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Assegurar o direito à terra é essencial para proteger a rica diversidade cultural e biológica dentro das Terras Indígenas

Por Rodrigo Anzonlin Begotti

Uma característica comum a todos os povos indígenas é o vínculo com suas terras ancestrais. A terra é parte fundamental na concepção da identidade coletiva desses povos e da própria identificação individual pela qual as pessoas se definem como índios. Dessa forma, o acesso à terra é imprescindível para a manutenção da coesão social, para a plena manifestação cultural e dos modos de vida tradicionais. Nas últimas décadas, o reconhecimento do direito à terra para os povos indígenas tem sido consolidado em diversos estados-nação baseando-se na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1989, que trata dos Povos Indígenas e Tribais, e reforçada posteriormente pela Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas elaborada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2007. Continue lendo Assegurar o direito à terra é essencial para proteger a rica diversidade cultural e biológica dentro das Terras Indígenas

A democracia sobrevive ao vírus?

Por Luis Felipe Miguel

Iustração de Cristiano Siqueira instagram @crisvector twitter @crisvector

O mundo que sairá da crise será, como sempre, resultado da luta política. Se de fato valorizamos um ordenamento político democrático, será preciso investir na redução das desigualdades, na ampliação da educação política, na desprivatização do poder de influência e na desmercantilização da vida, sem as quais uma democracia autêntica não pode florescer. São lições que a crise atual parece nos ensinar. Mas, como sempre, uma coisa é o que a história ensina. Outra é o que a humanidade aprende.  Continue lendo A democracia sobrevive ao vírus?

Figuras em busca do azul

Por Antonio Risério

Confinamento e distanciamento interpessoal impostos pela peste são uma violentação antropológica com a qual teremos de conviver. Seremos obrigados a recriar nossas formas cinésicas e proxêmicas específicas, as brasileiras, de relacionamento. Ao mesmo tempo, tenho birra com a expressão “distância social”: adoto a distância física, mas com envolvimento social. A própria opção pelo isolamento é, neste momento, signo de solidariedade. O problema é que o país, empurrado por um governo destrambelhado e criminosamente irresponsável, mergulhou em estado de desorientação nacional. Diante da peste, surge em todo o mundo uma fantasia compensatória: a velha conversa de que a tragédia é véspera de uma nova e melhor humanidade, mais limpa, mais justa, mais fraterna. Não consigo acreditar nisso. Continue lendo Figuras em busca do azul

É preciso sobreviver sem surtar

Por Hamilton Octavio de Souza

Ilustração de Céllus Marcello Monteiro instagram celluscartum twitter @Cllus1 

Além de sofrer a ameaça fatal da pandemia, o brasileiro é vítima da irresponsabilidade de autoridades e da mais danosa degradação institucional. Só vai atravessar a difícil e tormentosa jornada da pandemia não apenas quem não for aleatoriamente colhido pelo vírus, não apenas quem souber se cuidar com total respeito e carinho pela vida, mas, também quem conseguir temperar as energias físicas e mentais sem ser consumido pelas pesadas cargas emocionais e psicológicas emanadas por realidade incontrolável e pelas forças tradicionais que exploram a nossa sociedade. Decididamente só vai sobreviver mesmo, em condições de atuar no presente e no futuro, quem não surtar durante todo esse período de brutal instabilidade e caótica transformação. Continue lendo É preciso sobreviver sem surtar

Aceleração, exceção e ruptura: disputas tecnopolíticas num mundo pandêmico

Por Rafael Evangelista

A rigor, ninguém tem ideia do que vai acontecer daqui pra frente, depois da emergência do SARS-CoV-2. Há vários fatores, ainda incertos, que podem alterar o cenário. Não sabemos na totalidade os efeitos da doença no corpo humano; se as pessoas de fato criam imunidade depois de contaminadas; sabemos que seu surgimento foi natural, mas estamos incertos sobre como e quando surgiu o vírus; e há muito ainda a se descobrir sobre o processo de transmissão, contágio e espalhamento aéreo do vírus pelo ar ou sobre sua vida em superfícies, entre outros fatores. Mas parece que, a depender não só do que ainda temos a descobrir, estamos numa encruzilhada, que se abre por três caminhos em disputa social e política global: a exceção, a ruptura e a aceleração. O desfecho, o pós pandemia, vai estar relacionado a como vamos interpretá-la e enfrentá-la agora, a partir dessas estratégias, que por sua vez estão ligadas a visões diferentes sobre a pandemia. Continue lendo Aceleração, exceção e ruptura: disputas tecnopolíticas num mundo pandêmico

O ‘cotidiano epidêmico’: a gripe espanhola e o novo coronavírus

Por Leandro Carvalho Damacena Neto

Neste breve artigo iremos analisar algumas características de duas pandemias, a gripe espanhola que grassou mundialmente entre 1918/1919 e o novo coronavírus (causador da Covid-19), que ainda faz vítimas no mundo inteiro. Continue lendo O ‘cotidiano epidêmico’: a gripe espanhola e o novo coronavírus

Divulgação científica entrou em rota de colisão com neofascismo, tropa de choque do neoliberalismo

Por Rafael Evangelista

Jornalistas de ciência e comunicadores científicos passaram a ser alvo do mesmo tipo de perseguição que profissionais da informação política já vêm sofrendo há algum tempo. Esses dois fenômenos são correlatos. Alguns divulgadores estão assumindo um protagonismo necessário em defesa da precaução, do cuidado e da vida, acima das demandas de um sistema produtivo que se recusa a parar – a despeito das mortes que produz. Continue lendo Divulgação científica entrou em rota de colisão com neofascismo, tropa de choque do neoliberalismo

Correntezas da morte: imigração e neoliberalismo

Por Roberto Romano

Como na maioria de nossas palavras e instituições, o império romano serve como fonte para entendermos o modo pelo qual o estrangeiro é assumido ao longo da história antiga, medieval e moderna. Não é o caso de retomar agora todo o fio lógico e social que define a recepção ao estrangeiro no transcurso de pelo menos dois mil anos. Há uma peculiaridade a ser discutida quando falamos na absorção de coletividades não indígenas em organizações políticas sólidas. No caso da Grécia existiam cidades Estado, cada qual com sua compacta formação étnica, cultural e política. O elemento mais amplo do termo “helênico” – supostamente todas as urbes eram irmãs– não garantia unidade entre elas. Dizia-se de modo inócuo: uma guerra que as envolvesse destruiria sua ligação “familiar”. Como Tucídides informa, se existiu “família” no território grego ela mimetizava os mitos e tragédias entre irmãos. Havia direito inclusive ao canibalismo, pois sobrinhos eram servidos aos irmãos em banquetes. Pais devoravam os próprios filhos. Atreu e Tieste são ícones da “fraternidade” entre Atenas, Esparta e outras cidades. Continue lendo Correntezas da morte: imigração e neoliberalismo