Sérgio Lüdtke aborda desafios da checagem de fatos a partir da experiência do Projeto Comprova

Por Daniel Rangel, Lethícia Bueno e Sabine Pompéia

O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa de checagem de informações potencialmente suspeitas da qual Sérgio Lüdtke é editor-chefe desde a criação, em 2018. Atualmente, envolve 41 veículos de comunicação parceiros que investigam informações suspeitas a respeito de políticas públicas – especialmente aquelas com alta taxa de disseminação em sites, aplicativos de mensagens e redes sociais.

Segundo o jornalista, em palestra no Labjor, alguns dos principais conceitos que tornam a checagem de fatos um exercício relevante e democrático foram a transparência quanto à seleção e investigação dos conteúdos e das fontes a serem checados; a responsabilidade ética em não legitimar informações falsas e proteger identidades; e a independência nas decisões operacionais e editoriais, sem influência de filiações políticas ou tecnológicas, por exemplo.

Em palestra no Labjor: jornalista avalia a importância da diversificação de fontes na checagem de fatos. Foto: Daniel Rangel

Nos bastidores da checagem

O monitoramento de plataformas, em especial das redes sociais, é a primeira etapa para a seleção de conteúdos suspeitos. Após a pré-seleção, o time de jornalistas dos 41 veículos parceiros é convidado a fazer a apuração do material. O ideal é que ao menos três profissionais de veículos distintos se voluntariem para a checagem.

Lüdtke explicou que, durante o processo, vários passos de verificação são seguidos e tudo é registrado de forma padronizada para obter um resultado baseado em evidências comprováveis. Cuidados com a linguagem utilizada, contextualização de dados, explicações sobre as informações fornecidas e diversificação de fontes também são partes essenciais da checagem.

O resultado é, então, revisado por um conselho editorial formado por outros três representantes dos veículos parceiros (crosschecking). Quando há consenso sobre a consistência da verificação, o conteúdo é publicado pelo Comprova e pelos veículos parceiros. Caso não haja concordância, o material é arquivado. Lüdtke pontuou que tudo é feito de forma horizontal e que a opinião de todos os envolvidos é levada em conta, sem hierarquia.

O jornalista também destacou o papel crítico que a sociedade pode e deve assumir na checagem. “Quem checa o checador é o público”, enfatizou.

Desinformação na mira

Os conteúdos selecionados pelo Comprova são aqueles que viralizam nas redes e que têm potencial de gerar dúvidas. A partir do resultado de cada verificação são etiquetados como Enganoso, Falso, Sátira ou Comprovado.

Na palestra, Lüdtke pontuou que o termo fake news, antes amplamente utilizado no universo de checagem, banalizou-se e não faz mais sentido no contexto de muitas iniciativas, como a do próprio Comprova.

Quanto ao potencial danoso da desinformação, o jornalista alertou que, de forma geral, conteúdos enganosos ou falsos são repletos de elementos emocionais que geram temor, indignação e caráter de urgência, o que eleva as chances de serem disseminados. Durante a pandemia, por exemplo, ele disse notar um aumento expressivo de importação de conteúdo desinformativo, inflamado pela criação de grupos com ideais comuns e partidários, que passaram a acreditar em todo tipo de material postado, sem crítica alguma.

Diante desse cenário, Lüdtke reforçou a importância da conscientização sobre a desinformação, buscando novos formatos de divulgação da apuração de conteúdos duvidosos e o desenvolvimento da educação midiática da população.

Histórico do Comprova

O Comprova foi criado em 2018, com 24 veículos parceiros, no contexto das eleições no Brasil. Na primeira fase do projeto, notícias com teor suspeito sobre as eleições eram checadas com base nos preceitos da First Draft, coalizão internacional que produziu um guia completo de verificação de conteúdo. 

Encerradas as eleições, passou a verificar assuntos voltados às políticas públicas do Governo Federal. Em 2020, dedicou-se à checagem de desinformações sobre a pandemia da Covid-19. “Foi muito difícil lidar com o desconhecido na época. Até então não costumávamos buscar por opiniões, apenas fatos, mas diante das incertezas foi necessário procurar especialistas para opinar sobre as informações que circulavam nas redes”, conta Lüdtke.

Hoje, o projeto segue verificando conteúdos de políticas públicas e aposta em novos modelos de checagem, como a série Comprova Explica.