pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro :•

Tenotã mõ significa “o que segue à frente, o que começa”.

Essa palavra designa o termo inicial de uma série: o primogênito de um grupo de irmãos, o pai em relação ao filho, o homem que encabeça uma fila indiana na mata, a família que primeiro sai da aldeia para uma excursão na estação chuvosa. O líder araweté é assim o que começa, não o que comanda; é o que segue na frente, não o que fica no meio.

Toda e qualquer empresa coletiva supõe um Tenotã mõ. Nada começa se não houver alguém em particular que comece. Mas entre o começar do Tenotã mõ, já em si algo relutante, e o prosseguir dos demais, sempre é posto um intervalo, vago mas essencial: a ação inauguradora é respondida como se fosse um pólo de contágio, não uma autorização”(pág.67)

Tenotã-mõ é também o título provável do livro a ser publicado em 2005, sob a coordenação deste autor e do jornalista americano-brasileiro Glenn Switkes, responsável no Brasil pela organização International Rivers Network (IRN). Esta “ONG” com sede em Berkeley, no estado da Califórnia, EUA, atua há quase vinte anos ajudando as lutas e as reivindicações das populações atingidas e das ameaçadas pelas conseqüências das obras de hidrelétricas e suas represas em vários países; publica dossiês e estudos sobre as obras de barragens, os projetos de canais, represas e de transposições de vazões entre bacias, e sobre as relações entre tais obras e os consumidores eletro intensivos de energia, e as diretrizes dos bancos multilaterais e das corporações multinacionais.

Fotos: Oswaldo Sevá

Vista panorâmica de Altamira

Seguem-se os assuntos dos capítulos e notas técnicas do livro :

O prefácio foi especialmente escrito por nosso homenageado, o bispo católico dom Erwin Krautler, há trinta anos responsável pela Prelazia de Altamira. O Encontro dos Povos Indígenas só aconteceu em 1989 porque foi cedida a chácara Betânia, propriedade da Prelazia para hospedar durante vários dias, as centenas de famílias indígenas, a maioria vinda de longe. O bispo havia também conseguido uma parte dos recursos para publicar – antes do Encontro – o primeiro livro sobre o problema dos índios com os projetos de hidrelétricas . Em sua mensagem de abertura, o bispo reconta a história desde trinta e tantos anos antes, em seu primeiro encontro com a Amazônia, o rio Xingu, Altamira, a rodovia Transamazônica, o Projeto de Integração Nacional da época dos generais ditadores e com o destino inseguro dos nativos:

Família Xipaia: Dna Miriam, Sr. Miguelzinho, filhas e neta em Volta Grande do Xingu

“A Rodovia Transamazônica foi inaugurada em setembro de 1972. Já em 1975, a Eletronorte contratou a firma CNEC (Consórcio Nacional de Engenheiros Consultores) para pesquisar os locais de futuras hidrelétricas, e em 1979 o CNEC terminou os estudos, prevendo a construção de cinco usinas no Xingu e uma no rio Iriri, escolhendo inclusive os nomes para as mesmas, todos eles indígenas: Kararaô, Babaquara, Ipixuna, Kokraimoro, Jarina e Iriri. Por que nomes indígenas, já que a existência dos povos indígenas deve ser ignorada? Os Juruna, Xipaia-Curuaia, Kayapó, Arara, Assurini, Araweté e Parakanã não contam. Sem dúvida se achará uma “solução“ para eles, mesmo que esta se transforme em “solução final“, a famigerada “Endlösung“ que o nazismo encontrou para os judeus. Os nomes indígenas para as hidrelétricas projetadas seriam assim um “in memoriam“ para estes povos que, junto com as famílias de seringueiros, pescadores e ribeirinhos, teriam que ceder suas terras ancestrais para o progresso e desenvolvimento da região”.

Clique na imagem para ampliar

Imagem:Lab geoprocessamento do ISA

A Bacia fluvial do Xingu com a localização das Terras Indigenas, áreas desmatadas , estradas de penetração e as represas das usinas hidrelétricas projetada

Lembra-se o prefaciador do livro como o Encontro dos Povos Indígenas em Altamira e toda a repercussão obtida pareciam ter sepultado os projetos de barrar o rio Xingu. Mas...
“A alegria durou pouco. No fim da década de 1990 o projeto ressurgiu, se bem que sob outro nome e com roupagem nova. A Eletronorte e demais órgãos governamentais aprenderam dos “erros“ da década anterior e trocaram o modo de agir: um grupo de especialistas (acadêmicos) fora contratado para analisar as forças políticas na região. Foram feitas pesquisas sobre os nossos movimentos sociais, as ONGs, os sindicatos, os povos indígenas, tudo no intuito de mapear possíveis focos de resistência ao projeto agora denominado de UHE Belomonte. O nome “Kararaô”, o grito de guerra, foi substituído pelo bucólico “Belomonte” para que o povo do Xingu não lembrasse mais o facão da Tuíra e os rostos pintados de urucum dos Kayapó contrários à hidrelétrica”.

A estratégia mudou por completo. Nossas lideranças foram continuamente convidadas para reuniões com grupos de técnicos das empresas do governo que, é óbvio, usaram de todos os meios para mostrar o lado positivo do empreendimento. Outro alvo foram os jovens. Patrocinando festas e promovendo excursões à região da UHE Tucuruí procurava-se conquistá-los para idéia de que a hidrelétrica será um bem enorme para a região. Com volumosos presentes o governo aliciou descaradamente as comunidades indígenas. De antemão evitavam-se reuniões com grandes grupos para impedir que a sociedade se organizasse e discutisse abertamente os prós e contras do projeto. Políticos estaduais e municipais de pouca cultura e muita fanfarrice encheram a boca proclamando a UHE Belomonte como a salvação do oeste do Pará e pregando que o Brasil necessita deste impulso energético para evitar o colapso de sua economia”.

O cenário é o vale do Rio Xingu: muitas terras de sua bacia fluvial vão sendo ocupadas de modo conflitivo, e a isto se somariam as conseqüências das seis grandes obras projetadas pela Eletronorte. Todas atingiriam terras indígenas, desde o extremo norte de MT (Parque Indígena do Xingu e Terra Capoto Jarina) até na Volta Grande do Xingu (terra paquiçamba e vários grupos desaldeados). Seja por causa do alagamento permanente, com represas que teriam dezenas de metros de altura, seja por causa da proximidade ou do cruzamento com a abertura de estradas de serviço e com a passagem das faixas de linhas de transmissão previstas – o fato é que pelos menos 18 mil km2 (1,8 milhão de hectares) de terras ribeirinhas seriam capturadas pelas obras. Nesse capitulo inicial, os sujeitos são os “Povos indígenas, beiradeiros, cidades no vale do Xingu, e a sua batalha contra os projetos de barrar o seu rio”.(Oswaldo Sevá). Em seguida, dona Antonia Melo, da Fundação Viver Produzir Preservar e do MDTX escreveu sobre “O assédio da Eletronorte sobre o povo e as entidades na região de Altamira”, e o Sr. Tarcisio Feitosa da Silva, atualmente coordenando a Comissão Pastoral da Terra, registrou os conflitos e contrapôs as distintas visões e alternativas que têm os grupos sociais locais para “A Terra do Meio e os projetos de hidrelétricas no Xingu”.

Clique na imagem para ampliar

A primeira foto mostra o cenário da Volta Grande do Xingu e a segunda, como ficaria caso a hidrelétrica de Belo Monte fosse construída

>

Dois capítulos abordam os aspectos administrativos, jurídicos e filosóficos das tentativas de implantação dos projetos e destacam a interrupção judicial do licenciamento ambiental do projeto Belo Monte, entre os anos de 2001 e 2002:
- “Projetos de Hidrelétricas no Xingu, marcos jurídicos e questões graves” , escrito pelo advogado Raul Silva Telles do Valle, do Instituto Socioambiental em Brasília, DF; e
- “Xingu, Barragens e Nações Indígenas – a propósito do licenciamento e dos direitos inalienáveis”, elaborado pelo Procurador Federal em Belém, Felício Pontes Jr e pela professora Jane Felipe Beltrão, então coordenadora da pós-graduação em antropologia, da Universidade Federal do Pará. Analisaram fatos e documentos de um período histórico particularmente tenso no Pará e na região: no segundo semestre de 2000, a Eletronorte firmou convênio de quase 4 milhões de reais com a Fadesp, fundação ligada à UFPA, através da qual foram contratados pesquisadores para a elaboração de partes do Estudo de Impacto Ambiental. As condições desse convênio foram objeto de um relato surpreendente das condições em que trabalharam os pesquisadores contratados .
Tais condições de elaboração do EIA, mais a tentativa da Eletronorte em obter a licença ambiental apenas no âmbito paraense, da Secretaria Estadual de Tecnologia e Meio Ambiente, despertaram dúvidas no Ministério Público e motivaram a abertura de uma ação civil pública. A decisão judicial, uma liminar embargando o EIA, suspendendo o processo de licenciamento, foi tomada pelo juiz Rubens Rollo de Oliveira, da Justiça Federal em Belém, em maio de 2001.

No mês de agosto, um evento traumático para o movimento popular e para as entidades regionais que reagrupam assentados, pequenos fazendeiros, comunidades rurais: o assassinato de seu líder Ademir Federicci, o Dema. Mesmo que tenha sido por encomenda de madeireiros por ele denunciados – e não por encomenda do “lobby” barrageiro –, o fato conhecido é que o Dema criticava os projetos de barragens e incluía esse ponto na sua luta política, em seus discursos.

Em novembro de 2001, foi confirmada a decisão pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, e quase um ano depois, em 2002, a mesma liminar foi mantida na ultima instância pelo ministro Marco Aurélio Mello, no Supremo Tribunal Federal. Era a segunda derrota do projeto Belo Monte, num intervalo de quatorze anos desde o primeiro anúncio.

Na seqüência do livro, outros estudiosos procuram desvendar as possíveis destinações futuras de tal eletricidade – que podem também exigir altos investimentos em transmissão dessa energia. Para resumir: ao custo de hoje, se fossem instalar mais de 22 mil megawatts em seis grandes obras no rio Xingu, trecho paraense, e em seu afluente Iriri, isto custaria pelo menos 22 bilhões de dólares, algo como 60 bilhões de reais a serem gastos lá e no mundo todo durante uns dez anos. Uma única eletrovia (linhas de transmissão em voltagem extra-alta) com capacidade de transmitir uma décima parte dessa eletricidade até, digamos, na altura de Goiânia, custaria mais de um bilhão de dólares.

No capítulo escrito pelo jornalista paraense Lúcio Flavio Pinto: “Grandezas e misérias da energia e da mineração no Pará”, vai-se demarcando cada uma das grandes “jogadas regionais” – os investimentos e esquemas de influência armados em Carajás, Alumar, Tucurui, Albrás e Alunorte, no Jari, na Mineração Rio do Norte – com a obscuridade das contas e dos contratos, com os prejuízos já sofridos por nós todos e com a destruição que vai sendo deixada no rastro... Além de Lúcio Flávio Pinto, outros autores do livro, paraenses e “de fora” estão escaldados pelo acúmulo de problemas e pelas pendências crescentes em Tucuruí – a primeira mega-usina na Amazônia, feita a toque de caixa sob a pressão dos investidores japoneses e dos bancos europeus, entre 1977 e 1984.

Pode-se afirmar que o objetivo de Tucuruí e o de Belo Monte são o mesmo: a inserção dos “recursos” brasileiros em uma economia globalizada dos materiais energético-intensivos, principalmente o ferro e aço, o silício, o alumínio, o cobre, o níquel e as várias ligas entre eles, cuja fabricação a partir dos minérios exige muito combustível e muita eletricidade. Mesmo assim, a dúvida científica nos obriga também a avaliar esse investimento anunciado, em relação ao funcionamento do atual e previsto sistema de eletricidade na região e no país. A pergunta pode ser: até onde faria sentido abastecer o Centro Oeste e o Sudeste com eletricidade transmitida de 3 mil km de distância? Para que se possa responder, temos que saber, comparativamente a outras rotas de suprimento, e a outros modos de planejar, quais seriam as demandas futuras, as soluções possíveis, as vantagens, as alternativas... Foi com esta disposição que o engenheiro e advogado André Saraiva de Paula, pesquisador do Centro de Pesquisas da Eletrobras, RJ, escreveu seu capítulo “Uma análise do projeto Belo Monte e de sua rede de transmissão associada, frente às políticas energéticas do Brasil”. Movidos pela mesma linha de investigação, organizamos, junto com esse engenheiro eletricista e seu colega Rubens Milagre Araújo, (que percorreu as subestações elétricas de Imperatriz, Marabá, Tucuruí e o centro de operações da Eletronorte em Belém), uma nota técnica sistematizando de modo pormenorizado os dados dos anos 2002 e 2003 sobre a “Eletricidade gerada em Tucuruí, para onde? para quê?”

Na seqüência, com o auxílio de dois pesquisadores da Faculdade de Engenharia Elétrica da Unicamp organizei uma nota técnica com os “Dados de vazão do rio Xingu durante o período 1931-1999 e as estimativas da potência, sob a hipótese do aproveitamento hidrelétrico integral inventariado”. Para exemplificar a situação: se naquele período histórico existisse somente a usina Belo Monte ao longo do rio Xingu, a potência mínima assegurada para injetar na rede regional teria sido de 1.356 Megawatts. A capacidade instalada seria de 11.182 MW !!

Cachoeira Jericoá, em Volta Grande do Xingu Altamira

Mas, o Xingu é rio que seca rápido e que pode permanecer muito tempo bem baixo, quatro meses, digamos. Os valores de vazão d’água medidos lá na cidade de Altamira, Pará, começam na faixa de 450 a 500 mil litros por segundo, que são as médias mensais dos piores anos, em setembro e outubro; em geral as médias mensais do “verão”, na Amazônia vai de julho/agosto a outubro/novembro, ficam abaixo de 1 milhão de litros por segundo. Compare-se isto à capacidade de engolimento de uma das 20 turbinas previstas: 700 mil litros por segundo, com potência de 550 megawatts. Em nossa ficção histórica, registram-se alguns meses, entre 1991 e 1996, em que nenhuma turbina operou com carga plena, e também alguns meses em que apenas uma ou duas das dez máquinas turbinaram. Nos meses das chuvas mais intensas, de fevereiro a abril, o rio pode ultrapassar 25 milhões de litros por segundo; e houve alguns picos de cheia com mais de 30 milhões de l/s. Compare-se com a máxima vazão que poderia ser engolida pelas turbinas: 14 milhões de litros/ segundo. Assim, houve meses em que um trecho de mais de 100 km do rio Xingu, abaixo da barragem até a devolução da água turbinada em Belo Monte, ficou com menos da metade de sua vazão natural...E, na hipótese a mais radical de todas – a de que o Xingu já estivesse desde 1931 barrado em cinco pontos (Belo Monte, Babaquara, Ipixuna, Kokraimoro, Jarina) e se o rio Iriri estivesse barrado na Cachoeira Seca, o conjunto de represas teria regularizado ainda mais o fluxo do rio e assegurado uma potência de 12.800 MW, para uma capacidade nominal de 22.400 MW.

Decisões de tal porte têm razões mais profundas, e os discursos estão recheados de ideologias a respeito da ciência e da tecnologia, do domínio do homem sobre a natureza, e de argumentos escondidos, pressupostos sobre o progresso, o aproveitamento dos nossos recursos, e principalmente sobre o inexorável crescimento da demanda de eletricidade...etc, etc,... que foram tratados no capítulo: “Especialistas e militantes: um estudo a respeito da gênese do pensamento energético no atual governo”, escrito pela engenheira e também antropóloga Diana Antonaz, da UFPA, Belém, que entrevistou longamente alguns dos personagens representativos da intelectualidade dos setores elétrico e petrolífero no início do governo Lula-Alencar.

A avaliação prévia dos prejuízos que a natureza e o rio Xingu sofreriam, foi feita nos capítulos preparados especialmente por Robert Goodland, ex-consultor do Banco Mundial e um dos primeiros “avaliadores de impactos de hidrelétricas” que por aqui trabalharam, com o seu “Brazil’s hostoric evolution of environmental and social impact assessment: suggestions for the Belo Monte hydroproject”, e pelo ecólogo Phillip Fearnside, do INPA, Manaus. No seu capítulo: “Hidrelétricas planejadas no rio Xingu como fontes de gases do efeito estufa: Belo Monte (Kararaô) e Babaquara (Altamira)”, Fearnside demonstra, ao contrário do que pretende a ciência dominante e do que repetem com insistência os barrageiros, que a hidreletricidade é sim poluente, as represas emitem gases carbônicos e hidrocarbonetos, que agravam o efeito estufa com a mesma ordem de grandeza que as usinas hidrelétricas queimando combustíveis.

As dificuldades são crescentes para o povo da região e especialmente os ribeirinhos e os indígenas: eles continuam ameaçados de serem desalojados, de ter o seu rio modificado, vai se tentando confundi-los com manobras verbais, jargões técnicos, campanhas de propaganda. Neste contexto, outros estudiosos foram convocados para analisar a situação; o capítulo “Política e Sociedade na construção de efeitos das grandes barragens: o caso Tucuruí” é assinado pela professora Sonia Barbosa Magalhães, ex-pesquisadora do Museu Emilio Goeldi e colaboradora do Departamento de Antropologia da UFPA. Esse histórico de Tucuruí, dos seus aspectos social e ambiental, dá uma boa idéia do que significaria um novo surto de obras por ali, quanto mais se os problemas pendentes são de responsabilidade dos mesmos patrocinadores dos projetos no Xingu: a Eletronorte, a Camargo Corrêa, as indústrias eletro-intensivas.

O capítulo “Índios e Barragens: a complexidade étnica e territorial na Região do Médio Xingu” foi assinado pelo antropólogo Antonio Carlos Magalhães, ex-pesquisador do Museu Emilio Goeldi e consultor do Governo do Pará. O geógrafo paraense, então completando seu doutorado na USP, assina o capítulo “Dias de incertezas: O povo de Altamira diante do engodo do projeto hidrelétrico Belo Monte”. No final do livro, é formulada uma espécie de teoria geral dos problemas da hidreletricidade com o capítulo: “Conhecimento crítico das mega-hidrelétricas: para avaliar de outro modo alterações naturais, transformações sociais e a destruição dos monumentos fluviais”, (Oswaldo Sevá) e com o informe do dirigente da IRN, Patrick Mc Cully, sobre as lutas dos atingidos em vários países contra a chamada “dam industry”, ou, a “indústria barrageira”.

Na essência, no vale do Xingu prossegue uma guerra de desiguais: aventureiros e empresas, livres para agir, acobertados em seus desmandos, muito bem representados na máquina pública em todas esferas e instâncias de poder,...enquanto o povo e os índios só contam praticamente com eles mesmos, uns poucos abnegados que os ajudam, e partes da máquina pública, raras, que conseguem cumprir sua função.
O que de fato temos pela frente, são projetos sociais, econômicos, que competem ou até conflitam entre si; visões e propostas de distintos grupos de interesse e de distintas classes sociais para o mesmo espaço territorial. São demandas de utilizações distintas para os mesmos bens coletivos – ou um grande rio não é um bem coletivo? Sob a ditadura e diante do poderio dos cartéis internacionais, não pudemos evitar que na Amazônia paraense fosse instalado um reduto da indústria eletro-intensiva mundial. Que possamos então limitar esse avanço e, no futuro, revertê-lo!

A. Oswaldo Sevá Filho é engenheiro mecânico de produção, doutor em ciências humanas e professor do Departamento de Energia da Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp.

Outras informações: www.fem.unicamp.br/~seva; www.socioambiental.org.

Notas:
CASTRO, E. V. de “Araweté é o povo do Ipixuna” CEDI - Centro Ecumênico de Documentação e Informação (ISA), S.P.,1992

(v publicação periódica “World Rivers Review” (ISSN no. 0890 6211) e o site www.irn.org)

Este livro coletivo é o produto deliberado de um Painel de especialistas e de entidades sobre os projetos hidrelétricos no rio Xingu, Pará, formado desde o final de 2002 por iniciativa conjunta do I.R.N. - International Rivers Network, San Francisco, CA e das entidades de Altamira, Pará, agrupadas no MDTX – Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e do Xingu, e teve apoios específicos das entidades Instituto SocioAmbiental, SP e BSB; FASE, RJ (Programa Brasil Sustentável e Democrático), e Comissão Pró-Indio de São Paulo.

SANTOS e ANDRADE, orgs: “As hidrelétricas do Xingu e os povos indígenas”, Comissão Pro Índio de S.P. 1988. Três dentre os mais de vários autores daquele livro colaboram, dezesseis anos depois, nesse segundo livro: Sônia Magalhães, Antonio Carlos Magalhães, antropólogos trabalhando em Belém, PA e Oswaldo Sevá.

Foi publicado artigo no exterior, em um periódico especializado, do qual há um excerto na íntegra nesse livro. Ref: FORLINE, Louis e ASSIS, Eneida “Dams and social movements in Brazil: quiet victories on the Xingu”in Practicing Anthropology, vol. 26 no. 3 Summer 2004 pp 21-25.

Metodologia: Na simulação usou-se o modelo Hydrolab (Cicogna e Soares Fo., 2003, FEEC, Unicamp) que foi alimentado pela base de dados do SIPOT - Sistema de Informações do Potencial Hidrelétrico, da Eletrobras, com os valores numéricos da vazão d’ água do rio Xingu, mensurados em Altamira - ou extrapolados a partir dos dados do rio tocantins - desde o ano de 1931 até o ano de 1996. Destacamos o subperíodo de 1949 a 1956, por ser considerado o de melhor pluviosidade, do ponto de vista da geração hidrelétrica nos rios brasileiros do hemisfério Sul. Não se trata portanto de afirmar nada com relação ao quanto tais usinas poderiam, no futuro, acionar, da sua potência instalada; e sim, trata-se de imaginar, como elas teriam funcionado no passado, se tais usinas existissem nesses pontos desses rios que apresentaram essas vazões.

Versão para impressão

Anterior Proxima

Atualizado em 10/02/2005

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2004
SBPC/Labjor
Brasil