Tanto o riso (pensado como correlativo do júbilo) quanto o rubor (pensado como correlativo da vergonha) são refratários à intromissão discursiva de suas causas. Um chiste apresentado junto com sua explicação se torna inócuo, é um chiste-falho. Uma irrupção de vergonha se dissolve pela explicitação das suas motivações.
A vitória eleitoral de Jair Bolsonaro não era prevista em 2016, mas foi o golpe de 2016, desorganizando o jogo político existente e conferindo legitimidade a discursos autoritários e regressistas, que criou as condições para que ela ocorresse. O bolsonarismo é apenas a metástase de um projeto de retração democrática que o precede e o transcende.Continue lendo Golpes e golpismos no Brasil contemporâneo→
Entre o final de outubro de 2022 e o início de janeiro de 2023, o Brasil viveu uma campanha golpista de contestação do resultado da eleição presidencial. O que a sociologia tem a contribuir para aprofundar e complexificar o debate público em torno da compreensão deste fenômeno? Neste artigo, vou abordar quatro contribuições: revelar a racionalidade das ações sociais; refletir sobre a relação entre meios e fins; investigar a interação entre a base deste movimento e as suas lideranças; e, por fim, lembrar que valores são produzidos e internalizados em instituições socializadoras. Continue lendo Contribuições sociológicas para compreender o golpismo dos patriotas→
Das questões ainda em aberto sobre a intentona fascista de 8 de janeiro de 2023, talvez a mais intrigante seja: o que os bolsonaristas achavam que ia acontecer? A invasão e depredação de prédios públicos, vazios e trancados para o fim de semana, é um ato de selvageria e barbarismo, mas que dificilmente pode ser visto como uma tentativa séria de usurpar o poder ou desestabilizar o governo: não é como se os invasores estivessem tentando tomar o presidente recém-empossado como refém ou algo assim. Continue lendo A politização da toca do coelho→
Créditos da imagem destacada: Corpo do sargento Guilherme Pereira do Rosário, morto após a explosão de uma das bombas do Atentado do Riocentro em 1981. Autor desconhecido. Fonte: Correio do Brasil. Wikimedia Commons.
Em Anatomia de um Instante, Javier Cercas examina um momento crucial da história espanhola. No dia 23 de fevereiro de 1981, um grupo militar, comandado pelo tenente Antonio Tejero, invade a câmara dos deputados e mantém os parlamentares sequestrados. O objetivo era promover um golpe e colocar o país sob tutela de um governo militar. A Espanha saíra havia apenas seis anos da ditadura franquista, que durara 40 anos. Continue lendo ‘Anatomia de um Instante’: as lições do golpe espanhol sobre o golpe brasileiro→