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Dossiê Pós-verdade (mar/2017)

Pós-verdade e pós-falsidade

Por Carlos Vogt

Pós-verdade é mais um conceito-coringa, próprio da contemporaneidade, como pós-modernidade, e outros pós que virão. Diz tudo e diz nada, porque é feito da confusão entre o que se transforma, por conhecer, e a transformação do conhecimento na banalidade de receitas de autoajuda epistemológica. Mas é, ele próprio, derivado, entre outras coisas, da mudança de paradigma científico que se deu ao longo do século XX, com ênfase na substituição de um modelo ontológico de verdade por um modelo probabilístico. Continue lendo Pós-verdade e pós-falsidade

Poder de automação: interferência de bots sociais na política global

Por Samuel C. Woolley

As formas como softwares sociais automáticos estão sendo implantados, bem como os grupos por trás da implantação, estão mudando. Os pesquisadores de ciência da computação descobriram que os bots sociais podem ser usados além da simples interação homem-bot, rumo a uma garimpagem em larga escala dos dados de usuário e verdadeira manipulação da opinião pública em sites como Facebook e Twitter.

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Leonardo Sakamoto: O futuro das redes sociais está diretamente ligado ao futuro da educação para as redes sociais

Por Gustavo Almeida e Tiago Alcantara

As redes sociais são maravilhosas; elas aproximam pessoas, facilitam revoluções, encurtam distâncias. Mas, ao mesmo tempo, você tornar possível o contato de muita gente que não está preparada para essa comunicação sem prepará-la para isso, pode significar que essas pessoas se tornem veiculadoras de boatos e mentiras que possam criar problemas graves para a sociedade, ou mesmo acreditarem em boatos e mentiras porque não estão acostumadas, inclusive, em entender, por exemplo, que uma matéria bem apurada é mais forte que um meme que foi enviado pelo seu “best friend forever” de algum lugar E, não sendo preparada, ela pode cair mais facilmente numa rede de mentiras ou se tornar, ela mesma, vetor de difusão de mentiras. Continue lendo Leonardo Sakamoto: O futuro das redes sociais está diretamente ligado ao futuro da educação para as redes sociais

Os meios de comunicação e a democracia

Por Luis Felipe Miguel

Nos regimes que, em geral, aceitamos como “democráticos” o povo não governa. Sua influência nas decisões políticas é filtrada por mecanismos de intermediação, entre os quais a mídia. A falsificação escancarada e a omissão deliberada não resumem o repertório de formas de intervenção política da mídia. Ainda mais crucial é o poder de determinar a agenda que receberá atenção pública, os agentes e as posições relevantes. Há casos de manipulação ostensiva, mas o mais importante é o efeito sistemático da reduzida pluralidade do noticiário. Continue lendo Os meios de comunicação e a democracia

Um fantasma assombra o mundo. Mas… qual é mesmo sua identidade?

Por Reginaldo C. Moraes

O reino da pós-verdade não é uma consequência de qualquer “determinismo tecnológico” ou o fruto da “explosão da informação” que, supostamente, caracteriza nosso cotidiano, balcanizando e fragmentando a informação, disseminando a crença em tudo e, portanto, em nada. Aquilo que por vezes se tem chamado imprecisamente de “sombra do fascismo” é um filho legítimo do movimento de fim da história, isto é, da caricatura de democracia liberal e de mercado livre que os poderes fáticos do centro do mundo impuseram ao planeta como destino inelutável. É surpreendente que os personagens vocacionados para o sucesso hoje sejam encarnação da “anti-política”? Pode ser um empresário excêntrico e agressivo, pode ser um chefe cripto-hitleriano. A emergência desses tipos é uma descendência legítima da apologia da globalização. A mídia conservadora americana não via Trump como o candidato dos sonhos. Mas não podem rejeitar a paternidade. A imprensa liberal também o recusa, evidentemente. Mas não pode negar que ele é a versão cínica e truculenta daquilo que fazem, elegantemente, os falcões globalistas do Partido Democrata. Continue lendo Um fantasma assombra o mundo. Mas… qual é mesmo sua identidade?

Uma consciência 3.0 para as redações

Por Rogério Christofoletti

Tão logo passou o furacão, decidimos sair de nossos abrigos para observar os estragos. A internet, redes sociais, smartphones e tudo ao seu redor tinham varrido nossas certezas preservadas há décadas nas redações. A partir disso, sabemos todos, o jornalismo não foi mais o mesmo porque perdeu a primazia de informar, porque uma horda de amadores ocupou largos territórios e porque a economia da gratuidade chacoalhou (e fez despencar) muitos negócios na área. Continue lendo Uma consciência 3.0 para as redações

Política como religião: ciberdemocracia & intolerância nas novas mídias

Por João Angelo Fantini

A recente eleição de Donald Trump para presidente acendeu o alerta no mundo todo sobre a possibilidade de podermos ter algum tipo autoritário, fascista ou qualquer tipo de maluco na presidência de uma grande nação dotada de armas nucleares. A descrença no fato de que a democracia deveria nos defender contra um tipo de governo que julgávamos relegado ao passado, tem gerado uma série de discussões, desde as mais bizarras e paranoicas, até outras rebuscadas e acadêmicas, questionando a validade das formas democráticas de voto. Continue lendo Política como religião: ciberdemocracia & intolerância nas novas mídias

Hypernormalisation de Adam Curtis não é sobre fake news, é sobre a raiz desse mal: o ataque à política

Por Rafael Evangelista

Os cortes, a montagem, a narração afirmativa, a música pop cuidadosamente encaixada e repetida, a seleção cuidadosa de imagens de arquivo e sobras de gravação que nunca foram ao ar, tornam fácil associar o cinema de Adam Curtis ao que ele busca nos alertar: a corrupção do real, do fato, da informação, do encadeamento histórico em benefício de uma mistura histérica e manipulativa entre realidade e ficção. A escolha irônica desse formato, que por vezes afasta alguns espectadores descrentes, é a grande força de Curtis, é o que torna seus documentários tão impactantes e atuais. Mas não devemos nos enganar, o cineasta inglês é, acima de tudo, um jornalista, um rato de arquivo mergulhado na memória do noticiário internacional, cuidadosamente elencando acontecimentos, interesses e ideias vindas de áreas díspares da cultura e da economia global. A sua maneira, Curtis é também um divulgador crítico da ciência e das teorias sobre o homem. Seus temas e análises, embora pareçam tirados da cartola, sempre estão em diálogo com intelectuais críticos do nosso tempo, muitos deles figurando nos próprios filmes. Continue lendo Hypernormalisation de Adam Curtis não é sobre fake news, é sobre a raiz desse mal: o ataque à política