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Resenhas
A fábrica de ideias
Livro traça as origens da comunicação por meio da história do Bell Labs, uma divisão de pesquisa da Companhia Americana de Telefone e Telégrafo (AT&T) e suas grandesinvenções.
Simone Caixeta de Andrade
10/12/2014
As baterias não funcionavam, os cabos corretos e os sinais de discagem não haviam sido criados, os telefones tinham sérios problemas de design e desempenho. A lista do que precisava ser inventado não parava de crescer. A cada nova descoberta, centenas de outras eram necessárias e pareciam obscurecer o caminho para evolução das telecomunicações. Assim começou a trajetória de um grande centro de pesquisa e desenvolvimento, os laboratórios Bell, em 1925, uma divisão da Companhia Americana de Telefone e Telégrafo (AT&T), a poderosa indústria de telecomunicações norte americana.

O livro The idea factory: Bell labs and the great age of american innovation, de Jon Gertner, relata as origens da comunicação moderna “por meio das aventuras de vários homens e mulheres que passaram suas carreiras trabalhando nos laboratórios Bell”. Dentre esses pesquisadores, nada menos do que doze foram laureados e dividiram sete prêmios Nobel em Física.

Desde o início do século XX, o Nobel é concedido a pessoas que fizeram contribuições relevantes para a humanidade em diversas áreas. E o momento da descoberta pode ser tão efêmero quanto um sonho com um ouroboro que desfez o mistério do arranjo das estruturas químicas que atormentavam o cientista alemão August Kekulé. Em outros momentos, não há mágica, mas pessoas certas no lugar certo, em um encontro definitivo com um problema. Nesses casos se dá “o salto”, que somente olhando em retrospecto parece óbvio, acredita Gertner. Ao longo de vinte capítulos do livro, esse encontro definitivo é desvendado, tomando por base o ocorrido nos laboratórios Bell.

Bill Gates afirmou, certa vez, que se pudesse escolher uma data para voltar ao passado seria 1947, pontua Gertner. Nesse ano, o transistor foi inventado por John Bardeen, William Bradford Shockley e Walter Houser Brattain no laboratório. A descoberta influenciou o desenvolvimento de computadores e da fotografia digital, e mereceu o prêmio Nobel em Física no ano de 1956. Também foi nos laboratórios Bell onde foi produzido o primeiro precursor de uma célula solar, com produção de energia limpa utilizada, entre outros, para carregar a bateria de eletrônicos. Outros dois pesquisadores, Arthur Schawlow e Charles Townes, desenvolveram o conceito e aplicação do laser, descoberta que, em 1997, rendeu outro prêmio Nobel em Física ao laboratório, dessa vez para Steven Chu, Claude Cohen-Tannoudji e William D. Phillips, que desenvolveram um método de captura de átomos com laser.

União de mentes brilhantes

Em 1876, Graham Bell foi o primeiro a patentear um aparelho elétrico de transmissão de voz a distância, e vinte anos depois, quando perdeu os direitos de exclusividade sobre sua descoberta, a empresa Bell System tentava driblar a concorrência e garantir o monopólio das telecomunicações. À época, colecionavam problemas sem solução e não ofereciam um serviço de qualidade – ou mesmo a possibilidade de uma ligação transcontinental.

Durante as décadas que se seguiram, após a queda das patentes, a Bells System, em particular os laboratórios Bell, aproximaram-se da academia, transformando-se num local para o encontro das mentes mais brilhantes, que pensavam em conjunto os problemas das telecomunicações. A estratégia adotada para atrair essas mentes já era conhecida de laboratórios farmacêuticos na Alemanha, que recrutavam nas universidades seus melhores pesquisadores. Os contatos feitos dentro do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, do Instituto de Tecnologia da Califórnia e de outras instituições, acabaram recrutando os melhores PhDs, que, tão logo eram contratados, vendiam os futuros diretos de suas patentes por um único dólar.

Um dos grandes méritos dessa fábrica de ideias foi reconhecer o talento de sua equipe, respeitando as particularidades de cada pesquisador. O físico Karl Darrow, por exemplo, tinha mãos trêmulas, portanto inapto para a experimentação científica nos laboratórios Bell. Contudo, tinha talento incomum para resumir “os avanços contemporâneos da ciência” e se tornou o divulgador científico da indústria, viajando constantemente à Europa e fazendo o intercâmbio de informações entre os cientistas.

O livro desvenda não só as descobertas, mas os inventores, como Clinton Davisson, que dividiu com outros dois pesquisadores o prêmio Nobel de 1937 pela descoberta da difração de elétrons. Ele foi descrito como um pesquisador magro e quieto, que ficava longe da área de desenvolvimento de produtos, mas estava sempre pronto a ponderar sobre um problema difícil, especialmente se envolvesse elétrons.

Gertner escreveu para o New York Times sobre como os laboratórios Bell conquistaram tanto, e explicou que, durante grande parte do século XX, a instituição “foi a organização científica mais inovadora do mundo”. O local era o sonho de trabalho de qualquer cientista, com material disponível (especialmente no período das grandes guerras mundiais) e colegas altamente capacitados para resolver os problemas da pesquisa. A cultura da criatividade era estimulada, as palestras eram comuns, assim como a busca constante por artigos científicos (que naquela época não eram tão fáceis de se conseguir) e, também, visitas ilustres, como Albert Einstein, em 1935.


Um dos homens responsáveis pela cultura da criatividade foi Mervin Kelly, explica Gertner. E foi esse físico que reconheceu que uma “revolução nos eletrônicos viria após a guerra”. E assim aconteceu. Para Kelly, segundo Gertner explica em entrevista ao The Deal Economy, “inventar o futuro não era uma questão de inventar coisas para o futuro, implicava em inventar maneiras de inventar essas coisas”. Assim foi feito.


The idea factory: Bell labs and the great age of american innovation

Jon Gertner

Penguin Books, 2013 (reimpressão)

432 páginas