Editorial:

As cidades e os muros
Carlos Vogt

Reportagens:
Prós e contras da revitalização urbana
Enfim o Estatuto da Cidade
Programa Habitat procura desenvolver a qualidade de vida nas cidades
Ocupações revelam déficit habitacional
Fórum Social propõe uma outra cidade possível
Novas metrópoles, velhos problemas
Conflitos entre centro e periferia
Qualidade das águas é cada vez pior
Lixo é problema ambiental com agravantes sociais
Transporte em São Paulo: conflitos e soluções
Poluição sonora piora ambiente urbano
Preservação ambiental: destino alternativo para o litoral sul de São Paulo?
Cidade tenta unir tecnologia com inclusão social
Educação para uma nova cidade
Brasília contrastes de uma cidade planejada
Vilas significaram distância entre patrões e operários
Artigos:
Dimensões da tragédia urbana
Ermínia Maricato

Aprovação do Estatuto da Cidade
Geraldo Moura

O passado nas cidades do futuro
Cristina Meneguello
"As cidades nos países subdesenvolvidos" em um mundo globalizado
Tatiana Schor
Cidades e seus fragmentos
Rogério Lima
Cidade, língua, escolae a violência dos sentidos
Cláudia Pfeiffer
A cidade como objeto de estudo
Maria Josefina Gabriel Sant'Anna
Poema:
Manual do novo peregrino
Carlos Vogt
 
Bibliografia
Créditos

 

 

 

Fórum Social propõe uma outra cidade possível.

As condições de vida na grandes cidades, principalmente as dos países subdesenvolvidos, têm se deteriorado. De pólo atrativo que propiciava o acesso a uma intensa vida cultural e social, melhores oportunidades de emprego e um enriquecedor convívio com diferentes experiências de vida, elas têm se tornado centros irradiadores de migrações para lugares menores, com menos poluição, violência, tráfego e melhores condições de vida. As grandes cidades, por serem concentradoras de população, são mais sensíveis à piora das condições econômicas, mesmo que seja de apenas uma parte da população.

Pensando nesse problema e vendo a cidade como o lugar em que as questões sociais se tornam mais dramáticas, realizou-se no dia 2 de fevereiro, durante o Fórum Social Mundial 2002, em Porto Alegre, a conferência "Cidades, populações urbanas". Nesse encontro, estiveram debatendo os problemas das cidades, sob o comando da professora da Faculdade de Arquitetura da USP e urbanista Ermínia Maricato, pesquisadores e representantes de movimentos sociais de diferentes partes do mundo. Em um fórum de resistência à globalização neoliberal como o de Porto Alegre, o objetivo era mostrar como um processo que se dá em nível global e nacional tem seus efeitos visíveis nas grandes concentrações urbanas. Dentro do espírito propositivo do Fórum Social, a conferência pretendeu também trazer sugestões e idéias para a resolução dos problemas e para uma melhor organização dos movimentos sociais.

Os anos 90 trouxeram alterações no papel do Estado. Em um movimento que já havia se iniciado em alguns países desenvolvidos, os países subdesenvolvidos reduziram os investimentos estatais e privatizaram empresas públicas - incluindo empresas que forneciam água, energia, transportes e habitação. Com isso, aplicava-se uma política econômica que procurava equilibrar as contas públicas e abrir espaços para mais investimentos vindos de empresas privadas, seguindo as orientações de organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Ao mesmo tempo, os países subdesenvolvidos passaram a contar com uma presença maior de investimentos estrangeiros, através de empresas multinacionais.

Ermínia Maricato - contra a cidade do pensamento único. Foto: RE

O efeito da redução do Estado e da globalização foi analisado, na abertura da conferência, por Ermínia Maricato. Segundo ela, os direitos sociais, econômicos e políticos, que foram conquistados através das lutas históricas dos trabalhadores, foram perdidos. A exclusão social daqueles que não podem pagar pelos serviços - que eram oferecidos pelo Estado e que agora são disponibilizados pelo mercado - favorece as atividades ilegais e a agressão ao meio ambiente. As camadas mais ricas podem usufruir de um padrão de consumo semelhante aos do Primeiro Mundo, mas estão rodeadas pela violência e pelo crime organizado, que crescem na "cidade oculta". Segundo ela, as especificidades de cada local acabam sendo atropeladas por um modelo de urbanismo gestado nos países do Primeiro Mundo.

O mexicano Guillermo Rodriguez, da Federación Continental de Organizações Comunitárias (Fecoc), apontou a falta de acesso ao Estado nos países subdesenvolvidos. Segundo ele, já que a saúde, a educação, o saneamento, deixaram de ser papel do Estado, cidadania passou a se dar na esfera da resolução individual de problemas e não na luta por direitos coletivos. As pessoas não buscam mais por direitos junto ao Estado, de uma forma coletiva e organizada, mas tentam obter acesso a serviços no mercado. Como objetivos para os movimentos da América Latina Rodriguez colocou a luta para reverter a privatização da água, a melhoria das habitações e a luta por terras urbanas.

Cesare Ottolini - por uma conspiração internacional pelo direito à cidade. Foto: Rafael Evangelista

O cientista político Cesare Ottolini pediu uma conspiração internacional pelo direito à cidade. Segundo ele, os habitantes têm o direito de construir a cidade. Ottolini alertou aos movimentos sociais para que mantenham sua independência com relação aos políticos, mesmo que eles sejam simpáticos às suas causas. "Os políticos, quando chegam ao poder, tendem a se tornar mais conservadores", disse. Ele lembrou dos conselhos de bairro dos anos 70, que burocratizaram-se nos anos 80. Como sugestão de fonte de investimentos em políticas sociais o italiano propôs o cancelamento das dívidas dos países pobres. "Mas tem que haver uma vinculação, por parte dos governo que tiverem dívidas abatidas, de parte dos recursos com as políticas sociais", ponderou. Outra fonte de recursos citada por Ottolini foi a Taxa Tobin.

A Taxa Tobin foi proposta pelo economista James Tobin, premiado com o Nobel de economia em 1972. Ela consiste na taxação em 0,1% das transações de todo o capital especulativo que circula pelo planeta. O ATTAC (Ação pela Tributação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos), uma das entidades promotoras do Fórum Social Mundial, teve a Taxa Tobin como uma de suas metas iniciais. Os recursos oriundos da Taxa Tobin poderiam constituir uma reserva de investimentos em políticas públicas.

Peter Marcuse, urbanista e professor da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, também citou a Taxa Tobin como fonte de recursos. Outra alternativa seriam os fundos de pensão, que concentram uma grande quantidade de recursos. No entanto, seria preciso ainda chegar a um consenso sobre como a gestão e a captação desses recursos pode ser feita.

Segundo ele, o Fórum Social é uma oportunidade para que o movimento social defina o que há de errado no modelo atual e qual é o novo modelo ideal. "Definimos que a habitação não deve ser vista como um produto. Sabemos que não queremos a segregação, o trabalho inadequado, a insegurança e a falta de saúde. Mas não estão claros pontos como: que tipo de integração desejamos, que habitação desejamos - gerida por quem, com que donos?", perguntou. Para o urbanista, esses problemas relacionam questões locais, globais e nacionais.

Marcuse encerrou afirmando o paradoxo da construção de um novo mundo possível. Para ele, precisamos de novos homens para contruir um novo mundo mas "só conseguiremos um novo mundo se tivermos novos homens", completou.


 

Atualizado em 10/03/2002

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